Parecer n° 386/2011

Parecer nº386/2011

Ref: Memo CCJLP 105/2011

TID: XXXXXXXXXXXXXX

Assunto: ofício ATL 477/11-C do Secretário de Governo Municipal.

 

Sra. Procuradora Supervisora:

 

 

 

A Comissão de Constituição, Justiça e Legislação Participativa da Câmara Municipal de São Paulo, tem entre suas atribuições, a fiscalização e o acompanhamento do cumprimento das leis aprovadas no Município, conforme preconiza o art. 47, I, “c”, do Regimento Interno da Câmara Municipal.

 

Com o objetivo de exercer esta função de fiscalização, sobre a aprovação de projetos da construção civil, foi criada uma Subcomissão para tratar das Outorgas Onerosas, no âmbito da Administração Municipal.

 

Para o exercício de seu mister, a Subcomissão em comento convocou vários servidores do Poder Executivo, lotados na Secretaria de Habitação, (subordinados ao Chefe do Poder Executivo e ao Secretário de Habitação), e também o Diretor da XXXXXXXX, para prestarem informações à Subcomissão, na Câmara Municipal, sobre assuntos inerentes às suas atribuições.

 

De tais convocações, o Sr. Prefeito Municipal foi comunicado  através dos ofícios 0661/2011 e 0662/2011.

 

A resposta à comunicação encaminhada ao Exmo. Prefeito foi dada pelo Secretário de Governo Municipal, por meio do ofício ATL 477/11-c, datado de 07 de dezembro de 2011. Em resposta o Secretário comunicou que não haveria obrigatoriedade de comparecimento dos servidores municipais xxx, xxx, xxx e xxx, bem como do Diretor da XXXXXXXX, Sr. XXXXXXXX, para prestarem esclarecimentos à Subcomissão supra, constituída no âmbito do Poder Legislativo, e que por tal razão, os convocados não compareceriam à sessão de oitiva designada.

 

Segundo informado pelo Secretário de Governo Municipal, as Subcomissões criadas no âmbito das Comissões Permanentes da Câmara Municipal, não detêm poderes de investigação, pois não são consideradas Comissões Parlamentares de Inquérito, tendo havido, inclusive, negativa manifestada pela Casa quanto à sua instauração.

 

Para o Secretário, só haveria obrigatoriedade no comparecimento, em caso de convocação por Comissão Parlamentar de Inquérito.

 

Face à resposta encaminhada pelo Sr. Secretário de Governo Municipal, pretende a Subcomissão das Outorgas Onerosas, que esta procuradoria se pronuncie sobre eventuais medidas cabíveis, com relação à negativa expressa no ofício ATL nº 477/2011-C.

 

Inicialmente, cumpre afirmar que a interpretação dada pelo Sr. Secretário de Governo foi equivocada. Em nenhum momento a Subcomissão pretendeu exercer poderes de autoridade judicial, típicos das Comissões Parlamentares de Inquérito, nem tampouco requereu a condução coercitiva dos convocados.

 

Outrossim, a CPI também não é o único instrumento que o Poder Legislativo possui para exercer o controle externo do Poder Executivo. As comissões parlamentares permanentes, e respectivas subcomissões permanentes ou temporárias,  cumprem esta função, conforme previsão na Constituição Federal, e por simetria no âmbito Municipal, na Lei Orgânica do Município.

 

O  artigo 31, “caput”, da Carta Magna, dispõe que:“A fiscalização do Município será exercida pelo Poder Legislativo Municipal, mediante controle externo, e pelos sistemas de controle interno do Poder Executivo, na forma da lei”.

A função de fiscalização dos atos do Poder Executivo pela Câmara Municipal também é expressa na Lei Orgânica do Município, nos termos do artigo 14, XV e XVIII:

 

Compete privativamente  à Câmara Municipal:

 

 

XV- “fiscalizar e controlar diretamente os atos do Poder Executivo, incluídos os da administração indireta, acompanhando sua gestão e avaliando seu resultado operacional, com o auxílio do Tribunal de Contas do Município, sempre que solicitado”;

 

XVIII –“exercer a fiscalização financeira, orçamentária, operacional e patrimonial do Município, auxiliada, quando solicitado, pelo Tribunal de Contas do Município”.

 

A lei Orgânica do Município também atribui à Câmara Municipal, competência, nos termos do artigo 14, IX,  para:

 

“convocar os Secretários Municipais ou responsáveis pela Administração direita e indireta para prestar informações sobre matéria de sua competência, sem prejuízo do disposto no art. 32,§2º, inciso IV”.

 

Conforme previsão expressa no texto da lei, para o exercício desta função de fiscalização, as Comissões permanentes e temporárias, em razão da matéria de sua competência  poderão “requisitar, dos responsáveis, a exibição de documentos e a prestação dos esclarecimentos necessários” (artigo 32, §2º,inciso XII, da Lei Orgânica do Município de São Paulo)  bem como “convocar os Secretários Municipais, e os responsáveis pela administração direta e indireta” (artigo 32, §2º, inciso IV, da Lei Orgânica Municipal).

 

Legítima é, portanto, a atuação da Subcomissão das Outorgas Onerosas, para convocar Secretários Municipais e demais responsáveis, ocupantes de cargos e funções da Administração Direta e Indireta, para prestarem informações sobre matéria de sua competência, nos termos  dos artigos 14, IX e 32,§2º, IV e XII da Lei Orgânica Municipal, sendo aplicável no seu  funcionamento as disposições relativas ao funcionamento das Comissões Permanentes, definidas no artigo 55, II e §2º, do Regimento Interno da Câmara Municipal.

 

Resta destacar,  que os ofícios de nºs 00661/2011 e 00062/2011 foram encaminhados ao Chefe do Executivo, não somente para  levar  ao conhecimento desta autoridade, a importância das convocações efetuadas, mas também para que fossem adotadas eventuais providências na hipótese de não comparecimento daqueles servidores que haviam sido convocados.

 

A convocação pela Subcomissão, na forma levada a efeito,  é legal e não pode ser desatendida,  de modo que , o servidor faltoso, poderá, inclusive, vir a sofrer as sanções previstas no Estatuto.

 

Segundo Uadi Lammêgo Bulos, na obra Curso de Direito Constitucional, 6ª ed. Editora Saraiva, p.1061:

 

“por força da Emenda Constitucional de Revisão n.2/94, consagrou-se a possibilidade de se convocarem chefes de órgãos diretamente vinculados à Presidência da República.  O argumento é que essas autoridades, embora não tenham o mesmo status dos Ministros de Estado, possuem importância assemelhada a ele. Como na democracia a res publica é outro nome da transparência, afigura-se justificável a convocação desses titulares para prestarem, pessoalmente, informações sobre assunto previamente determinado. Logo, qualquer Comissão poderá decidir sobre o comparecimento, ou não, de um Ministro de Estado ou titular de órgão subordinado à Presidência, sem a necessidade da anuência do Plenário. A exigência de Ministros de Estado comparecerem, pessoalmente, para prestar informações não constitui qualquer afronta ao sistema presidencial, e sim uma homenagem ao principio da moralidade administrativa. Tanto é assim que o artigo 50, §2º, considera crimes de responsabilidade o não comparecimento imotivado e a prestação de informações falsas”(grifei).

 

Resta verificar  as possíveis medidas a serem tomadas no âmbito da Câmara Municipal, em decorrência  da resposta  negativa do Sr. Secretário de Governo, por meio do ofício ATL 477/11-C, de 07 de dezembro de 2011.

 

A priori , o ato do Sr. Secretário de governo que, sem respaldo legal para tanto, acaba por impedir o escorreito e regular funcionamento da Câmara Municipal e o livre exercício das funções do Poder Legislativo, viola  o texto constitucional e a Lei Orgânica Municipal,  podendo resultar na representação por parte do Presidente da Câmara Municipal, junto ao Ministério Público para possível configuração de ato de  improbidade administrativa, nos termos do artigo 11 da 8249/92, observando-se que conforme constam das cópias que seguem, a própria subcomissão já enviou ofício ao Ministério Público, tendente à investigar eventual configuração de improbidade administrativa por parte de servidores que não atenderam às convocações.

 

O Secretário do Governo Municipal é quem assiste direta e imediatamente ao Chefe do Executivo Municipal no desempenho de suas atribuições, e cuida das relações institucionais entre o Executivo e o Legislativo. Suas decisões representam as decisões do Chefe do Executivo, razão pela qual sua responsabilidade decorre dos artigos 56 e 69, II da Lei Orgânica do Município.

 

É possível, ainda, nos termos do artigo14, XXII, da Lei Orgânica do Município,  votar moção de censura pública aos Secretários Municipais em relação ao desempenho de suas funções. Todavia, nos termos do artigo 40, §5º, V, a moção de censura pública dependerá do voto favorável de 2/3(dois terços) dos membros da Câmara para aprovação.

 

Quanto ao Chefe do Executivo, poderá haver responsabilidade, em decorrência dos atos praticados pelo Secretário, conforme previsto nos artigos 56, 69, II, 70, 73 e 82 da Lei Orgânica do Município. Isto porque, o Prefeito  exerce a administração municipal com auxílio dos Secretários, sendo estes agentes considerados longa manus, agindo em nome do alcaide (artigo 71 e 75 da L.O.M).

 

Resta configurada a responsabilidade do Chefe do Executivo, já que os ofícios foram à ele dirigidos, porém, não atendidos.

 

Se o Chefe do Executivo, apesar da ciência, não adota providências tendentes ao respectivo atendimento, ou seja, comparecimento dos servidores e diretor convocados perante a Subcomissão da Câmara Municipal,  poderá ser responsabilizado, nos termos do artigo 73, IV, b da Lei Orgânica Municipal,   sujeitando-se à eventual processo de cassação de mandato, pois estará impedindo o regular funcionamento da Câmara, e obstruindo o livre exercício das funções do Poder Legislativo,  notadamente a função fiscalizadora da Câmara Municipal – o  controle externo do Poder Executivo, e violando o princípio constitucional de independência e harmonia entre os poderes (artigo 2º C.F.)

 

Artigo 73 da Lei Orgânica do Município:

 

 O prefeito perderá o mandato, por cassação, nos termos do inciso II e dos parágrafos do artigo anterior, quando:

 

  • Atentar contra:

 

  1. O livre exercício da Câmara Municipal

 

                 A previsão de cassação do mandato também encontra respaldo no artigo 4º do Decreto-Lei 201/67:

 

“São infrações político-administrativas dos Prefeitos Municipais sujeitas ao Julgamento pela Câmara dos Vereadores e sancionadas com a cassação do mandato:

 

  • Impedir o funcionamento regular da Câmara;
  • – desatender, sem motivo justo, as convocações ou os pedidos de informações da Câmara, quando feitos a tempo e em forma regular.

 

 

Possível ainda, na esfera penal, representação ao Ministério Público Estadual, pelo Presidente da Câmara Municipal, por eventual violação ao artigo  1º, XIV, do Decreto-Lei 201/67, que dispõe sobre os crimes de responsabilidade dos Prefeitos e Vereadores:

Art. 1º São crimes de responsabilidade dos Prefeitos Municipais, sujeitos ao julgamento do Poder Judiciário, independentemente do pronunciamento da Câmara dos Vereadores:

XIV – negar execução a lei federal, estadual ou municipal, ou deixar de cumprir ordem judicial, sem dar o motivo da recusa ou da impossibilidade, por escrito, à autoridade competente.            

 

 

Cabe destacar, a possibilidade de impetração de Mandado de Segurança contra o Chefe do Executivo e o Secretário de Governo, com pedido de liminar para imediato cumprimento, em respeito à função fiscalizadora exercida pelo Poder Legislativo. Todavia, necessário que o mandamus seja interposto no prazo decadencial de 120 dias da ciência da resposta negativa.

 

Não obstante  os ofícios 00661 e 00662 versarem também sobre o pedido de informações escritas, importa destacar, que o presente parecer  limita-se à análise a respeito das possíveis consequências jurídicas, decorrentes das condutas  do  Chefe do Executivo e Secretário de Governo, em razão da resposta negativa no sentido de comparecimento dos  servidores e diretor da Prodam, no âmbito da Subcomissão da Câmara Municipal,  para prestarem esclarecimentos.

 

Segue anexa, minuta de Mandado de Segurança contra o Prefeito Municipal e o Secretário de Governo.

 

 

É o parecer, que submeto à vossa apreciação.

 

São Paulo, 27 de fevereiro de 2012.

 

CINTIA TALARICO DA CRUZ CARRER

Procuradora Legislativa

OAB/SP 155.068

 

 

Outorgas Onerosas