A Comissão de Política Urbana, Metropolitana e Meio Ambiente da Câmara Municipal de São Paulo realizou Audiência Pública, nesta terça-feira (13/5), com o tema “A exclusão de imóveis do conjunto urbano do tombamento do Quadrilátero Vilas do Sol e o papel dos órgãos de patrimônio”. A discussão foi presidida pela vereadora Marina Bragante (REDE), autora do requerimento que solicitou o debate.
O Quadrilátero Vilas do Sol está localizado em Pinheiros, na zona oeste do município. Em fevereiro deste ano, alguns imóveis que estavam em processo de tombamento começaram a ser demolidos. A parlamentar explicou que a exclusão de imóveis de conjunto urbano do tombamento do Quadrilátero Vilas do Sol foi realizada sem estudos técnicos do DPH (Departamento do Patrimônio Histórico) e isso levanta questões fundamentais sobre o papel dos órgãos de preservação, sobre os processos de escuta e participação da sociedade e, principalmente, sobre o equilíbrio do crescimento urbano, qualidade de vida e memória histórica da capital paulista.
“Não se trata de sermos contra o desenvolvimento e nem ao adensamento. Ao contrário, queremos discutir que tipo de desenvolvimento São Paulo precisa, um desenvolvimento que respeite a história, que seja ambientalmente responsável, que enfrente o déficit habitacional sem apagar a história dos bairros e promova a justiça social. Preservar patrimônio não é um capricho, é uma escolha sustentável. Quando mantemos e reutilizamos edificações históricas, reduzimos a demanda por novas construções, economizamos recursos naturais e evitamos toneladas de entulhos e emissões associadas às demolições e novas obras. O tombamento cumpre função social no sentido de proteger o valor intrínseco do bem ambiental cultural que se pretende preservar. A preocupação em preservar está associada à consciência da importância da diversidade, seja a biodiversidade, seja a diversidade cultural para a sobrevivência da humanidade”, afirmou a vereadora Marina Bragante.
A arquiteta e urbanista Nádia Somekh fez parte da mesa junto com outros especialistas, autoridades e representantes de associações de moradores. Ela destacou que é possível ter desenvolvimento com proteção ao patrimônio histórico. “Nossa sociedade não valoriza a história e a memória. É isso que a gente está constatando. A cidade de São Paulo é jovem, é do século XX, composta por imigrantes e com uma identidade vertical. A verticalização é nossa identidade, a gente acha que tem que demolir tudo”, frisou.
A arquiteta salientou que a vila foi tombada em 2023, “após ter sido quase destruída”, e reforçou que “o destombamento não existe como figura legal e atende a uma lógica de mercado”. “As pessoas têm medo do tombamento porque elas não entendem que o tombamento é para proteger e para desenvolver e não é para congelar. Então, dá para compor a história e projetar o futuro através do contemporâneo, gerando e reforçando a nossa identidade. Tombamento não impede o desenvolvimento, desde que os interessados, a população sejam ouvidos”, falou Somekh.
A presidente da Amateus (Associação dos Moradores e Comerciantes da Rua Mateus Grou), Marjorie Imae, enfatizou que a presença dos movimentos no debate foi para “tentar reparar uma decisão equivocada que foi tomada com base em análises superficiais”. “Ignoraram a importância cultural, ambiental e histórica da Vilas do Sol, mas também a nossa voz, como sociedade civil. A gente clama pela proteção do nosso patrimônio. Queremos dialogar com esta mesa, com as pessoas responsáveis nos cargos e nas instituições que representam. O pedido de tombamento foi tratado de forma muito superficial, os pareceres técnicos do DPH não foram realizados. Não houve nenhum estudo robusto sobre o nosso caso e sobre vários casos que foram sucessivamente arquivados”, disse.
O presidente do Conpresp (Conselho Municipal de Preservação do Patrimônio, Histórico, Cultural e Ambiental da Cidade de São Paulo), Ricardo Ferrari, defendeu que o PDE (Plano Diretor Estratégico) de 2014 é que permite todas as mudanças que estão acontecendo na cidade. Ele ainda falou que o caso da Vilas do Sol não está arquivado. “Ele está em andamento, tanto que é que ele continua protegido em sua maioria, se não me engano 95%. Essa informação precisa ser retificada, mesmo porque continua em estudo e o DPH está fazendo seu papel, está fazendo seu trabalho”, reforçou.
A vereadora Cris Monteiro (NOVO) elogiou a iniciativa do debate “Eu escutei atentamente todas as pessoas da mesa e acho que a gente tem um desafio, diante de nós, que é fazer a cidade crescer, ao mesmo tempo que temos que preservar a nossa memória. Como fazer isso? Eu acho que é possível. Essa é uma discussão muito relevante. É preciso que a gente guarde a nossa memória, mas a cidade é um organismo vivo e é preciso fazer com que ela cresça”.
Já o vereador Nabil Bonduki (PT) argumentou que o que está acontecendo é a “falta de absoluta coordenação das políticas públicas da Prefeitura de São Paulo”. “A própria Prefeitura transformou o Quadrilátero do Sol numa ZPR (Zona Predominantemente Residencial), seria lógico transformar toda ela em uma zona sem possibilidade de verticalização. E para isso era fundamental o tombamento da Vilas do Sol como um todo, e não com exclusão, exatamente, onde existia um empreendimento com protocolo na Prefeitura”, falou.
“Com os encaminhamentos dessa Audiência Pública, a ideia é montar um Grupo de Trabalho dentro da Comissão de Política Urbana para se debruçar sobre o patrimônio da cidade”, finalizou a vereadora Marina Bragante.
Participação popular
A integrante do movimento Pró-Pinheiros, Rosane Brancatelli, falou que pela cidade há outras áreas, como a Vilas do Sol, que precisam da preservação. “A gente espera que esta audiência mude o resultado da decisão do Conpresp. Vilas do Sol é uma área que fica entre as Ruas dos Pinheiros, Artur de Azevedo, Dr. Virgílio de Carvalho Pinto e Mateus Grou. É um quadrilátero de 42 casas e cerca de 90 comércios, que cria uma ambiência de visitantes, de passeio, de festa, de alegria, como outros lugares que existem no mundo, lugares que as pessoas gostam de visitar. Esses lugares agradáveis, horizontais, estão acabando, estão diminuindo. Vilas do Sol, além de ser um lugar com esse atrativo, é um modelo de conjunto urbanístico que vem desde o século passado, do século XX. Não é um coliseu. Mas a gente tem a ambiência, a gente tem a importância de vivência, de convivência, que é importante para viver bem na cidade”, disse.
O arquiteto e paisagista Michel Chaui, morador de Pinheiros, também pontuou que as construções da Vilas do Sol são um conjunto urbano que é representativo para uma comunidade. “A gente vem aqui rogar para que o Conpresp escute e se sensibilize com isso e leve essa demanda para o conselho no sentido de que os pedidos de preservação, os processos que foram abertos precisam de um estudo e que a voz da população seja escutada”, comentou.
A integrante do Movimento Defenda São Paulo, Lucila Lacreta, que também é urbanista, falou que patrimônios tombados e não tombados estão sendo destruídos para dar lugar a grandes empreendimentos e criticou o Conpresp e o Condephaat (Conselho de Defesa do Patrimônio Histórico, Arqueológico, Artístico e Turístico do Estado de São Paulo). “Parecem que estão irmanados a destruir o pouco que nós temos. Os conselhos de preservação, como foi dito pela professora Nádia Somekh, são conselhos de proteção da qualidade, proteção da vida. Não é proteção dos grandes monumentos, das construções ricas, nada disso. São as construções preciosas para a população, é a casa do pequeno trabalhador, a vila operária, isso é significativo na nossa história. Por outro lado, um conselho que deveria proteger e deveria ser formado por membros altamente qualificados e vocacionados com a cultura da proteção, esses membros destroem porque o amigo é empreendedor e quer fazer um prédio ali”, concluiu.
Confira o debate na íntegra no vídeo abaixo: