Parecer nº 857/2017
Processo nº 817/2017
TID 16354846
Sra. Procuradora Legislativa Supervisora Substituta,
O presente processo foi encaminhado por SGA. (fls. 47) que de acordo com informação de SGA. 24 (fls. 46), de que a empresa XXXXXXXXXXXXXXXXXXXXX, detentora da Ata de Registro de Preços nº 18/2016 (itens 10 e 11 do Pregão Eletrônico nº 56/2016) apresentou a Certidão de Débitos Relativos a Créditos Tributários Federais (fls. 42), porém o documento demonstra em seu rodapé que foi impresso em data anterior a sua emissão.
Além disso, informa que o resultado da confirmação de autenticidade da Certidão foi negativa, pois em consulta ao site www.receitafedereral.gov.br retornou informação negativa (fls.44).
Este é o relatório, passo a tecer as considerações a seguir.
A Constituição Federal no § 3º do artigo 195 que:
“A pessoa em débito com o sistema de seguridade social, como estabelecido em lei, não poderá contratar com o Poder Público nem dele receber benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios”.
Assim, a regularidade fiscal no que tange às contribuições sociais são tão relevantes ao ordenamento jurídico que tem previsão expressa na própria Constituição Federal.
Outrossim, a própria Lei nº 8.666/93 prescreve que é cláusula necessária a todo contrato administrativo a previsão do contratado “manter, durante toda a execução do contrato, em compatibilidade com as obrigações por ele assumidas, todas as condições de habilitação e qualificação exigidas na licitação”.
Ademais, a comprovação da regularidade fiscal deve ser mantida durante toda execução do contrato e não apenas no momento da habilitação da empresa no certame, ou seja, a ausência de CND é um obstáculo quase intransponível à participação do certame, celebração do contrato administrativo, bem como efetuar pagamentos à contratada.
No caso em tela, a empresa apresentou uma certidão, conforme exposto por SGA. 24, em que não havia compatibilidade entre a data constante da certidão e a data de sua expedição da certidão.
Verifica-se que nos próprios autos consta outra certidão expedida na mesma data (fls. 45) em 07 de abril de 2017.
Destarte, a grosso modo, aparentemente, trata-se de conduta, que em tese, pode ser tipificada como o crime de uso de documento falso.
De acordo com o artigo 304 do CP, constitui delito o fato de “fazer uso de qualquer dos papéis falsificados ou alterados, a que se referem os artigos 297 a 302” do CP (falsificação de documento público, falsificação de documento particular, falsidade ideológica, falso reconhecimento de firma ou letra, falsidade ideológica de certidão ou atestado, falsidade material de atestado ou certidão e falsidade de atestado médico). O objeto da tutela penal é a fé pública, proibindo o tipo penal o uso de documentação falsa.
O Uso de Documento falso é crime comum, podendo ser cometido por qualquer pessoa, desde que não seja o autor da falsificação. No caso em tela, não é possível verificar quem seja o autor da falsificação. Nesse caso, o conflito aparente de normas se resolve pelo princípio da consunção, sendo o uso um post factum impunível.
Sujeito passivo é o Estado. Eventualmente, pode ser a pessoa prejudicada pelo delito, mas não há necessidade de que este exista para configuração do delito.
O uso pode ser de qualquer natureza, seja judicial ou extrajudicial, como no presente caso o uso do documento foi para liberação do pagamento. Trata-se de conduta comissiva, inexistindo emprego mediante omissão. É necessário que seja documento falso, não constituindo delito o emprego da fotocópia ou cópia.
O crime se consuma com o efetivo uso do documento falso, independentemente da obtenção de proveito ou da produção de dano. A tentativa é inadmissível, uma vez que o delito já se encontra consumado com o primeiro ato de uso. O simples tentar usar já é caracterizado o uso, estando consumado o crime.
Desse modo, sugiro que sejam encaminhadas cópias das Certidões Positivas com Efeitos de Negativa de Débitos Relativos aos Tributos Federais e à Dívida Ativa da União (fls. 42 e 45), apresentadas pela empresa ao Ministério Público para que seja devidamente apurada ocorrência ou não da autoria e materialidade.
Importante registrar que nenhum outro licitante aderiu aos preços da XXXXXXXXXXXXX para os itens 10 e 11 do Pregão Eletrônico nº56/2016.
Desta feita, entendo que a Administração deverá avaliar a eventual urgência na aquisição dos bens em apreço (citados itens 10 e 11) e caso seja viável, a realização de novo certame para a aquisição desses bens, uma vez que, por força do preceito constitucional acima transcrito, não será possível a continuidade da execução contratual, ora em comento.
Este é o Parecer que submeto à apreciação superior de V. Sa.
São Paulo, 14 de novembro de 2017.
Carlos Benedito Vieira Micelli
Procurador Legislativo
OAB/SP nº260.308