Parecer nº 406/16
TID nº xxxxxxxxxxxxxxxxx
Processo nº 68/16
Assunto: Contrato – penalidades
Sra. Procuradora Legislativa Supervisora,
A Secretaria Geral solicita análise e manifestação acerca do recurso administrativo e da defesa prévia interpostos pela empresa xxxxxxxxxxxxxxxx, tendo em vista ocorrências na execução do Contrato nº 33/16, mantido com esta Edilidade, que tem por objeto o fornecimento de café.
I- Dos fatos
Em 12/08, o Sr. Supervisor de SGA.21 comunicou o atraso de 19 dias na entrega do produto (fls. 384), o que ensejou a aplicação da penalidade prevista na cláusula 9.1.1 do ajuste. Instada a manifestar-se (fls. 386), o prazo decorreu “in albis”, ensejando a aplicação da penalidade de multa de 1% sobre o valor dos produtos solicitados (fls. 388).
Por outro lado, uma amostra dos produtos entregues foi enviada para análise no laboratório ITAL (fls. 384 e 377), sendo que o laudo classificou o café como “não recomendável para consumo”. Assim, a empresa foi notificada a substituir o café restante.
O prazo para substituição estabelecido no item 2.2.2. do contrato não foi observado (fls. 377). Assim, a empresa foi intimada a oferecer defesa prévia, sob pena de aplicação das sanções previstas nos itens 9.1.3 e 9.1.4 do ajuste (fls. 392).
A empresa apresentou Pedido de Reconsideração em relação à sanção aplicada relativa ao item 9.1.1 do ajuste (fls. 393/396).
Além disso, ofereceu defesa prévia em face da possibilidade de sofrer as sanções referentes aos itens 9.1.3 e 9.1.4. (fls. 412/418).
O Supervisor de SGA.21 manifesta-se pela aplicação das penalidades. Por um lado, o laudo alternativo que a empresa ofereceu não foi levado em consideração, posto que não dizia respeito ao produto entregue. Por outro lado, houve o atraso na substituição, gerando interrupção do serviço de café na Edilidade por alguns dias e acarretando prejuízos (fls. 423).
Passamos à análise em separado do Pedido de Reconsideração e da Defesa Prévia.
II- Pedido de Reconsideração referente à aplicação da penalidade prevista na cláusula 9.1.1 (1% sobre o valor dos produtos entregues em atraso).
A empresa, que não havia apresentado defesa prévia, opôs Pedido de Reconsideração da aplicação dessa penalidade às fls. 393/397.
Alegou, em síntese, que não teria havido dolo nem intenção de causar prejuízo ao órgão, e que o atraso deveu-se a circunstâncias alheias à sua vontade.
As razões aduzidas, sem provas que as respaldem, não se revelam suficientes para elidir a aplicação da penalidade.
Por esta razão, parece-me que o Pedido de Reconsideração de fls. 393/397 há de ser conhecido e, no mérito, indeferido.
III- Defesa prévia quanto à multa cabível com fundamento na cláusula 9.1.3 (5% sobre o valor dos produtos solicitados por dia de atraso na substituição limitado ao máximo de 5 dias, sendo que, findo este prazo poderá ser aplicada a pena do subitem 9.1.4)
A defesa prévia é tempestiva.
A empresa alega:
a) ter havido dúvidas quanto à quantidade a ser substituída;
b) de todo o lote analisado, apenas duas amostras foram recusadas;
c) não houve dolo;
d) caso se entenda por aplicação da multa, seria cabível tão somente com relação às quantidades substituídas em atraso;
e) tendo em vista o princípio da proporcionalidade, não caberia penalizá-la cumulativamente com a sanção prevista na cláusula 9.1.4 (10% sobre o valor total do ajuste).
Note-se que houve o recálculo em função da retificação de quantidades de modo que os valores correspondentes seriam (fls. 403):
– Multa de 5% = R$ 1.717,18
– Valor de 10% = R$ 9.730, 50
Analisando a defesa prévia apresentada, a área técnica mantém a indicação de aplicação de penalidades (fls. 423).
IV- Das regras legais e contratuais
A Lei nº 8.666/93 determina que a inexecução dos deveres contratuais acarreta a imposição de sanções, que podem consistir em advertência, multa, suspensão do direito de licitar e declaração de inidoneidade para licitar. A lei silenciou acerca dos pressupostos da aplicação de cada sanção. Assim, as hipóteses de incidência para a aplicação de cada sanção devem estar estabelecidas no edital, a fim de delimitar o sancionamento. Não se admite discricionariedade em matéria punitiva, em homenagem ao princípio da legalidade, e como decorrência deste, exige-se a tipicidade.
Ao lado dessa premissa, é pacífico que o sancionamento ao infrator deve ser compatível com, a gravidade da infração, isto é, devem-se evitar as punições excessivas em relação aos fatos que as motivam.
A lei nº 8.666/93 dispõe:
“Art. 87. Pela inexecução total ou parcial do contrato a Administração poderá, garantida a prévia defesa, aplicar ao contratado as seguintes sanções:
I – advertência;
II – multa, na forma prevista no instrumento convocatório ou no contrato;
III – suspensão temporária de participação em licitação e impedimento de contratar com a Administração, por prazo não superior a 2 (dois) anos;
IV – declaração de inidoneidade para licitar ou contratar com a Administração Pública.”
Tendo a lei previsto um universo de quatro sanções, dotadas de diverso grau de severidade, impõe-se adequar as sanções mais graves às condutas mais reprováveis.
As condições específicas de imposição das sanções, no caso, estão explicitadas no instrumento convocatório e no contrato. Isto é: o contrato estabelece os pressupostos básicos delimitadores das sanções, indicando a conduta apta a produzi-las.
Com efeito, o contrato nº 33/16, seguindo a minuta que acompanhou o instrumento convocatório, previu na cláusula referente a penalidades:
“9.1. O descumprimento de quaisquer das obrigações assumidas importará na aplicação das seguintes penalidades:
9.1.1. Multa 1% (um por cento) sobre o valor dos produtos solicitados, por dia de atraso nos prazos estabelecidos no item 2.1.2, para entrega dos produtos, limitado ao máximo de 10 (dez) dias, findo este prazo poderá ser aplicada a pena do subitem 9.1.4.
9.1.2. Multa de 5% (cinco por cento) sobre o valor dos produtos solicitados, por dia de atraso nos prazos estabelecidos no item 2.2.1, limitado ao máximo de 05 (cinco) dias, findo este prazo poderá ser aplicada a pena do subitem 9.1.4.
9.1.3. Multa de 5% (cinco por cento) sobre o valor dos produtos solicitados a serem substituídos, por dia de atraso no prazo na substituição do produto de acordo com o subitem 2.2.2, limitado ao máximo de 05 (cinco) dias, findo este prazo poderá ser aplicada a pena do subitem 9.1.4.
9.1.4. Multa de 10% (dez por cento) sobre o valor estimado total do ajuste, na hipótese de inexecução parcial, ou qualquer outra irregularidade havida no cumprimento do avençado, por culpa da CONTRATADA.”
A lei admite a cumulação de sanções de multa e de suspensão do direito de licitar; e o contrato, mais especificamente, prevê a cumulação de multas com independência entre si.
Note-se também que ultrapassado o prazo de atraso de 10 ou 5 dias, conforme o caso, a Administração pode desde logo interpretar a falta como inexecução parcial e aplicar sanção muito mais severa, prevista na cláusula 9.1.4.
V- O caso concreto
A especificidade do caso é que houve, logo na primeira etapa de execução contratual, dois episódios desabonadores à Contratada: o atraso na entrega e o atraso na substituição de produtos entregues em desacordo com as exigências contratuais.
Os fatos estão caracterizados e não resta dúvida quanto à possibilidade de aplicação das sanções cumulativas, conforme itens 9.1.1, 9.1.3 e 9.1.4. Todavia, penso que a Administração poderá ponderar que:
a) a empresa contratada é uma Empresa de Pequeno Porte- EPP, que na legislação de licitações recebe um tratamento diferenciado, tendo em vista fins sociais;
b) trata-se da primeira entrega, e já houve uma sanção no valor de R$ 1.497,00;
c) o atraso na substituição poderá ser sancionado nos termos da cláusula 9.1.3, acarretando uma nova sanção no valor de R$ 1.717,81, sem que obrigatoriamente se cumule a sanção – mais severa – inscrita na cláusula 9.1.4, que implicaria uma sanção de R$ 9.730,50;
d) é possível que o triplo sancionamento logo no início da execução contratual dificulte sobremaneira a continuidade na execução do contrato, haja vista a NF de fls. 383, indicando que a sanção assim imposta ultrapassaria o valor a receber em função da parcela já executada.
Neste contexto, quer-me parecer que seria mais razoável o sancionamento tão somente em relação à sanção inscrita na cláusula 9.1.3, (além da sanção já aplicada relativa ao item 9.1.1) sem cumulação com a sanção inscrita na cláusula 9.1.4.
Com efeito, a imposição de multa adicional, neste momento, mereceria ressalvas sob o aspecto jurídico, por incompatibilidade com o princípio da proporcionalidade e da razoabilidade, que passo a apontar.
Uma vez aplicada a sanção de multa inscrita no item 9..1.1 em relação a um fato (atraso na entrega) e a multa inscrita na cláusula 9.1.3 (atraso na substituição), a sanção da cláusula 9.1.4 (inexecução parcial), correspondendo a 10% do valor total do ajuste parece-me excessiva para a situação narrada, tanto mais que se trata da primeira entrega do fornecimento que se prevê anual.
Em abono dessa interpretação mais benéfica, pode-se lembrar que a incidência do princípio da proporcionalidade no âmbito do processo administrativo federal foi objeto de explícita consagração por parte do art. 2º, parágrafo único, inc. VI da Lei nº 9.784, que exigiu “adequação entre meios e fins, vedada a imposição de obrigações, restrições e sanções em medida superior àquelas estritamente necessárias ao atendimento do interesse público”.
VI- Conclusão
A razoabilidade expressa a racionalidade que deve existir entre os meios utilizados para o alcance de fins. A medida de sanção adicional da cláusula 9.1.4 parece-me desnecessária para o fim proposto de ressarcir a Administração e o interesse público.
Do exposto, sob o aspecto jurídico, recomendo:
1) a manutenção da sanção aplicada com fulcro no item 9.1.1, devendo o Pedido de Reconsideração ser conhecido, e, no mérito INDEFERIDO;
2) a aplicação da sanção prevista no item 9.1.3 do ajuste, conhecendo-se a Defesa Prévia e acolhendo-a parcialmente, excluindo-se a aplicação da sanção prevista no item 9.1.4 do ajuste, em atenção aos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade.
É o parecer, que submeto à criteriosa apreciação superior.
São Paulo, 26 de outubro de 2016
Maria Nazaré Lins Barbosa
Procurador Legislativo
OAB. 106.01