A CPI (Comissão Parlamentar de Inquérito) HIS recebeu alguns convidados na reunião desta terça-feira (23/9) para discutir assuntos relacionados à construção de unidades populares na capital paulista. A ausência de dados confiáveis para monitorar a política privada de habitação de interesse social e possíveis casos de fraudes e irregularidades estiveram entre os destaques.
Desde o início de setembro, o colegiado tem investigado a produção e a comercialização irregular de habitações sociais por entidades e empresas responsáveis pelos empreendimentos na cidade de São Paulo. No encontro desta terça, prestaram depoimento representantes de uma instituição e da sociedade civil.
Oitivas
Coordenadora da pesquisa “Panorama da Habitação de Interesse Social no Brasil”, a professora Bianca Tavolari apresentou os principais problemas diagnosticados nas políticas públicas de HIS. De acordo com ela, a ausência de dados para monitorar as iniciativas é preocupante.
“Se pensarmos que estamos concedendo descontos e incentivos e potencial construtivo a mais para empreendedores e construtores construírem habitação de interesse social e não sabemos o que está acontecendo, vemos então que é uma política que não consegue monitorar, responsabilizar e investigar”, afirmou a professora.
Segundo Tavolari, é necessário criar uma base de dados confiável para monitorar os eventuais problemas. “Para que possamos entender o tamanho do problema e, posteriormente, responsabilizar as partes devidas”. Para Bianca, os programas que incentivam a produção de HIS para famílias de baixa renda carecem de atenção.
“Se não temos um controle público para entender quantas unidades serão construídas e quais as famílias que devem ser atendidas, teremos uma série de problemas, que é o que mais temos visto nessa implementação de mais de dez anos dessa política”, ressaltou Bianca Tavolari.
Bianca Tavolari explicou que a pesquisa “Panorama da Habitação de Interesse Social no Brasil” mapeou 16 incentivos à habitação de interesse social a fim de identificar eventuais irregularidades. “Há uma potencial fraude, mas não cabe à pesquisa definir se houve realmente fraude”.
“Há problemas de aquisição. E cremos que os devidos meios legais irão apurar. Além disso, estamos falando de aquisição de unidades que podem ser vendidas seguidamente. O registro de vendas muito próximas é um elemento que enxergamos como um problema”, ressaltou Bianca
Os estudos também apontaram o “desvirtuamento da produção de HIS por agentes privados na cidade de São Paulo”. Segundo os dados, há aquisição de mais de um imóvel de HIS pela mesma pessoa e pagamento à vista sem monitoramento no ato da transação – o pode ser identificado no registro da matrícula.
Uma das apurações, de acordo com a pesquisa, é que quem tem renda e patrimônio para pagar à vista por um imóvel em São Paulo, provavelmente está acima do grupo prioritário a ser beneficiado por uma política de produção habitacional incentivada.
“Precisamos pensar que incentivos são esses e quais políticas são essas. Precisamos ter um controle disso para conceder habitação para quem precisa”, concluiu Bianca.
A Maristela Ana Lusa é moradora de uma unidade de HMP (Habitação de Mercado Popular) – destinada às famílias que não se enquadram nas faixas de renda da Habitação de Interesse Social, e também não têm condições de adquirir um imóvel no mercado tradicional. Ela falou sobre os problemas com a construtora responsável pelo empreendimento onde reside.
Lusa disse que a comercialização das unidades atende às regras do mercado. No entanto, segundo ela, a construtora não tem solucionado os problemas após entregar os apartamentos aos moradores. “O que não concordamos é que, mesmo tendo unidades HMP residenciais com proibição de locação para plataformas em casos de curta duração, isso não está sendo respeitado”.
Maristela ressaltou que a empreendedora propõe que as questões do condomínio sejam resolvidas em assembleia entre os proprietários. “Não achamos justo essa falta de envolvimento, considerando que vários incentivos fiscais foram recebidos para a construção desse empreendimento”.
Vereadores
Após as falas dos convidados, o vereador Isac Félix (PL), integrante da CPI, tratou de alguns pontos discutidos na reunião. Sobre a pesquisa divulgada pela Bianca Tavolari, ele disse que é preciso entender quais são os meios para fiscalizar e monitorar os empreendimentos construídos pelo município.
“Tem muita gente levando vantagem nessa cidade. A Câmara está aqui para ser fiscalizadora de tudo. O que me preocupou foi a questão do monitoramento por parte do governo. Queremos saber como é feito esse tipo de fiscalização”, destacou o vereador Isac.
Para o relator da CPI, vereador Dr. Murillo Lima (PP), a presença da professora Bianca Tavolari em outras reuniões do colegiado será importante para que mais levantamentos e dados sejam discutidos. O parlamentar demonstrou preocupação com os dados apresentados no estudo. “Se for comprovada a questão das fraudes citadas aqui no decorrer das discussões, precisaremos adotar as medidas necessárias e encaminhar para as autoridades competentes”.
Já o vereador Gabriel Abreu (PODE) sugeriu mapear os problemas encontrados em programas voltados à produção de habitação de interesse social. “Precisamos juntar forças, informações e mapear o que está acontecendo e, assim, sanar os problemas”.
Para a vereadora Silvia da Bancada Feminista (PSOL), as informações apresentadas preocupam. Segundo a parlamentar, o debate sobre o tema é urgente para apurar se realmente há fraude na produção de unidades populares na capital. “Apesar de não termos ainda a total dimensão do problema, já temos alguns dados que são alarmantes. Precisamos entender se houve desvios. Como esses indícios de fraudes podem ser verificados?”
O vice-presidente da CPI, vereador Nabil Bonduki (PT), disse que é preciso solicitar à Prefeitura de São Paulo informações referentes à quantidade de unidades de HIS produzidas no município. “Faltam informações claras, do ponto de vista da Prefeitura, sobre as unidades que foram produzidas e se foram destinadas para o público que o programa deve atender. Nós não sabemos quantas unidades HIS foram produzidas e, com isso, fica bem difícil calcular o número de HIS no município”.
Nabil também fez considerações sobre a manifestação da moradora Maristela Lusa. O parlamentar entende que é fundamental obter mais informações para auxiliar os proprietários de unidades de Habitação de Mercado Popular. “Acredito que a atuação dos cartórios nos registros dos imóveis será importante, pois cremos que eles podem nos auxiliar com informações mais detalhadas. Além disso, entender como fiscalizar para auxiliar nas tratativas é primordial”.
Requerimentos
Na reunião da CPI, os vereadores que integram o colegiado também aprovaram cinco requerimentos. Um deles, de autoria da vereadora Silvia da Bancada Feminista, solicita que um representante dos aplicativos Booking e Airbnb compareça à Comissão para dar informações sobre locação de imóvel.
A reunião da CPI da HIS pode ser conferida na íntegra neste link.