Parecer n° 54/2014

Parecer nº. 54/2014
TIDs nºs xxxxxxxx e xxxxxxxx
Interessado: Gabinete da Presidência
Assunto: Cópias de missivas e ofício concernentes a denúncias envolvendo a “Feira da Madrugada”. Pedido de adoção de providências. Ausência de ofensa à honra da Edilidade Paulistana, ou de ofensa a Vereador, no exercício do mandato. Artigo 1º, inciso V, da Lei Municipal nº 14.259/2007. Impossibilidade de adoção de providências por parte do corpo de Procuradores desta Casa. Possibilidade de adoção de providências, de forma direta, por eventuais Vereadores que se sentirem ofendidos em sua honra. Pareceres Procuradoria nºs. 94/2011 e 196/2011.

Sra. Procuradora Supervisora,

Trata-se de vários expedientes tendo por objeto fatos envolvendo a denominada “feira da madrugada”.

No primeiro deles (TID xxxxxx), consta cópia de representação formulada pelo “Presidente” do “Grupo de Permissionários indignados com a continuidade da estrutura criminosa que se instalou na gestão xxxxxxx e permanece na gestão xxxxxxxx junto a feira da madrugada”.

Tal “representação” teria sido encaminhada à Secretaria da Subprefeitura – com cópia para a Prefeitura de São Paulo, à Corregedoria desta Edilidade, ao Ministério Público de São Paulo e ao Deputado Federal xxxxxxalente (PSOL) – solicitando providências no sentido de que haja “uma intervenção urgente e enérgica junto a FEIRA DA MADRUGADA e SUBPREFEITURA DA MOOCA”, vez que “A partir da reabertura da Feira da Madrugada que ocorreu em 22/12/2013, após a reforma se instalou a mesma quadrilha do passado, que tem como objetivo extorquir, manipular funcionários da municipalidade por meio de propinas, emissão de documentos dubles gerados pela Subprefeitura da Mooca, guias frias com a taxa de R$ 910,00, favorecimento de terceiros, etc…”.

E especificamente quanto aos Srs. Vereadores desta Edilidade, consta de tal representação:

“…Descrevemos a seguir, de forma direta e objetiva, a atual estrutura criminosa onde vereadores, agentes públicos, advogados sem escrúpulos e demais membros operadores.

Sustentabilidade Política:

– Vereador xxxxxxxxx (mentor, chefe da quadrilha), ligado a Igreja Universal “PRB”, “manda e desmanda na Subprefeitura da Mooca”.

– Vereador xxxxxxxx,

– Vereador xxxxxxxxxxx,

– Vereador xxx “PT”.

Áreas de atuação; alvarás, fiscalizações diversas, PTU´s, operação de venda de bancas duble e remanejamentos de Box/posição privilegiadas, junto a Feira da Madrugada.

Responsável pelas Operações junto a sub prefeitura da Mooca – Vereador xxxxxxxxxxx através do Sr.xxxxxxxx – indicado pelo vereador xxxxxxxx…”

“….Composição:

Vereador xxxxxxxxxxx que dão sustentabilidade política a estrutura 50%.

xxxxxxxxx 10%.

Operadores Feira da Madrugada 30%…”

Nesse passo, solicitou o Sr. Chefe de Gabinete:

“No que diz respeito ao Exmo. Sr. xxxxxxxxxxx, entre imediatamente com queixa crime….”

No segundo expediente (TID nº xxxxxxx) – encaminhado pela Federação do Comércio Popular do Estado de São Paulo – FECOPESP, ao Exmo. Vereador Presidente desta Edilidade – enviou-se cópia dos ofícios que tal federação remeteu ao Ministério Público deste Estado e ao Secretário Municipal de Coordenação das Subprefeituras. Em tal expediente foi exarado despacho do Sr. Chefe de Gabinete da Presidência desta Casa solicitando que o mesmo acompanhasse o primeiro dos expedientes em apreço (TID nº 11801618).

Finalmente, o terceiro dos expedientes (TID nº xxxxxxx), consubstancia cópia de parte de ofício da primeira entidade, adicionando novas “denúncias”, nos seguintes moldes:

“…Não bastasse as operações de venda e remanejamento de BOX que constaram da denúncia encaminhada a V. S. as 14/02/2014, protocolo do Ministério Publico numero 0024467/14, o Adv xxxxxxxxxx, presidente da Federação do Comércio Popular de São Paulo, ligado ao vereador xxxxxxxx e demais vereadores da Câmara Municipal de São Paulo, se intitula autoridade máxima, o dono da Feira da Madrugada, para desemparedar local que foi objeto de ação administrativa da Subprefeitura da Mooca e Secretaria da Subprefeitura, na sequencia fotos onde mostra o crime de desemparedamento da passagem, os tijolos removidos e a instalação de portas de aço…”

Também sobre tal expediente, o I. Chefe de Gabinete da Presidência determinou que acompanhasse o primeiro dos expedientes (TID nº xxxxxxx).

Desse modo, denota-se que dos três expedientes agrupados, apenas no primeiro há determinação, por parte do I. Chefe de Gabinete, de adoção de providência, qual seja, “No que diz respeito ao Exmo. Sr. Presidente , entre imediatamente com queixa crime…”.

E sobre tal possibilidade, cumpre apontar que da simples leitura das transcrições das “denúncias” levadas a efeito, tem-se que eventual crime contra a honra teria sido perpetrado em face do Sr. Vereador xxxxxxxxxx – e dos outros Edis citados – não em razão de ato praticado no exercício do mandato; sem se olvidar que não consta do expediente em apreço declaração expressa do Exmo. Presidente solicitando adoção de providências, em razão da ofensa perpetrada (o que só poderia ser expressado, pessoalmente, pelo próprio Edil).

Outrossim, não consta de tais denúncias, s.m.j., qualquer indicação de difamação perpetrada em face do “órgão” Câmara Municipal de São Paulo.

Sobre essa matéria, esta Procuradoria já se manifestou, nos autos do Processo Administrativo nº 744/2011, em que o I. Vereador xxxxxxx pretendia a adoção de providências por parte da Edilidade Paulistana, com o fito que fosse defendida sua “boa imagem”, em razão de filmes postados na internet.

Naquela ocasião, foi exarado o parecer da Procuradoria nº 94/2011, da lavra do Sr. Procurador Legislativo, Dr. Antônio Rodrigues de Freitas Júnior, em que se apontou que não se vislumbrava, “assaque verbal capaz de lesionar a honra da Câmara Municipal de São Paulo” (cópia anexa).

No mesmo Processo Administrativo, foi exarado novo parecer (nº 196/2011 – cópia anexa), em que se concluiu que:

“…observando que não pude constatar nenhum fragmento que pudesse fugir à caracterização de ofensa dirigida a membros do Legislativo, seus gestores e prefeito. Não, todavia, ao ponto de se traduzir em assaque à honra objetiva da Casa Legislativa que integram. Entrementes reitero o quanto já afirmado relativamente à necessidade de sopesamento dos excessos da crítica, em matéria de tutela à honra e à imagem do agente político; particularmente quando referentes a ações praticadas na esfera pública. Por fim, pondero que mesmo nos casos de ofensas pessoais aos agentes políticos, eventual impugnação judicial, no plano cível ou criminal, poderá ensejar um efeito perverso; qual seja o de conferir visibilidade, iluminando um produto chulo e grosseiro pela grandeza de reconhecer sua aptidão para ofender” (destaques meus).

E como decorrência de tal parecer, apontei naquela ocasião que “conforme já indicado no parecer de fs. 94/101, “Para fins penais a figura do Vereador, assim como a de todo agente político (observadas derrogações que porventura a lei excepcione) é tratada como funcionário público (art. 337 do Código Penal)”, do que decorre a aplicação da Súmula 714 do E. Supremo Tribunal Federal no sentido de que “É concorrente a legitimidade do ofendido, mediante queixa, e do Ministério Público, condicionada à representação do ofendido, para a ação penal por crime contra a honra de servidor público em razão do exercício de suas funções”, podendo, pois, eventual Edil ofendido apresentar queixa ou representação ao Ministério Público, dentro dos prazos legais, sem prejuízo, ainda, de anterior apresentação de pedido de explicações (art. 144 do Código Penal).” (cópia anexa).

Nesse diapasão, a Lei Municipal nº 14.259/2007 – que dispôs sobre a estrutura e atribuições da Procuradoria desta Casa – em seu artigo 1º, inciso V, outorgou atribuição aos respectivos Procuradores para “atuar judicial e administrativamente na defesa dos interesses e prerrogativas da Câmara Municipal de São Paulo, do Sr. Presidente e, mediante prévia solicitação e autorização da Mesa, na defesa judicial dos Vereadores no tocante aos atos praticados no exercício de suas prerrogativas….” – o que afasta, por si só, a atuação desta Procuradoria para defesa de Edil que não esteja no exercício do mandato ou na defesa de interesse e prerrogativa da Câmara Municipal de São Paulo.

Corrobora a correção da norma acima transcrita a existência do Inquérito Civil nº 226/2012, em curso perante o Ministério do Estado de São Paulo, que foi instaurado exatamente com o fito de “apuração de irregularidades e eventual improbidade administrativa na representação judicial dos agentes políticos, os atuais xxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxx, por ferimento aos princípios da moralidade, impessoalidade e legalidade, em razão dos membros da Procuradoria terem obrigação de defender o ente municipal e não as pessoas dos agentes políticos ocupantes de cargo ou mandato” (cópia anexa), o qual ainda se encontra em curso.

Aliás, conforme noticiado em tal Inquérito, os agentes políticos que eram representados pela Procuradoria deste Município nos autos da Ação Civil Pública nº 0030922-79.2011.8.26.0053, requereram a desistência da questionada representação no curso do feito (cópia anexa).

Face ao exposto, tem-se que:

1) Da simples leitura das transcrições das “denúncias” levadas a efeito, tem-se que eventual crime contra a honra teria sido perpetrado em face do Sr. Vereador xxxxxxxx e dos outros Edis citados – não em razão de ato praticado no exercício do mandato; sem se olvidar que não consta do expediente em apreço declaração expressa do Exmo. Presidente solicitando adoção de providências, em razão da ofensa perpetrada (o que só poderia ser expressado, pessoalmente, pelo próprio Edil);

2) Não consta de tais denúncias, s.m.j., qualquer indicação de difamação perpetrada em face do “órgão” Câmara Municipal de São Paulo;

3) Parecer da Procuradoria nº 94/2011, da lavra do Sr. Procurador Legislativo, Dr. Antônio Rodrigues de Freitas Júnior, se apontou que não se vislumbrava “assaque verbal capaz de lesionar a honra da Câmara Municipal de São Paulo” (cópia anexa);

4) No mesmo Processo Administrativo, foi exarado novo parecer (nº 196/2011 – cópia anexa), em que se concluiu que:

“…observando que não pude constatar nenhum fragmento que pudesse fugir à caracterização de ofensa dirigida a membros do Legislativo, seus gestores e prefeito. Não, todavia, ao ponto de se traduzir em assaque à honra objetiva da Casa Legislativa que integram. Entrementes reitero o quanto já afirmado relativamente à necessidade de sopesamento dos excessos da crítica, em matéria de tutela à honra e à imagem do agente político; particularmente quando referentes a ações praticadas na esfera pública. Por fim, pondero que mesmo nos casos de ofensas pessoais aos agentes políticos, eventual impugnação judicial, no plano cível ou criminal, poderá ensejar um efeito perverso; qual seja o de conferir visibilidade, iluminando um produto chulo e grosseiro pela grandeza de reconhecer sua aptidão para ofender” (destaques meus);

5) Para fins penais, a figura do Vereador – assim como a de todo agente político (observadas derrogações que porventura a lei excepcione) – é tratada como funcionário público (art. 337 do Código Penal), do que decorre a aplicação da Súmula 714 do E. Supremo Tribunal Federal no sentido de que “É concorrente a legitimidade do ofendido, mediante queixa, e do Ministério Público, condicionada à representação do ofendido, para a ação penal por crime contra a honra de servidor público em razão do exercício de suas funções”, podendo, pois, eventual Edil ofendido apresentar queixa ou representação ao Ministério Público, dentro dos prazos legais, sem prejuízo, ainda, de anterior apresentação de pedido de explicações (art. 144 do Código Penal);

6) A Lei Municipal nº 14.259/2007, em seu artigo 1º, inciso V, afasta, por si só, a atuação desta Procuradoria para defesa de Edil que não esteja no exercício do mandato ou na defesa de interesse e prerrogativa da Câmara Municipal de São Paulo;

7) O Inquérito Civil nº 226/2012, em curso perante o Ministério do Estado de São Paulo, foi instaurado exatamente com o fito de “apuração de irregularidades e eventual improbidade administrativa na representação judicial dos agentes políticos, os atuais xxxxxxxxxxxxxxxxxxxx, por ferimento aos princípios da moralidade, impessoalidade e legalidade, em razão dos membros da Procuradoria terem obrigação de defender o ente municipal e não as pessoas dos agentes políticos ocupantes de cargo ou mandato” (cópia anexa) – o que corrobora o acerto da prescrição inserta no artigo 1º, inciso V da Lei Municipal nº 14.259/2007.

É o que entendo, s.m.j., submetendo à apreciação superior.

São Paulo, 14 de março de 2014

ANDRÉA RASCOVSKI ICKOWICZ
Procuradora Legislativa – Setor Judicial
OAB/SP 130.317