Parecer n° 003-Chefia/2019

Parecer Chefia nº 003/2019

Referências: TID  18267480  e TID 18267493 – Memorando – 013/2019– JPN – 36º GV – Nobre Vereador XXXXXXXXXXX –encaminhado à Secretaria Geral Administrativa e  Memorando – 014/2019– JPN – 36º GV – Nobre Vereador XXXXXXXXXXXX encaminhado à Procuradoria

Assunto – Indagações do Nobre Vereador XXXXXXXXXXXX quanto ao teor e tramitação do TID 18234064 e ulterior Decisão de Mesa nº 4156/2019

 

Senhor Presidente,

 

Trata o presente expediente de indagações formuladas pelo Nobre Vereador XXXXXXXXXXXX à Secretaria Geral Administrativa (TID  18267480) e a esta Procuradoria (TID 18267493).

Tendo em vista a identidade do teor nas indagações contidas no TID  18267480 e no TID 18267480, tendo sido este encaminhado a esta Procuradoria, pela Presidência, após a manifestação da Secretaria Geral Administrativa, “para parecer técnico”, passo à análise do teor dos mesmos

Os Memorandos de referência apresentam, em síntese, diversos questionamentos quanto à natureza e regularidade da documentação e dos encaminhamentos havidos no bojo do expediente TID 18234064, em que teriam sido colhidos depoimentos sem determinação escrita da Presidência, sem publicação no Diário Oficial, sem delimitação de procedimentos e competências legais, registrados em folhas soltas de papel, por meio de uma tramitação “secreta e clandestina”, sob o constrangimento da presença do Chefe, xxxxxxxxx, que não teria sido afastado de suas funções. Questiona ainda se esta Procuradoria considera adequada a Decisão da Mesa que remeteu à Corregedoria o processado no expediente TID referido, assunto que, segundo seu entender, não seria de sua competência institucional, e sem que se notificasse previamente o Vereador.

Faço notar que os documentos e encaminhamentos objeto das indagações ora formuladas, referentes ao expediente TID 18234064, estão contidos no expediente TID 18234395, e já foram analisados por esta Procuradoria, que não vislumbrou qualquer irregularidade, e exarou o Parecer jurídico ADM nº 14/2019. Em sequência, nesse mesmo expediente, a E. Mesa Diretora, por meio da Decisão da Mesa nº 4156/2019, publicada no Diário Oficial da Cidade no dia 28 de março de 2019, decidiu encaminhar o “expediente para o competente exame no âmbito da Corregedoria, tendo em vista a existência de procedimento a propósito dos fatos narrados, no bojo do qual poderão surgir elementos para ulteriores providências por parte dessa Egrégia Mesa. Acolhendo a solicitação do Nobre Vereador XXXXXXXXXXXX, determina ainda que se dê conhecimento ao Ministério Público do Estado de São Paulo do mesmo expediente.”

De todo modo, em atenção aos quesitos formulados pelo Nobre Vereador XXXXXXXXXXXX e o solicitado pela D. Presidência, faço breve análise, no item I, do procedimento de averiguação primária e de apuração preliminar, previstos, respectivamente,  no art. 2º, § 1º do Ato da Mesa nº 1421/19, e no art. 3º, inc. I, a) do mesmo Ato. Na sequencia, passo à resposta aos quesitos formulados.

 

I – A averiguação primária e a apuração preliminar – Distinção .

 

Dispõem os arts. 2º e 3º, inciso I, do Ato da Mesa 1421/2019, que disciplinam a matéria em questão:

                        Art. 2º A autoridade que tiver ciência de irregularidade no serviço público é obrigada a tomar providências objetivando a apuração dos fatos e a responsabilidade.

  • 1º A denúncia anônima não autoriza a instauração imediata de procedimento administrativo disciplinar, cabendo à autoridade promover a averiguação primária do quanto noticiado, preservada a intimidade e a não exposição da pessoa denunciada.
  • Constatada a existência de indícios de irregularidade, caberá à autoridade determinar a abertura de procedimento administrativo disciplinar.

                        Art. 3º São procedimentos administrativos disciplinares:

                        I- preparatórios:

  1. a) a Apuração Preliminar (artigos 67 a 73);
  2. b) a Sindicância (artigos 74 a 79).

 

Certo é, pois, que toda autoridade que tenha ciência de irregularidade no serviço público tem o poder-dever de tomar providências objetivando a apuração dos fatos e a responsabilidade respectiva.

 

Porém, como medida de elementar prudência, diante de uma denúncia de irregularidades, sobretudo quando se trata de denúncia anônima, indispensável que a autoridade verifique se há elementos suficientes que justifiquem a mobilização de recursos para apurá-la. Nesse sentido, o art. 2º, § 1º, do Ato da Mesa nº 1421/19, prevê que a caberá à autoridade, diante de uma denúncia anônima, promover uma “averiguação primária”, e não abrir automaticamente um procedimento administrativo disciplinar, seja ele preparatório ou não.

 

Deste modo, a abertura de procedimento administrativo disciplinar (dentre eles os procedimentos administrativos disciplinares preparatórios previstos no art. 3º, inciso I, alíneas “a”, Averiguação Preliminar, e “b”, Sindicância), somente poderá ocorrer se for “constatada a existência de indícios de irregularidade” (art. 2º, § 2º do do Ato 1421/2019).

 

Não há, pois, como confundir-se a “averiguação primária”, que é informal ‒ uma vez que seus procedimentos não estão fixados pelo Ato da Mesa ‒, com a “Apuração Preliminar”, que consiste em um “procedimento disciplinar de preparação e investigação” (art. 67, c/c art. 3º, inciso I, alíneas “a” do Ato 1421/19), cuja abertura é determinada pela autoridade depois de “constatada a existência de indícios de irregularidade” ( art. 2º, § 2º do Ato 1421/19).

 

Tal distinção está em plena consonância com a doutrina e a jurisprudência pátrias.

 

Com efeito, a averiguação primária equivale à “instrução prévia”, a respeito da qual Austregésilo Brito escreve:

 

                        “Trata-se de providência prévia com a finalidade de respaldar o administrador quanto à instauração de Sindicância, de PAD ou de arquivamento de denúncia. Embora haja denúncia ou representação formal, o administrador pode proceder a Instrução Prévia. É informal e dispensa comissão. Qualquer servidor pode ser designado para cumprir essa Instrução, dela devendo apresentar relatório circunstanciado sobre o fato denunciado. É indicada também para a denúncia anônima, evitando instauração de processos indevidos e dispêndio de recursos públicos (in Manual de Processo Disciplinar, Ed. Quixote, Piauí, 2007, p. 13; os grifos não constam do original).

 

No mesmo sentido, a Controladoria Geral da União, por meio do seu Manual de Treinamento para formação de membros de comissões para processo administrativo disciplinar (2011) ensina que “a autoridade não se precipitará a instaurar a sede disciplinar, com todos os ônus a ela inerentes, à vista tão-somente de uma denúncia anônima”. E o mesmo manual adverte que o juízo de admissibilidade de procedimentos disciplinares deve ser feito “com extrema cautela e enriquecido por investigação preliminar, ainda mais se enfatiza tal recomendação em notícia originada anonimamente. Nesses casos, deve-se proceder com maior cautela, antes de se decidir pela instauração do processo, para evitar precipitada e injusta ofensa à honra do servidor (vez que o anonimato pode tentar ocultar vieses de pessoalidade e de animosidade), promovendo investigação preliminar e inquisitorial ainda mais criteriosa, aprofundada, crítica e exigente”.

 

Essa solução encontrada para se analisar denúncias anônimas, acolhida pelo Despacho do Consultor-Geral da União nº 396/2007, foi também aprovada pelo então Advogado Geral da União José Antonio Dias Toffoli, que acrescentou, entre outras, as seguintes considerações:

 

                        “c) O Poder Público, provocado por delação anônima (disque-denúncia, por exemplo) pode adotar medidas sumárias de verificação, com prudência e discrição, sem formação de processo ou procedimento, destinadas a conferir a plausibilidade dos fatos nela denunciados. Acaso encontrados elementos de verossimilhança, poderá a autoridade formalizar a abertura do processo ou procedimento cabível, desde que mantendo completa desvinculação destes em relação à peça apócrifa, ou seja, desde que baseado nos elementos verificados pela ação preliminar do próprio Estado”.

 

Destaque-se ainda, de acordo com a mesma orientação, a recente Instrução Normativa editada pela Controladoria Geral da União nº 14/2018 (D.O. U de 16/11/2018, Seção 1, pg. 102) que,  em seu art. 11, parágrafo único, assinala:

                        “Art. 11. Presentes indícios de autoria e materialidade, será determinada a instauração de procedimento correcional acusatório, sendo prescindível a existência de procedimento investigativo prévio.

                        Parágrafo único. A informação anônima que noticie a ocorrência de suposta infração correcional poderá deflagrar procedimento correcional acusatório, desde que sejam colhidos outros elementos que a respaldem.

 

Importante, também, nesse sentido, o seguinte julgado do STF:

 

EMENTA: A INVESTIGAÇÃO PENAL E A QUESTÃO DA DELAÇÃO ANÔNIMA. DOUTRINA. PRECEDENTES. PRETENDIDA EXTINÇÃO DO PROCEDIMENTO INVESTIGATÓRIO, COM O CONSEQÜENTE ARQUIVAMENTO DO INQUÉRITO POLICIAL. DESCARACTERIZAÇÃO, NA ESPÉCIE, DA PLAUSIBILIDADE JURÍDICA DO PEDIDO. MEDIDA CAUTELAR INDEFERIDA.

                        – As autoridades públicas não podem iniciar qualquer medida de persecução (penal ou disciplinar), apoiando-se, unicamente, para tal fim, em peças apócrifas ou em escritos anônimos. É por essa razão que o escrito anônimo não autoriza, desde que isoladamente considerado, a imediata instauração de “persecutio criminis”.

                        – Peças apócrifas não podem ser formalmente incorporadas a procedimentos instaurados pelo Estado, salvo quando forem produzidas pelo acusado ou, ainda, quando constituírem, elas próprias, o corpo de delito (como sucede com bilhetes de resgate no crime de extorsão mediante seqüestro, ou como ocorre com cartas que evidenciem a prática de crimes contra a honra, ou que corporifiquem o delito de ameaça ou que materializem o “crimen falsi”, p. ex.).

                        – Nada impede, contudo, que o Poder Público, provocado por delação anônima (“disque-denúncia”, p. ex.), adote medidas informais destinadas a apurar, previamente, em averiguação sumária, “com prudência e discrição”, a possível ocorrência de eventual situação de ilicitude penal, desde que o faça com o objetivo de conferir a verossimilhança dos fatos nela denunciados, em ordem a promover, então, em caso positivo, a formal instauração da “persecutio criminis”, mantendo-se, assim, completa desvinculação desse procedimento estatal em relação às peças apócrifas (STF, HC 100042 MC/RO, Rel. Min. Celso de Mello, DOU 2/10/09).

 

No caso da matéria objeto da reportagem da Rádio CBN, datada de 20 de março de 2019, o Sr. Presidente da Edilidade, com prudência e discrição, com a finalidade de conferir a plausibilidade dos fatos referidos na reportagem, pretensamente embasados por denúncias anônimas, determinou à Secretaria Geral Administrativa o procedimento descrito no TID 18234064, com prévio e posterior encaminhamento das informações colhidas à Procuradoria.

 

Tratou-se de procedimento informal, a título de instrução prévia, para conferir a plausibilidade de denúncias anonimamente veiculadas na imprensa, tal como disposto no art. 2º, § 1º do Ato nº 1421/19, isto é, de uma averiguação primária. E, segundo o elevado crivo da E. Mesa, os elementos colhidos não reuniram indícios suficientes de materialidade aptos a respaldar a imediata instauração de procedimento disciplinar, com respeito aos servidores que assessoram o Plenário, muitos deles há vários anos, e sobre os quais não recai, prima facie, qualquer suspeita.

 

Porém, como o fato específico que deu azo à referida matéria jornalística está sob investigação no âmbito da Corregedoria, houve por bem a E. Mesa encaminhar-lhe as informações colhidas, sem prejuízo de ulteriores providências por parte da E. Mesa, como destacado na referida Decisão, caso emerjam novos elementos que o recomendem.

 

Feita tal contextualização jurídica e fática, seguem as respostas aos quesitos formulados.

 

II- Resposta aos quesitos formulados.

 

1°) O TID 18234064 reveste-se da natureza de averiguação primária, nos termos do art. 2º, § 1º do Ato da Mesa nº 1421/19.

2º) A averiguação primária, conforme art. 2º, § 1º do Ato da Mesa nº 1421/19, é o procedimento regularmente previsto quando se trata de denúncia anônima;

3º) O documento relativo à  averiguação primária atende ao disposto no art. 2º, § 1º do Ato da Mesa nº 1421/19. Não se confunde com a apuração preliminar (art. 3º, inc. I, a), regulamentado nos arts 67 a 70 do mesmo Ato.  A averiguação primária não depende de forma determinada.

4°) O TID 18234064 veiculou indagações simples e diretas, por determinação da Presidência, sobre rotinas de trabalho no setor de assessoria direta ao Plenário;

5º) As informações quanto a este ponto foram prestadas pelo Sr. Secretario Geral Administrativo;

6º) A análise do mérito das informações solicitadas compete ao Sr. Presidente da Casa e à E. Mesa;

7º) Competia à SGP prestar informações. A análise do mérito das informações prestadas compete ao Sr. Presidente e à E. Mesa, em face do escopo da instrução prévia pretendida;

8º) A tramitação do TID com as indagações formuladas por determinação da D. Presidência, como apontado pelo Sr. Secretario Geral Administrativo, foi anterior à fala do Nobre Vereador XXXXXXXXXXXX em Plenário, assim como a tramitação do documento desta Procuradoria à Secretaria Geral Parlamentar;

9°) A fala do Nobre Vereador XXXXXXXXXXXX relaciona-se à fala do Nobre Vereador XXXXXXXXXXXX e à matéria jornalística em comento; todas públicas, não se vislumbrando irregularidade na solicitação de sua adição ao expediente;

10°) O documento, ao que consta, não foi objeto de tramitação sigilosa;

11º)  A Decisão da E. Mesa decorreu do Memo nº 011/2019 – JPN – 36º GV, instruída com o Parecer ADM nº 14/2019, ao qual se juntou o expediente TID 18234064,

12°) A análise do mérito da Decisão de Mesa nº 1456/19 não compete à Procuradoria;

13°) Desconheço, pois depois de atuado o processo não tramitou por esta Procuradoria;

14°) A averiguação primária, como apontado, é o procedimento adequado diante de informações ou denúncias anônimas, conforme art. 2º § 1º do Ato da Mesa nº 1421/19.

Porém, embora sem elementos concretos, as indagações ora formuladas aventam possível hipótese de “gravíssima situação de possíveis [sic] obstrução de Justiça, assédio moral, desvio de finalidade, improbidade administrativa, fraude processual, abuso de autoridade e coação de testemunhas”.

Caberá nesse passo à E. Mesa sopesar o conjunto de elementos disponíveis, a fim de dar o encaminhamento que considere oportuno, posto que, como ressaltado no Parecer ADM 14/2019 desta Procuradoria, o juízo de admissibilidade relativamente a procedimentos disciplinares compete, no caso, à E. Mesa.

É o parecer, sugerindo o seu encaminhamento ao Nobre Vereador solicitante, cabendo a deliberação conforme o elevado crivo da autoridade superior.

 

São Paulo, 15 de abril de 2019.

 

 

MARIA NAZARÉ LINS BARBOSA

Procuradora Legislativa Chefe

OAB/SP 106.017