Parecer n.º 571/2017
Processo n.º 1076/2014
TID nº 12873975
Assunto: Notas fiscais pendentes de pagamento durante a vigência do contrato em face de irregularidade fiscal da empresa FOTO ÓPTICA GOLFIN LTDA – ME. – Possibilidade.
Sra. Procuradora Legislativa Supervisora:
O Sr. Secretário Geral Administrativo encaminha o presente processo para parecer diante de solicitação do setor de comunicação (CCI) para que seja apreciada questão atinente às notas fiscais não pagas em razão da ausência de certidão negativa de débitos Federal da contratada, durante a vigência do Termo de Contrato, originado de licitação, apenso às folhas 429/437.
Na sequência se verifica que o processo foi remetido ao arquivo, encerrado em 10/04/2017, às folhas 471.
Contudo, a Unidade Requisitante requereu os autos e anexou expediente às folhas 473/492, dando notícia de que, durante a vigência do ajuste, o serviço foi prestado corretamente, até em meados de fevereiro de 2.016, quando a contratada encaminhou nota fiscal para pagamento dos serviços executados em janeiro de 2.016, sem, contudo, vincular certidão negativa de débitos federal; aduziu que, ao procurar a empresa, a mesma alegou que estava regularizando o débito, sem sucesso.
Neste passo, a Unidade informou a providência adotada à época, consubstanciada em resolução do supervisor para que não fossem realizados pedidos até a regularização fiscal. Entretanto, nos termos da manifestação supramencionada, ocorreu uma falha de comunicação, consistente em entendimento equivocado sobre a duração da suspensão dos serviços.
Desta forma, o setor pertinente afirmou, no parecer de folhas 473 a 492, que foram efetuados vários pedidos de fornecimento no período compreendido entre fevereiro de 2.016 a setembro de 2.016, quando se encerrou a vigência do termo de ajuste; atestou a efetiva execução dos serviços realizados, e solicita informações acerca do pagamento devido à empresa.
Com efeito, a Unidade, anexou à manifestação, cópia do contrato (folhas 475/479); cópia de e-mail entre Servidor e o representante da empresa datado de 03 de fevereiro de 2.016, constatando a intenção da empresa de continuar prestando os serviços, bem como a intenção de resolver pendência perante a União Federal, às (folhas 480); cópia de relatório contendo controle próprio de entrega das fotos (folhas 481/486).
Observa-se, ainda, a juntada de outro e-mail da empresa datado de 04/04/2017 requerendo solução para as pendências, contendo relatório dos serviços fotográficos com valores em aberto, no período de fevereiro a setembro de 2.016.
Cumpre salientar que, nos termos do §3º do art. 195 da Constituição Federal, as pessoas jurídicas não podem manter contrato com a Administração Pública se não comprovarem a regularidade perante a Seguridade Social.
Contudo, essa norma tem caráter preventivo, e no caso de transgressão é certo que a pena correspondente deve ser a rescisão contatual, entretanto, no caso em tela, verifica-se que os serviços foram prestados durante a vigência do contrato que já se esvaiu, restando apenas a análise quanto à obrigatoriedade em efetuar o pagamento correspondente das notas fiscais.
Neste sentido, e diante da alegação de que os serviços foram prestados, inclusive diante da comprovada boa-fé da contratada, (folhas 480), entendo que deverá haver liquidação do valor relativo à contraprestação, tanto pela impossibilidade da Administração em se locupletar retendo o valor já que usufruiu dos serviços prestados, quanto pela ausência de norma que autorize esta retenção.
Neste sentido se manifesta a doutrina especializada, como se exemplifica com citação de Marçal Justen Filho. Comentários à Lei de Licitações e Contratos Administrativos. 13. ed. São Paulo: Dialética, 2009, p. 848.
“Suponha-se uma lei penal que cominasse a pena de reclusão de seis a vinte anos para quem praticasse “ato criminoso”. Imagine-se que, ademais disso, existisse outra lei fixando a pena de multa pecuniária para o sujeito que desenvolvesse “ato criminoso”. Mais ainda, cogite-se que outra lei determinasse pena de interdição de direitos para os autores de “ato criminoso”. Existiriam três sanções distintas para a repressão a condutas descritas de modo idêntico. Poderia sustentar-se que cada espécie de sanção seria reservada a distintas hipóteses de atos criminosos, gênero que comportaria gradação, segundo a gravidade e a lesividade das condutas. Ora, isso possibilitaria dois grandes problemas. Por um lado, seria necessário descobrir que poderia entender-se por “ato criminoso”. Por outro lado, haveria a remessa à avaliação subjetiva do julgador, a quem incumbiria determinar a gravidade da sanção no caso concreto sem qualquer parâmetro legislativo. No caso da Lei n. 8.666, essa é a situação verificada.”
Reitera-se que a não regularização dos débitos da contratada, induziria à rescisão contratual, inócua neste caso, contudo, não vislumbro amparo legal para efetuar a retenção do pagamento relativo à prestação, ou outra pena, exatamente como se manifesta a jurisprudência pátria, elucidada com decisão de Tribunal Especializado:
“A perda da regularidade fiscal no curso de contratos de execução continuada ou parcelada justifica a imposição de sanções à contratada, mas não autoriza a retenção de pagamentos por serviços prestados.
Consulta formulada pelo Ministério da Saúde suscitou possível divergência entre o Parecer da Procuradoria Geral da Fazenda Nacional (PGFN) 401/2000 e a Decisão nº 705/1994 – Plenário do TCU, relativamente à legalidade de pagamento a fornecedores em débito com o sistema da seguridade social que constem do Sistema de Cadastramento Unificado de Fornecedores (Sicaf). A consulente registra a expedição, pelo Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão de orientação baseada no Parecer 401/2000 da PGFN, no sentido de que “os bens e serviços efetivamente entregues ou realizados devem ser pagos, ainda que constem irregularidades no Sicaf”. Tal orientação, em seu entendimento, colidiria com a referida decisão, por meio do qual o Tribunal firmou o entendimento de que os órgãos e as entidades da Administração Pública Federal devem exigir, nos contratos de execução continuada ou parcelada, a comprovação, por parte da contratada, da regularidade fiscal, incluindo a da seguridade social. O relator, ao endossar o raciocínio e conclusões do diretor de unidade técnica, ressaltou a necessidade de os órgãos e entidade da Administração Pública Federal incluírem, “nos editais e contratos de execução continuada ou parcelada, cláusula que estabeleça a obrigação do contratado de manter, durante a execução do contrato, todas as condições de habilitação e qualificação exigidas na licitação”, além das sanções resultantes de seu descumprimento. Acrescentou que a falta de comprovação da regularidade fiscal e o descumprimento de cláusulas contratuais “podem motivar a rescisão contratual, a execução da garantia para ressarcimento dos valores e indenizações devidos à Administração e a aplicação das penalidades previstas no art. 87 da Lei nº 8.666/93, mas não a retenção do pagamento”. Caso contrário estaria a Administração incorrendo em enriquecimento sem causa. Observou, também, que a retenção de pagamento ofende o princípio da legalidade por não constar do rol do art. 87 da Lei nº 8.666/93. O Tribunal, então, decidiu responder à consulente que os órgãos e entidades da Administração Pública Federal devem: a) “… exigir, nos contratos de execução continuada ou parcelada, a comprovação, por parte da contratada, da regularidade fiscal, incluindo a seguridade social, sob pena de violação do disposto no § 3º do art. 195 da Constituição Federal”; b) “… incluir, nos editais e contratos de execução continuada ou parcelada, cláusula que estabeleça a obrigação do contratado de manter, durante a integral execução do contrato, todas as condições de habilitação e qualificação exigidas na licitação, prevendo, como sanções para o inadimplemento a essa cláusula, a rescisão do contrato e a execução da garantia para ressarcimento dos valores e indenizações devidos à Administração, além das penalidades já previstas em lei (arts. 55, inciso XIII, 78, inciso I, 80, inciso III, e 87, da Lei nº 8.666/93)”. Acórdão n.º 964/2012-Plenário, TC 017.371/2011-2, rel. Min. Walton Alencar Rodrigues, 25.4.2012.”.
E mais. Exemplo de decisão da lavra do Superior Tribunal de Justiça, a saber:
“ADMINISTRATIVO. CONTRATO ADMINISTRATIVO. SERVIÇOS EFETIVAMENTE PRESTADOS PELA EMPRESA CONTRATADA. RETENÇÃO DE PAGAMENTO POR PARTE DA ADMNISTRAÇÃO PÚBLICA. ADIMPLEMENTO CONDICIONADO À COMPROVAÇÃO DE REGULARIDADE FISCAL. ILEGALIDADE DA SANÇÃO APLICADA. 1. Não se afigura legítima a retenção, pela Administração Pública, do pagamento decorrente de contrato administrativo, por falta de prova de regularidade fiscal do fornecedor, não só pelo fato de a referida sanção não constar no rol previsto no art. 87 da Lei n.º 8.666/93, conspirando contra o princípio da legalidade insculpido na Constituição Federal, como também por implicar enriquecimento sem causa da Administração. 2. Precedentes do STJ e desta Corte: ROMS 24953/CE, Rel. Min. Castro Meira, 2ª Turma, DJE DATA: 17/03/2008; e AGTR 101690/SE, Rel. Des. Fed. Francisco Barros Dias, 2ª Turma, DJE – Data: 29/01/2010. 3. Indeferimento da antecipação dos efeitos da tutela recursal, ante o risco de irreversibilidade do provimento jurisdicional, nos termos do art. 273, parágrafo 2º, do CPC. 4. Apelação provida para anular o ato administrativo do TRE do Estado do Ceará que determinou a retenção dos valores a que se reporta a inicial e, em consequência, permitir o pagamento das faturas vencidas relativas aos serviços efetivamente prestados pela empresa Cactus no ano de 2007.
(AC 200984000001538, Desembargador Federal Rubens de Mendonça Canuto, TRF5 – Segunda Turma, 04/11/2010)”.
Outrossim, s.m.j em resposta à consulta formulada por SGA entendo que o pagamento correspondente às notas fiscais deve ser efetuado, inclusive para ilustrar, junto ao presente, certidão negativa de débitos da empresa atualizada, corroborando com a presunção de boa-fé da mesma. Contudo, no caso em questão, carece apurar o valor a ser ressarcido à empresa, posto que o relatório apresentado pela Unidade não contém valores discriminados, portanto, o setor deverá realizar aferição quanto ao montante.
Ademais, sugiro que a Unidade requisitante adote medidas mais eficazes para evitar novas falhas de comunicação como a ocorrida.
Este é o Parecer que submeto à criteriosa apreciação de V. Sa.
São Paulo, 27 de junho de 2017.
Ieda Maria Ferreira Pires
Procuradora Legislativa
Setor de Contratos e Licitações
OAB/SP n.º 147.940