Parecer nº57 /2018
TID nº 17.354.629
Memorando SGA nº 114/2017
Assunto: Lei Federal nº 13.467/2017, que altera a legislação trabalhista
Dra. Procuradora Supervisora,
Trata-se de expediente encaminhado por SGA solicitando nova análise dos itens 5 e 6 abordados no Parecer nº 888/2017, o qual versa sobre as alterações efetivadas na Consolidação das Leis do Trabalho, bem como os reflexos nos procedimentos e regulamentos existentes nesta Edilidade.
Indaga SGA se os temas debatidos nos suscitados itens aplicam-se a órgãos da Administração Pública.
Passa-se, então, a analisar, um a um, os temas questionados:
1. Do art. 484-A da CLT
O item 5 trata da possibilidade de acordo entre empregado e empregador para demissão e pagamento das verbas rescisórias.
Com a entrada em vigor da Lei nº 13.467/2017, foi acrescido na CLT o art. 484-A, estabelecendo que na hipótese de acordo entre empregado e empregador serão devidos pela metade o aviso prévio, se indenizado, e a indenização sobre o saldo do FGTS. As demais verbas trabalhistas serão devidas integralmente.
A dúvida que paira acerca da aplicação do referido dispositivo legal aos celetistas vinculados à Administração Pública decorre do fato de que há regras híbridas no regime empregatício dos funcionários públicos celetistas, regras estas que visam coadunar os ditames da legislação trabalhista com os comandos constitucionais que regem os servidores públicos.
Com efeito, a contratação dos servidores celetistas, ainda que regida pela Consolidação das Leis do Trabalho, depende da criação do emprego público por lei (art. 61, § 1º, II, “a”, da Constituição Federal), além de exigir aprovação prévia em concurso público de provas ou de provas e títulos (art. 37, II, da Constituição Federal) e, a reforçar a natureza híbrida do regime jurídico dos servidores celetistas, há que se mencionar a estabilidade dos servidores celetistas admitidos antes da Emenda Constitucional nº 19/98, prevista no art. 41 da Constituição Federal e corroborada pela Súmula 390 do TST, e, por fim, o dever de motivar a decisão administrativa pela demissão (in http://www.conteudojuridico.com.br/artigo,o-direito-a-estabilidade-e-a-dispensa-do-servidor-publico-concursado-sob-o-regime-da-clt,50674.html).
Especialmente analisando o ato administrativo de dispensa do servidor celetista, é importante frisar que o requisito de sua validade é a motivação suficiente e adequada, não podendo a Administração Pública simplesmente “ceder às estratégias e lógicas mercadológicas que são legalmente aplicáveis às entidades puramente privadas” (in https://www.jota.info/opiniao-e-analise/artigos/dispensa-empregado-public-celetista-25012017).
Diante deste panorama, é compreensível a dúvida de SGA acerca da possibilidade de aplicação do novel dispositivo, que prevê a possibilidade de transação entre empregado e empregador visando pôr fim ao contrato de trabalho e, ainda, podendo dispor sobre metade do aviso prévio e da indenização do FGTS.
É importante assinalar que esta modalidade de demissão depende do acordo entre as partes, ou seja, nem o trabalhador tampouco a empregadora jamais poderão ser compelidos a aceitá-la. A demissão prevista no artigo em estudo é ato bilateral.
Todavia, salvo melhor juízo (há que se levar em conta que o tema é extremamente recente, haja vista o fato de que o novo artigo está em vigor há menos de três meses), é possível afirmar a possibilidade de aplicação do art. 484-A da CLT aos servidores celetistas da Câmara Municipal.
Isso porque, demonstrada a motivação e o interesse público, pilares que devem nortear a Administração Pública e seus atos administrativos, a aplicação do art. 484-A da CLT no âmbito do setor público encontra guarida no ordenamento jurídico.
O referido artigo foi incluído no projeto de lei por meio de emenda, cuja fundamentação esclarece tratar-se de uma vantagem ao trabalhador e menciona, ainda, que tal dispositivo norteará programas de demissão voluntária (in http://www.camara.gov.br/proposicoesWeb/prop_mostrarintegra?codteor=1546162&filename=ESB+61+PL678716+%3D%3E+SBT+1+PL678716+%3D%3E+PL+6787/2016)
O artigo trouxe, portanto, a possibilidade de uma demissão consensual, solucionando impasses nos quais o empregado deseja pedir demissão, mas não o faz, esperando ser demitido a fim de obter as verbas rescisórias trabalhistas em sua integralidade.
Acerca dos programas de demissão voluntária, é indiscutível a possibilidade de sua aplicação no setor público (https://www12.senado.leg.br/noticias/materias/2017/07/27/medida-provisoria-institui-programa-de-demissao-voluntaria-para-servidores), bastando a previsão legal e a adesão voluntária dos servidores.
A demissão consensual, tal como o programa de demissão voluntária, nada mais é do que um acordo entre a Administração Pública, na qualidade de empregadora, e o empregado.
Há outras normas vigentes no ordenamento jurídico que confirmam a possibilidade de a Administração Pública realizar acordos, normas estas que, embora não versem expressamente sobre relação empregatícia, enfatizam a viabilidade de transacionar com o órgão público.
Nesse sentido, importa mencionar a Lei nº 13.140/2015, a qual dispõe sobre a mediação entre particulares como meio de solução de controvérsias e sobre a autocomposição de conflitos no âmbito da administração pública. Em que pese tal lei expressamente exclua as relações de trabalho de sua guarida (art. 42, parágrafo único), esta confirma a possibilidade de a Administração Pública realizar acordos extrajudiciais, neste sentido estando em sintonia com o artigo ora em comento.
Ainda a ilustrar a viabilidade de transacionar com a Administração Pública, vale citar o novo Código de Processo Civil, instituído pela Lei 13.105/2015, o qual enfatiza os meios consensuais de pacificação dos conflitos, com destaque à conciliação, à mediação e a outros métodos de solução consensual (artigo 3º, § 2º, do CPC de 2015), ressaltando-se que, na ausência de normas que regulem os processos trabalhistas, as disposições do Código de Processo Civil serão aplicadas supletiva e subsidiariamente (artigo 15), reforçando, assim, sua sintonia com o art. 484-A da CLT.
Por estas razões, tendo em vista já ser pacífica em nosso ordenamento jurídico a possibilidade de a Administração Pública realizar programas de demissão voluntária e, ainda, realizar acordos extrajudiciais visando pacificar eventuais conflitos, é possível aplicar no âmbito da Câmara Municipal o artigo 484-A da CLT, desde que o ato administrativo seja devidamente motivado e que seja demonstrado o inequívoco interesse público da medida.
2. Do art. 510-A da CLT
Quanto ao item 6, a alteração legislativa acresceu o art. 510-A na CLT, estabelecendo que nas empresas com mais de duzentos empregados será eleita uma comissão para representação dos empregados, com a finalidade de promover-lhes o entendimento direto com os empregadores.
Tendo em vista que a Câmara conta com mais de duzentos servidores celetistas, indicamos a necessidade de criação da referida comissão, bem como sugerimos a edição de Ato pela E. Mesa a fim de regulamentar a matéria.
A existência da mencionada Comissão já era assegurada pela Constituição Federal, art. 11:
“Art. 11. Nas empresas de mais de duzentos empregados, é assegurada a eleição de um representante destes com a finalidade exclusiva de promover-lhes o entendimento direto com os empregadores”.
A alteração na CLT objetivou regulamentar o referido comando constitucional, expondo, em suma, a forma como deve ser constituída a Comissão e as consequências decorrentes do mandato.
Com efeito, a regulamentação da Comissão de Representantes é um benefício ao trabalhador, especialmente em razão das prerrogativas trazidas com a Lei nº 13.467/2017 aos seus membros, merecendo destaque a proteção contra despedida imotivada.
A exposição de motivos do Projeto de Lei 6787/2016, que originou a Lei nº 13.467/2017, esclarece a importância do dispositivo:
“Outra medida ora proposta, que visa prestigiar o diálogo social e desenvolver as relações de trabalho no país, é a regulamentação do art. 11 da Constituição Federal. Esse dispositivo constitucional assegura a eleição de um representante dos trabalhadores nas empresas com mais de duzentos empregados, com a missão de promover o entendimento direto com a direção da empresa. O representante dos trabalhadores no local de trabalho deverá atuar na conciliação de conflitos trabalhistas no âmbito da empresa, inclusive os referentes ao pagamento de verbas trabalhistas periódicas e rescisórias, bem como participar na mesa de negociação do acordo coletivo de trabalho com a empresa.
6. A experiência européia demonstra a importância da representação laboral na empresa. Países como Alemanha, Espanha, Suécia, França, Portugal e Reino Unido possuem há vários anos as chamadas comissões de empresa ou de fábrica. A maturidade das relações de trabalho em alguns países europeus propicia um ambiente colaborativo entre trabalhador e empresa, resultando na melhoria do nível de produtividade da empresa.
7. No Brasil temos um nível elevado de judicialização das relações do trabalho, o que é retratado pela quantidade de ações trabalhistas que anualmente dão entrada na Justiça do Trabalho. Na grande maioria da ações trabalhistas a demanda reside no pagamento de verbas rescisórias. A falta de canais institucionais de diálogo nas empresas que promovam o entendimento faz com que o trabalhador só venha a reivindicar os seus direitos após o término do contrato de trabalho. Com isso, problemas que poderiam ser facilmente resolvidos no curso do contrato de trabalho vão se acumulando, para serem discutidos apenas ao término do vínculo empregatício, na Justiça do Trabalho. 8. A regulamentação do art. 11 da Constituição da República tornará possível o aprimoramento as relações de trabalho no país, ao instituir no ambiente da empresa um agente com credibilidade junto ao trabalhador, já que ele será escolhido dentre os empregados da empresa, independentemente de filiação sindical, com quem ele poderá contar para mediar a resolução de conflitos individuais havidos no curso da relação empregatícia. A atuação do representante dos trabalhadores trará ganhos para a empresa, na medida que ela poderá se antecipar e resolver o conflito, antes que o passivo trabalhista se avolume e venha a ser judicializado.” (http://www.camara.gov.br/proposicoesWeb/prop_mostrarintegra?codteor=1520055&filename=PL+6787/2016)
Ressalte-se que o art. 510-C, § 1º, impede a interferência da empresa e do sindicato na comissão eleitoral. “No entanto, uma vez criada, sua continuidade passa a ser obrigatória, salvo nos casos em que não houver candidatos para um mandato, ocasião em que nova eleição deverá ser convocada no prazo de um ano” (in http://alanmartinez.jusbrasil.com.br/artigos/499903844/a-comissao-de-empregados-na-reforma-trabalhista, acessado em 05.02.2018).
A dúvida sobre a obrigatoriedade da criação da comissão é oriunda do fato de o artigo 510-A usar a expressão “assegurar”.
A esse respeito, confira-se a opinião exarada por especialistas da IOB em entrevista concedida à Revista Veja:
“Tendo em vista que a reforma trabalhista menciona que é assegurada a eleição de uma comissão de representantes dos trabalhadores nas empresas que possuem acima de 200 (duzentos) empregados, e que a eleição será convocada, com antecedência mínima de trinta dias, contados do término do mandato anterior, por meio de edital que deverá ser fixado na empresa, com ampla publicidade, para inscrição de candidatura, entende-se que a empresa possuindo 200 (duzentos) ou mais empregados deverá adotar obrigatoriamente o procedimento para a eleição da comissão mencionada, independentemente de qualquer manifestação dos trabalhadores.
Contudo, existe a possibilidade de o artigo em questão ter uma maior regulamentação pelo governo até que a lei da reforma trabalhista passe a ser aplicada, ou o processo constar de acordo ou convenção coletiva junto ao sindicato a qual a empresa esteja vinculada”.
(destaques nossos, https://veja.abril.com.br/economia/reforma-empresas-terao-de-criar-comissoes-de-empregados/)
Portanto, ante o teor do texto legal e haja vista que até o momento não houve nenhuma regulamentação esclarecendo como deverá atuar a comissão de representantes, especialmente nos casos que envolvam a Administração Direta, é recomendável aplicar à Câmara Municipal o comando legal do art. 510-A e seguintes, assegurando a eleição de uma comissão de representantes.
É a minha manifestação, que submeto à elevada apreciação de V. Sa.
São Paulo, 09 de fevereiro de 2018
Lilian Vargas Pereira Poças
Procuradora Legislativa
OAB/SP 184.138