Parecer nº 399/07
TID nº 2001595
Assunto: Lei Municipal nº 14.145/2006
Interessado: Comissão de Julgamento de Licitações
Sr. Procurador Supervisor,
Indaga o Sr. Presidente da Comissão de Julgamento de Licitações desta Edilidade acerca da aplicação da Lei nº 14.145 de 2006 no processamento das licitações promovidas no âmbito desta Edilidade.
Referida Lei altera o ar. 16 da Lei nº 13.278/2002 trazendo como inovação, fundamentalmente, a inversão das fases da licitação, para o que couber, nas tradicionais modalidades de convite, tomada de preços e concorrência.
Assim, algumas características da modalidade de licitação “pregão” foram assumidas pela legislação municipal também nas modalidades tradicionais. Questiona-se se tal procedimento deve ser seguido, uma vez que contrasta com o disposto na Lei federal nº 8.666/93.
A Constituição Federal prevê no art. 22, inc. XXVII a competência da União para dispor sobre normas gerais em matéria de licitação e contratos. A competência legislativa sobre o tema não é privativa da União. É inquestionável – assinala Marçal Justen Filho – que a Constituição reservou competência legislativa específica para cada esfera política disciplinar licitação e contratação administrativa . O conteúdo da cláusula constitucional (“normas gerais”) gera disputas.
Por outro lado, a dificuldade inerente ao processo legislativo acaba conduzindo o ente federativo a não editar normas próprias e a incorporar automaticamente a disciplina adotada na órbita federal. Não é o que ocorre, todavia, na questão trazida a exame, uma vez que a Lei municipal estabelece a inversão das fases da licitação também nas modalidades tradicionais.
Com efeito, o art. 22 da Lei nº 8.666/93 estabelece como modalidades de licitação a concorrência, a tomada de preços, o convite, o concurso e o leilão. E, nos termos do § 8º do mesmo artigo, é vedada a criação de outras modalidades de licitação ou a combinação das referidas neste artigo. Esta norma geral deverá ser observada pelas demais entidades da federação.
Significa dizer que o elenco do art. 22 é exaustivo, ressalvada a possibilidade de lei federal específica dispor sobre o tema, tal como se processou com a figura do pregão (que se subordina à Lei nº 10.520).
Nessa linha argumentativa, a inovação da Lei municipal seria passível de interpretação segundo a qual estaria em desacordo com normas gerais estabelecidas na Lei nº 8.666/93, uma vez que inverte as fases da licitação em outras modalidades, que não a de pregão.
Todavia, também é certo que a inversão de fases pretendida não desafia quaisquer dos princípios fundamentais da licitação pública: legalidade – eis que veiculada mediante lei – isonomia, julgamento objetivo, publicidade, razoabilidade. De outro lado, busca conferir maior efetividade ao princípio da economicidade, uma vez que a maior celeridade alcançada não põe em risco outros valores e princípios.
Ora, a lei municipal vigente tem presunção de legitimidade, não cabendo ao agente público descumpri-la sob o argumento de controvérsia acerca de sua conformidade às normas gerais estabelecidas na lei federal, em matéria que se reveste de sutileza e de complexidade.
Não vejo, pois, ilegalidade manifesta a ponto de recomendar o descumprimento da lei municipal vigente, mas tão somente questão discutível e passível de controvérsia. Esta Casa, apreciando o projeto de iniciativa do Executivo, manifestou-se por meio da Comissão de Justiça pela legalidade do mesmo, o que veio a ser referendado em Plenário, com a aprovação da lei em tela.
Em tese, quer-me parecer que orientação no sentido de descumprimento da lei vigente haveria de ser acompanhada de iniciativa tendente à propositura de ação direta de inconstitucionalidade. Não há, todavia, iniciativa no âmbito municipal neste sentido, nem tampouco determinação do Poder Judiciário sustando a validade ou eficácia da lei. Deste modo, parece-me ser o caso de dar normal aplicação à norma vigente.
É a manifestação, que submeto à apreciação superior.
São Paulo, 6 de novembro de 2007
Maria Nazaré Lins Barbosa
Procurador Legislativo