A CCJ (Comissão de Constituição, Justiça e Legislação Participativa) debateu nesta segunda-feira (8/12) o PL 1461/2025 – de autoria do Executivo. A proposta estabelece novos critérios para o cálculo do pagamento do auxílio pecuniário concedido ao SFA (Serviço Família Acolhedora). O objetivo é tornar o valor mais atrativo e compatível com as responsabilidades de cuidado e impulsionar a inclusão de crianças e adolescentes no programa.
“A proposição busca alinhar a política municipal aos mandamentos federais e constitucionais de priorização do acolhimento familiar sobre o institucional, garantindo maior efetividade social, técnica e gerencial dos recursos públicos destinados à proteção especial de crianças e adolescentes. A proposta não vai gerar aumento de impacto financeiro, pois haverá redução gradativa da despesa alocada”, afirma a Prefeitura.
Implantado por meio da Secretaria Municipal de Assistência e Desenvolvimento Social, o Serviço Família Acolhedora oferece apoio provisório a crianças e adolescentes afastados do convívio familiar por medida protetiva. A iniciativa garante a permanência em ambiente familiar até o retorno à família de origem ou extensa, ou encaminhamento para adoção. As unidades dos Creas (Centros de Referência Especializados da Assistência Social) são responsáveis por acompanhar, monitorar e avaliar o serviço, além de prestar suporte técnico às organizações parceiras.
O público-alvo inicial são crianças de 0 a 6 anos, com previsão de ampliação gradual da faixa etária para até 17 anos e 11 meses. Atualmente, o serviço funciona em quatro unidades, com capacidade total para acolher 120 crianças. Cada família recebe uma criança por vez, salvo em casos de irmãos. As decisões sobre guarda provisória são definidas pela equipe técnica, conforme avaliação individual dos casos.
O acolhimento institucional nos Saicas (Serviços de Acolhimento Institucional para Crianças e Adolescentes) e na Casa Lar tem um custo médio por pessoa/mês de R$ 8.750,53. No momento, o município acolhe 2.315 crianças e adolescentes. O Projeto de Lei propõe o reajuste do auxílio pecuniário, utilizando como indexador o SMP (Salário Mínimo Paulista), hoje em R$ 1.804,00. O texto prevê R$ 3.608,00 a crianças de 0 a 6 anos e R$ 5.142,53 a crianças e adolescentes entre 7 e 17 anos.
Executivo
A secretária da Smads (Secretaria Municipal de Assistência e Desenvolvimento Social), Eliana Gomes, participou da Audiência Pública e defendeu o PL. Ela explicou que crianças e adolescentes precisam do afeto e carinho direcionado, condicionando ser impossível um mesmo ambiente acolher 15 pessoas no mesmo ambiente e garantir todas as condições básicas para o desenvolvimento. Eliana ainda afirmou que a fiscalização é bastante importante e existe em todos os serviços da pasta.
“Vai ter uma alteração na norma técnica para questões de mentoria no acompanhamento da família ao acolher a criança e adolescentes pelo prazo máximo de 18 meses. Não acredito que os valores vão criar uma condição de comércio, porque há uma seleção das famílias para serem habilitadas, a partir de critérios são escolhidas. Não haverá atrativo para todo mundo se tornar uma família acolhedora, mas há um perfil”, falou a secretária.
Eliana Gomes também apresentou dados. A chefe da pasta contou como a Secretaria responsável pelo programa estabeleceu os parâmetros para se chegar ao valor. “São cerca de 149 Saicas na cidade, aproximadamente 2.200 crianças e adolescentes abrigados. Então, temos um serviço apertado, com custo médio acima. A primeira infância é onde a pessoas será moldada, pois a criança vem fragilizada de uma situação, logo é preciso um apoio maior”.
Durante a apresentação da Smads também foi exibido o texto elaborado pela Prefeitura. Meiry Ellen de Souza Nascimento indicou os benefícios do serviço de acolhimento à família acolhedora, como o atendimento personalizado e os vínculos afetivos mais próximos, estáveis e protetivos. Ainda estão contemplados na proposta maior convivência comunitária, tempo de acolhimento mais curto, melhores índices de desenvolvimento e menor exposição a riscos. Para a cidade, o Executivo estima que o PL vai trazer uma otimização da equipe técnica, além da redução do tempo de acolhimento.
Participação popular
Para a pesquisadora da Unicamp (Universidade Estadual de Campinas), Jane Valente, o projeto é importante para direcionar um olhar à política pública de acolhimento de crianças e adolescentes em São Paulo. No entanto, de acordo com ela, é necessário abordar a questão dos valores. “Um aumento muito significativo para o SFA trazendo um alerta de que o modelo não existe sem o serviço. Se o serviço não for visto como um todo e seja aperfeiçoado, só o dinheiro não dá conta. É um recurso importante e precisa ser aplicado de forma ampliada visando qualificar. Nenhuma família acolhedora recebendo recursos consegue trabalhar bem sem apoio”.
Ligia Mafei, da Defensoria Pública do Estado de São Paulo, entende que o programa deve ser, sim, uma modalidade prioritária, assim como outros modelos de acolhimentos. Mafei também considera fundamental se ater a outras preocupações. “A conclusão do parecer orçamentário e de impacto financeiro que consta na justificativa nos traz uma situação completamente irreal. Não vai ser possível transferir todas as crianças e adolescentes, então não entendo a descontinuidade do serviço e quando falam em gerar economia de R$ 112 milhões. Precisamos entender a política como um todo”, ponderou a coordenadora do núcleo da Infância e Juventude do órgão.
Raul Araújo, presidente IBDCRIA (Instituto Brasileiro de Direito da Criança e Adolescente), relatou preocupações sobre o texto apresentado. “Ele deve vir junto de um conjunto de políticas que garantam a convivência familiar e comunitária. Desde o apoio da família de origem, com recursos e equipes que faltam na cidade, como outras políticas de apoio à família. Já o serviço de acolhimento, por exemplo, quando uma criança encontrada não vai para uma família acolhedora, deve ir para um serviço de acolhimento institucional”.
Vereadores
Os parlamentares Sandra Santana (MDB), Ana Carolina Oliveira (PODE), Janaina Paschoal (PP), Luana Alves (PSOL) e Marina Bragante (REDE) se manifestaram durante o encontro.
Presidente da CCJ, Sandra Santana conduziu o debate. Ela entende que o PL tem a condição de transformar o modelo na cidade. “Está integralmente interligado com a Constituição Federal e o ECA [Estatuto da Criança e Adolescente] ao prezar pelo acolhimento familiar. Nós sabemos que crianças e adolescentes em situação de acolhimento familiar têm melhor desenvolvimento social, cognitivo e emocional. Agora, isso só vai funcionar se houver supervisão contínua, equipe multidisciplinar adequada, acompanhamentos sistemático e psicológico”.
Já a presidente da Comissão de Defesa dos Direitos da Criança, do Adolescente e da Juventude, Ana Carolina Oliveira, questionou principalmente a fiscalização da matéria. A vereadora pediu explicações da pasta responsável. “Preocupação quanto aos cuidados e fiscalização das crianças, pois tenho medo de que os valores propostos virem um comércio e a situação dos vulneráveis seja comercializada. Precisamos entender os pontos para se chegar nesses valores e olhar as crianças e adolescentes como um ser de direito, tudo o que necessitam”.
A Audiência Pública pode ser vista aqui.
