Parecer n° 80-ADM/2020

TID 18169124

Ref. Memo nº 020/GAB.PRES/2019

Interessado: SGA

Assunto: Assessoria Policial Civil na Câmara Municipal de São Paulo – Possibilidade de recebimento de servidores em cessão do Estado de São Paulo e de ressarcimento das despesas ao cedente ante à vigência da Lei Complementar nº 173/2020

 

Parecer ADM n° 0080/2020

 

CESSÃO DE SERVIDORES E RESSARCIMENTO AO ÓRGÃO CEDENTE – LEI COMPLEMENTAR Nº 173/2020 – Possibilidade – Previsão legal anterior à edição da Lei.

Sra. Procuradora Legislativa Supervisora,

 

Trata-se de consulta formulada pela Secretaria Geral Administrativa – SGA, submetendo à apreciação desta Procuradoria, no que pertinente a este Setor Jurídico-Administrativo, a possibilidade de recebimento de servidores públicos do Estado de São Paulo em cessão para exercerem suas funções junto à Assessoria Policial Civil da Câmara Municipal de São Paulo, bem como do ressarcimento das despesas com remuneração desses servidores ao órgão cedente, diante das restrições impostas pela Lei Complementar nº 173, de 27 de maio de 2020.

O expediente veio instruído com cópia da Resolução nº 04, de 10 de abril de 1997.

Posteriormente, SGA acrescentou considerações à consulta formulada, solicitando “solicito que a elaboração da minuta de termo de convênio deixe de se considerar o reembolso dos salários dos servidores estaduais, por ora, portanto que o mesmo seja a título não oneroso, subsistindo, entretanto, a consulta acerca dos efeitos da Lei Complementar nº 173/2020 tendo em vista eventual reembolso futuro”.

É o relatório. Passa-se a opinar.

Primeiramente analisemos a possibilidade jurídica do recebimento de servidores em cessão de outros órgãos para atuar na Câmara Municipal de São Paulo e do ressarcimento das despesas correspondentes ao órgão cedente, a qualquer tempo.

Estabelece a Resolução nº 04/97, fundamento da consulta formulada:

Art. 1º – Fica instituída, na Secretaria da Câmara Municipal de São Paulo, a Assessoria Policial Civil, subordinada à Presidência.

Art. 2º – As atribuições afetas à Assessoria Policial Civil serão exercidas por Delegados de Polícia, Investigadores e Escrivães do serviço ativo da Polícia Civil do Estado de São Paulo, colocados à disposição da Câmara Municipal pelo Governo do Estado.

Art. 3º – A Assessoria Policial Civil será integrada por:

  1. 02 (dois) Delegados de Polícia;
  2. 04 (quatro) Investigadores;
  3. 02 (dois) Escrivães.

Sobre a cessão de servidores públicos para prestar serviços junto a órgãos do Município, estabelece, ainda, a Lei Municipal nº 13.562, de 22 de abril de 2003:

Art. 1º Ocorrendo a cessão, mediante requisição, de servidor ou empregado público da Administração direta, indireta ou fundacional, Federal, Estadual ou de outros Municípios, para prestar serviços na Prefeitura do Município de São Paulo, junto à Administração direta, indireta ou fundacional, sem prejuízo dos respectivos vencimentos, fica autorizado o reembolso das importâncias pagas a título de remuneração pelo órgão ou entidade cedente.

Parágrafo Único. O disposto no “caput” deste artigo aplica-se, apenas, nas hipóteses em que, na forma da legislação do órgão ou entidade cedente, houver transferência do encargo financeiro ao cessionário. (sublinhamos)

Tal legislação tem aplicação sobre a cessão de servidores públicos para atuar junto à Câmara Municipal de São Paulo, diante da ausência de norma específica no âmbito da Edilidade, como já reconhecido nos pareceres exarados por esta Procuradoria de nº 122/2012 e nº 127/2018.

Do Parecer nº 122/2012 assim constou:

A Lei Municipal nº 13.562/2003 disciplina o “reembolso ao órgão ou entidade cedente, nos casos de afastamento de servidores ou empregados públicos para, sem prejuízo de vencimentos, prestarem serviços na Prefeitura do Município de São Paulo”. Observo que, por não ter a Câmara Municipal legislação própria sobre o assunto, possamos utilizá-la no âmbito desta Casa Legislativa.

Referida Lei dispõe, ipsis literis, em seu art. 1º:

Art. 1º – Ocorrendo a cessão, mediante requisição, de servidor ou empregado público da Administração direta, indireta ou fundacional, Federal, Estadual ou de outros Municípios, para prestar serviços na Prefeitura do Município de São Paulo, junto à Administração direta, indireta ou fundacional, sem prejuízo dos respectivos vencimentos, fica autorizado o reembolso das importâncias pagas a título de remuneração pelo órgão ou entidade cedente.

Parágrafo único – O disposto no “caput” deste artigo aplica-se, apenas, nas hipóteses em que, na forma da legislação do órgão ou entidade cedente, houver transferência do encargo financeiro ao cessionário. (negritamos)

Da leitura do artigo, depreende-se ser possível à Edilidade Paulistana efetuar o reembolso das importâncias pagas a título de remuneração pelo órgão ou entidade cedente, desde que na forma da legislação do órgão ou entidade cedente, haja transferência do encargo financeiro ao cessionário.

Passemos à análise da legislação estadual.

O Estatuto dos Funcionários Públicos Estaduais traz dispositivo específico acerca do tema afastamento de servidor sem prejuízo dos vencimentos, deixando a regulamentação de tais artigos, quais sejam, 65 e 66, para regulamento. Os Decretos nº 7.332, de 22 de dezembro de 1975, e nº 7.715, de 22 de março de 1976, disciplinam a matéria.

Os artigos 65 a 67 do Estatuto dos Funcionários Públicos Estaduais – Lei Estadual nº 10.261, de 28 de outubro de 1968, dispõem:

Artigo 65 – Nenhum funcionário poderá ter exercício em serviço ou repartição diferente daquela em que estiver lotado, salvo nos casos previstos nesta lei, ou mediante autorização do Governador.

Artigo 66 – Na hipótese de autorização do Governador, o afastamento só será permitido, com ou sem prejuízo de vencimentos, para fim determinado e prazo certo.

Parágrafo único – O afastamento sem prejuízo de vencimentos poderá ser condicionado ao reembolso das despesas efetuadas pelo órgão de origem, na forma a ser estabelecida em regulamento.

Artigo 67 – O afastamento do funcionário para ter exercício em entidades com as quais o Estado mantenha convênios, reger-se-á pelas normas nestes estabelecidas. (sublinhamos)

Já o Decreto Estadual nº 7.332, de 22 de dezembro de 1975, que regulamenta a Lei em questão, determina:

Artigo 3.º – O afastamento de que trata o artigo anterior será autorizado:

I – com ou sem prejuízo aos vencimentos ou da remuneração quando junto a órgão da administração centralizada ou autárquica do Estado;

II – sempre com prejuízo dos vencimentos ou da remuneração quando junto a fundações ou empresas da administração descentralizada do Estado, bem como junto a outros Poderes do Estado, órgãos ou entidades da União, de outros Estados e dos Municípios.

Parágrafo único – O afastamento de que trata o inciso II deste artigo, poderá ser autorizado sem prejuízo dos vencimentos ou da remuneração, quando houver manifesto interesse do Estado.

(…)

Artigo 15 – Mantidas as disposições dos Decretos n. 6.349, de 27 de junho de 1975 e 6.419, de 17 de julho de 1975 fica, ainda, delegada ao Secretário de Estado-Chefe da Casa Civil, competência para autorizar em caráter excepcional, afastamentos de que trata este decreto sem as restrições previstas no inciso II do Artigo 3.º e inciso II do Artigo 4.°.

Parágrafo único – A autorização de que trata este artigo somente será concedida quando, analisado cada caso, ficar comprovado que a natureza do afastamento recomenda a adoção de medida excepcional. (sublinhamos)

No bojo da competência delegada pelo referido artigo 15 do Decreto Estadual, foi expedida a Resolução da Casa Civil – CC nº 17, de 02 de maio de 2007[1], que assim disciplinou as formas de cessão de servidores públicos do Estado de São Paulo:

Artigo 2º – Os afastamentos iniciais ou em prorrogação de servidores ou empregados da administração direta, das autarquias, das fundações instituídas ou mantidas pelo Poder Público, das empresas em cujo capital o Estado tenha participação majoritária e das entidades por ele direta ou indiretamente controladas, solicitados sem prejuízo dos vencimentos ou salários, somente serão autorizados ou prorrogados mediante o devido ressarcimento, nos termos do Parecer CODEC 71-2007, de 26-3-2007, cujo texto em anexo integra esta resolução.

Como se vê, o ressarcimento ou não das despesas dos servidores públicos recebidos em cessão do Estado de São Paulo pela Edilidade, dependerá dos termos do Convênio que virá a ser firmado com o órgão, sendo certo que, caso a cessão se dê com prejuízo dos vencimentos na origem, caberá à Câmara arcar com a remuneração dos servidores cedidos, e caso se dê sem prejuízo dos vencimentos dos servidores, a legislação estadual a condiciona ao devido ressarcimento.

Tal situação, aliás, também já foi objeto de apreciação por esta Procuradoria, no Parecer nº 209/2007:

Cabe, portanto, à Alta Administração, decidir inicialmente sobre seu efetivo desejo em continuar contando com o servidor estadual, bem como sobre a modalidade de comissionamento que aceita, tendo em vista as disposições da legislação do Estado de São Paulo sobre o afastamento de seus servidores.

Uma vez deliberado sobre a questão acima, alguns efeitos, inclusive de cunho previdenciário, decorrem da opção feita pela Administração que não podemos deixar de abordar.

Com efeito, se esta Casa vier a solicitar o comissionamento do servidor sem prejuízo de seus vencimentos, como quer a Sra. Supervisora que deu início ao presente expediente, a primeira conseqüência será, como já ficou claro acima, esta Edilidade arcar com o pagamento de seus vencimentos correspondentes ao seu cago na origem através da figura do ressarcimento, bem como caberá igualmente a este Legislativo suportar o recolhimento da contribuição previdenciária incidente sobre os vencimentos do servidor no seu cargo de origem, devida ao Instituto de Previdência do Estado de São Paulo – IPESP.

De outra parte, se a Administração pretender o comissionamento do servidor com prejuízo de seus vencimentos, fato para o qual não há óbice de ordem legal, esta Câmara não dispenderá nada a título de ressarcimento dos vencimentos percebidos pelo servidor no órgão de origem, no entanto, continuará cabendo a ela suportar o recolhimento da contribuição previdenciária incidente sobre os vencimentos do servidor no seu cargo de origem, devida ao Instituto de Previdência do Estado de São Paulo – IPESP.

No caso concreto, como inexistem os cargos descritos na Resolução nº 04/1997 na Casa, não parece haver outra hipótese possível para alocação de delegados, investigadores e escrivães na Assessoria Policial Civil da Edilidade, subordinada à Presidência da Casa, que não seja por meio da cessão sem prejuízo dos vencimentos, situação em que será obrigatório o ressarcimento das despesas suportadas pelo órgão cedente, haja vista o teor da Resolução da Casa Civil do Estado de São Paulo-CC nº 17/2007 atualmente vigente.

Estabelecidas tais premissas, resta analisar se, com o advento da Lei Complementar nº 173/2020, foram vedadas até 31/12/2021 o recebimento de servidores públicos de outros órgãos em cessão, bem como as despesas com sua remuneração, ainda que por meio de ressarcimento ao órgão cedente.

Dispõe a Lei Complementar Federal nº 173/2020:

Art. 8º Na hipótese de que trata o art. 65 da Lei Complementar nº 101, de 4 de maio de 2000, a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios afetados pela calamidade pública decorrente da pandemia da Covid-19 ficam proibidos, até 31 de dezembro de 2021, de:

(…)

IV – admitir ou contratar pessoal, a qualquer título, ressalvadas as reposições de cargos de chefia, de direção e de assessoramento que não acarretem aumento de despesa, as reposições decorrentes de vacâncias de cargos efetivos ou vitalícios, as contratações temporárias de que trata o inciso IX do caput do art. 37 da Constituição Federal, as contratações de temporários para prestação de serviço militar e as contratações de alunos de órgãos de formação de militares;

(…)

VII – criar despesa obrigatória de caráter continuado, ressalvado o disposto nos §§ 1º e 2º;

(…)

  • 1º O disposto nos incisos II, IV, VII e VIII do caput deste artigo não se aplica a medidas de combate à calamidade pública referida no caput cuja vigência e efeitos não ultrapassem a sua duração.
  • 2º O disposto no inciso VII do caput não se aplica em caso de prévia compensação mediante aumento de receita ou redução de despesa, observado que:

I – em se tratando de despesa obrigatória de caráter continuado, assim compreendida aquela que fixe para o ente a obrigação legal de sua execução por período superior a 2 (dois) exercícios, as medidas de compensação deverão ser permanentes; e

II – não implementada a prévia compensação, a lei ou o ato será ineficaz enquanto não regularizado o vício, sem prejuízo de eventual ação direta de inconstitucionalidade.

(…)

A princípio, o recebimento de servidores públicos de outros órgãos por meio de cessão não se enquadra no conceito de admissão ou de contratação. Isto porque, a Doutrina Administrativa a conceitua como modalidade de afastamento do servidor de seu órgão de origem, sem qualquer modificação no vínculo, para prestar serviços em outra entidade.

Nesse sentido, expõe o Prof. Matheus CARVALHO[2]:

Conforme disposição da Lei 8112/90, o servidor público poderá ser cedido para ter exercício em outro órgão ou entidade dos Poderes da União, dos Estados, ou do Distrito Federal e dos Municípios ou em serviço social autônomo instituído pela União que exerça atividades de cooperação ou função de confiança, ou de direção ou gerência no caso dos serviços sociais autônomos, além de situações previstas em lei específica. A cessão será realizada por meio de portaria, a qual deverá ser publicada no Diário Oficial da União.

Igualmente, explana BANDEIRA DE MELLO[3]:

11.. (c) Os afastamentos, tal como as licenças, são direitos de ausência ao serviço, cabíveis por variadas razões.

São 12 as hipóteses de afastamento, embora sob tal titulação a lei refira apenas 3: a) para servir a outro órgão ou entidade, por tempo indeterminado (art. 93, c/c art. 102, II e III); 2) para exercício de mandato eletivo, durante o prazo de sua duração (art. 94, c/c art. 102, V); 3) para estudo ou missão no Exterior, quando autorizado, até o máximo de 4 anos (art. 95 e §1º, c/c art. 102, VII).

(…)

  1. (…) Os afastamentos serão sem prejuízo da remuneração também em quase todas as hipóteses. Só não terão obrigatoriamente esta compostura em 3 dentre as 11 modalidades: para exercício de mandato eletivo, porque, nestes casos, a situação varia; para servir a outro órgão ou entidade, porque, tratando-se de cargo em comissão ou assemelhado, ficará afastado com prejuízo da remuneração, vindo a perceber por este último, e, fora daí – uma vez que a lei é silente – , o regime dependerá de lei específica ou, na falta desta, de decisões da entidade cedente e da cessionária; para participar de competição desportiva nacional ou integrar representação desportiva nacional, porque a Lei 8.112 remete a solução para legislação específica.

CARVALHO FILHO[4] também destrincha o conceito de “cessão de servidores”:

Cessão de servidores é o fato funcional por meio do qual determinada pessoa administrativa ou órgão público cede, sempre em caráter temporário, servidor integrante de seu quadro para atuar em outra pessoa ou órgão, com o objetivo de cooperação entre as administrações e de exercício funcional integrado das atividades administrativas. Trata-se, na verdade, de empréstimo temporário do servidor, numa forma de parceria entre as esferas governamentais. Avulta notar, porém, que tal ajuste decorre do poder discricionário de ambos os órgãos e do interesse que tenham na cessão; sendo assim, não há falar em direito subjetivo do servidor à cessão.

Alguns estatutos funcionais disciplinam a cessão, enquanto outros silenciam sobre o fato, e isso porque se trata de ajuste bilateral oriundo de consenso entre pessoas ou órgãos diversos, frequentemente sujeitos a estatutos diferentes. Presente o interesse dos pactuantes, usualmente configurado através da troca de ofícios, o cedente formaliza sua anuência por meio de ato administrativo de cessão, sujeito a todos os requisitos de validade.

O órgão que disponibiliza o servidor denomina-se de cedente e aquele ao qual é cedido o servidor leva o nome de cessionário. Entretanto, como acentuamos em outra oportunidade, a alteração não desnatura a vinculação funcional do servidor com o órgão cedente. Sendo assim, extinta a cessão, o servidor retornará normalmente às suas funções no órgão de origem.

Assim, por sua natureza jurídica, o recebimento de servidores públicos mediante cessão de outros órgãos não se enquadra nas ações vedadas pelo art. 8º, inciso IV, da Lei Complementar nº 173/2020.

Nessa toada, aliás, foi a conclusão do parecer da  Associação do Ministério Público do Estado do Rio de Janeiro – AMPERJ[5] acerca dos reflexos operados pela Lei Complementar nº 173/2020, exarado a pedido do Conselho Nacional dos Procuradores-Gerais dos Ministérios Públicos dos Estados e da União (CNPG) e da Associação Nacional do Ministério Público (CONAMP):

  1. Ainda é importante ressaltar que o inciso IV do art. 8º da LC nº 173/2020 não estabelece qualquer vedação à cessão de servidores ao Ministério Público, com ônus para o órgão de origem ou mediante ressarcimento. Assim ocorre, em primeiro lugar, porque essa cessão não pode ser equiparada à admissão de pessoal, já que remanesce o vínculo funcional com o órgão origem.

Mesmo que assim não fosse, e que o recebimento de servidores por meio de cessão se equiparasse a admissão ou contratação, ou, ainda, que se interpretasse a Lei Complementar nº 173/2020 de modo mais cauteloso e atrelado à sua finalidade precípua de evitar a criação de novas despesas até 31/12/2020, deve-se ressaltar que, in casu, está presente o elemento da determinação legal anterior, na medida em que a Resolução nº 04 prevê desde 1997 o comissionamento de até 02 (dois) delegados de Polícia, 04 (quatro) investigadores e 02 (dois) escrivães para funcionamento da Assessoria Policial Civil na Câmara Municipal de São Paulo.

Desse modo, na hipótese de se equiparar cessão à admissão/contratação, poder-se-ia também equiparar tais comissionamentos às reposições de cargos de chefia, direção ou assessoramento, ou mesmo de cargos efetivos vagos, ressalvas feitas no próprio inciso IV, in fine, do art. 8º da Lei Complementar nº 173/2020.

São as razões pelas quais se entende não haver qualquer óbice na referida Lei ao recebimento de servidores públicos por cessão de outros órgãos, ainda que mediante ressarcimento ao órgão cedente, especialmente quando norma anterior já o previa, inclusive com limite legal de servidores a serem comissionados, como é a situação apresentada pela Resolução nº 04/1997.

Por outro lado, o ressarcimento de despesas a ser arcado pela Edilidade com tais comissionamentos também parece não sofrer obstáculo pelo disposto do inciso VII do art. 8º da Lei Complementar nº 173/2020.

Referido dispositivo veda até 31/12/2021, em geral, a criação de despesa obrigatória de caráter continuado.

O próprio art. 8º, §2º, inciso I, da Lei Complementar, dispõe que despesa obrigatória de caráter continuado é “aquela que fixe para o ente a obrigação legal de sua execução por período superior a 2 (dois) exercícios”.

No presente caso, o Convênio que vier a ser firmado com o Estado de São Paulo, visando a cessão de servidores para compor a Assessoria Policial Civil da Casa, não cria despesa, uma vez que apenas efetiva a previsão legal anterior estabelecida pela Resolução nº 04/1997.

Outrossim, como já exposto acima, a Lei Municipal nº 13.562/2003 também já autorizava previamente à Lei Complementar nº 173/2020 a possibilidade de reembolso das importâncias pagas a título de remuneração pelo órgão cedente.

Assim, o Convênio que venha a ser firmado apenas dará cumprimento a dispositivos legais previamente existentes, o que não é vedado pela legislação complementar em análise.

Por outro lado, há também de se destacar que mesmo a despesa criada pela Resolução nº 04/1997 não se caracteriza como obrigatória.

Nas palavras dos Professores Regis Fernandes de OLIVEIRA e Estevão HORVATH[6], despesa obrigatória de caráter continuado “é a despesa corrente derivada de lei, medida provisória ou ato administrativo normativo que fixem para o ente a obrigação legal de sua execução por um período superior a dois exercícios (art. 17 da LC 101/2000). Logo, imprescindível, como já se viu, que a despesa por, no mínimo, três exercícios, uma vez que a lei fala em período superior a dois exercícios”.

Em decorrência, o parecer já citado acima, de lavra da Associação do Ministério Público do Estado do Rio de Janeiro – AMPERJ, também destacou:

  1. (…) Além disso, mesmo que a cessão se estenda por mais de um exercício, tendo caráter continuado, não caracteriza uma despesa obrigatória, já que não imposta por ato normativo, o que atrairia a vedação prevista no inciso VII do art. 8º.

In casu, como se observa da leitura da Resolução nº 04/1997, a norma não impõe uma despesa obrigatória, mas tão-somente institui a Assessoria Policial Civil no âmbito da Câmara Paulistana e autoriza o recebimento de servidores cedidos pelo Estado de São Paulo para tanto. Não há que se falar, portanto, em obrigação de despesa, até mesmo porque os referidos comissionamentos dependem de vontade bilateral dos entes cedente e cessionário, além, é claro, do interesse público e da existência de disponibilidade orçamentária.

Outrossim, ainda que assim não fosse, os §§1º e 2º do art. 8º da Lei são claros ao estabelecerem que mesmo a criação de despesa obrigatória de caráter continuado não resta totalmente proibida até 31/12/2021, sendo cabível, para além das hipóteses de medidas de combate à calamidade pública (§1º), também nos casos em que houver a prévia e permanente compensação mediante aumento de receita ou redução de despesa (§2º, I).

Pelo exposto, entende-se que, pelos aspectos da Lei Complementar nº 173/2020, não há qualquer óbice à efetivação da Resolução nº 04/1997, com o recebimento de servidores públicos do Estado de São Paulo, mediante ressarcimento, seja porque se trata de legislação anterior à edição da Lei restritiva, seja porque não se trata de hipótese admissão/contratação ou de criação de despesa vedados até 31/12/2021.

Por fim, seja porque não foi objeto da consulta formulada seja porque não constam do expediente informações acerca do momento em que se pretende efetivar o comissionamento de servidores na Assessoria Policial Civil, a presente análise não adentrou a implicações específicas da Lei de Responsabilidade Fiscal (Lei Complementar nº 101, de 04 de maio de 2000) e da legislação eleitoral sobre o caso em questão, eventualmente incidentes sobre o período atual, razão pela qual se sugere a formulação de nova consulta caso haja pretensão de receber os servidores previstos na Resolução nº 04/1997 antes da posse dos eleitos no pleito eleitoral municipal que se avizinha.

É a manifestação que se submete à elevada apreciação de V. Sa.

São Paulo, 07 de outubro de 2020.

 

Djenane Ferreira Cardoso Zanlochi

Procuradora Legislativa

OAB/SP nº 218.877

[1] Disponível em http://www.bibliotecajuridica.sp.gov.br/Resolucoes.asp. Acesso em 07/10/2020.

[2] CARVALHO, Matheus. Manual de Direito Administrativo. 4. ed. rev., atual. e ampl. Salvador: JusPODIVM, 2017, p. 872.

[3] BANDEIRA DE MELLO, Celso Antônio. Curso de Direito Administrativo. 26. ed. rev. e atual. São Paulo: Malheiros, 2009. p. 314-316.

[4] CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de Direito Administrativo. 31. ed. rev., atual. e ampl. São Paulo: Atlas, 2017. Paginação irregular.

[5] Disponível em https://www.amperj.org/blog/artigo/a-lei-complementar-no-173-2020-o-programa-federativo-de-enfrentamento-ao-covid-19-e-os-seus-contornos-estruturais/#:~:text=8%C2%BA%20da%20LC%20n%C2%BA%20173,funcional%20com%20o%20%C3%B3rg%C3%A3o%20origem. Acesso em 06/10/2020.

[6] OLIVEIRA, Regis Fernandes de e HORVATH, Estevão. “Manual de Direito Financeiro”. 6. ed. rev. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2003. p. 87/88.


TID 18169124

Ref. Memo nº 020/GAB.PRES/2019

Assunto: Assessoria Policial Civil na Câmara Municipal de São Paulo – Possibilidade de recebimento de servidores em cessão do Estado de São Paulo e de ressarcimento das despesas ao cedente ante à vigência da Lei Complementar nº 173/2020

 

Errata ao Parecer ADM n° 0080/2020

Sra. Procuradora Legislativa Chefe,

 

Apresento à apreciação superior errata ao Parecer ADM nº 0080/2020, de minha lavra, para que se faça constar que em sua página 09, 2º parágrafo, onde se lê “até 31/12/2020”, leia-se “até 31/12/2021”.

É a manifestação que se submete à elevada análise de V. Sa.

São Paulo, 04 de janeiro de 2021.

 

Djenane Ferreira Cardoso Zanlochi

Procuradora Legislativa Supervisora Substituta

Setor Jurídico-Administrativo

OAB/SP nº 218.877