Parecer nº 385/2015
Ref.: TID nº XXXXXXX
Interessado: SGA.2-SGA.23
Assunto: Questionamento acerca da destinação de valores resultantes de restituições – Análise Lei 13.548/2003-Fundo de Despesa da Câmara Municipal de São Paulo.
Sra. Supervisora,
O presente expediente trata de consulta formulada por SGA.23-Contabilidade e Orçamento, objetivando elucidação sobre o entendimento do quanto disposto no inciso XII do artigo 3º da Lei nº 13.548/2003, que instituiu o Fundo Especial de Despesas da Câmara Municipal de São Paulo.
Em síntese, a problemática colocada diz respeito ao destino que deve ser dado aos valores ressarcidos por servidores, relativos a recebimentos de salários ou benefícios em importâncias maiores que as devidas, em exercícios anteriores, em face da dúvida sobre se esses recursos devem ser devolvidos à Prefeitura Municipal ao final do mês em que se deu o ressarcimento, ou se tais importâncias constituem receitas do FECAM-Fundo Especial de Despesas da Câmara Municipal de São Paulo.
Consoante expôs SGA.23, o artigo 3º da Lei nº 13.548/03 prevê, em seu inciso XII, que os recursos provenientes de multas, indenizações e restituições, no âmbito desta Câmara, constituem receitas do Fundo Especial de Despesas desta Câmara.
Especificamente no caso das restituições de valores por parte de servidores, a unidade consulente informa que, quando a devolução de importâncias referir-se ao exercício corrente, o procedimento adotado segue o quanto prescrito pelo artigo 38 da Lei Federal nº 4.320/64, que Estatui Normas Gerais de Direito Financeiro, e que a dúvida sobre a conduta a ser seguida se refere, portanto, exclusivamente à devolução de importâncias que tiveram origem em exercícios anteriores, “embora esses recebimentos não deixem de ser restituição de valores”, conforme ressalva que indica que o setor entende que também nesse caso o procedimento a ser observado deveria ser aquele adotado para as restituições dentro do exercício corrente.
Assim posta a questão, passo a me manifestar.
Primeiramente, considero correto o tratamento que a unidade dá aos valores ressarcidos dentro do mesmo exercício em que pagos indevidamente.
Com efeito, os pagamentos de vencimentos e benefícios aos servidores são feitos com recursos orçamentários e oneram rubricas específicas do orçamento vigente (Pessoal e Encargos Sociais, Auxílio-Alimentação, Auxílio-Transporte, são exemplos). Quando ocorre pagamento a maior e dando-se a restituição devida dentro do próprio exercício, impõe-se a anulação do empenho que havia sido feito, emissão de novo empenho com o abatimento do valor indevidamente pago e restituído, de forma que o recurso volta a compor a respectiva dotação orçamentária. Assim, a título exemplificativo, se o funcionário “A” recebeu a título de Auxílio-alimentação a importância de R$ 620,00 e posteriormente se verifica que fazia jus a apenas R$ 380,00, os R$ 240,00 devolvidos voltam ao orçamento vigente sob a rubrica correspondente, mediante a operação da anulação da despesa efetuada a maior.
Essa sistemática atende ao prescrito pela Lei Federal nº 4.320/64, em seus artigos 35 e 38, que reproduzimos:
“Art. 35. Pertencem ao exercício financeiro:
I – as receitas nêle arrecadadas;
II – as despesas nêle legalmente empenhadas.”
“Art. 38. Reverte à dotação a importância de despesa anulada no exercício, quando a anulação ocorrer após o encerramento dêste considerar-se-á receita do ano em que se efetivar.”
Dessa forma, tais importâncias não perdem sua natureza orçamentária, e em razão disso não podem ser consideradas como recurso do Fundo Especial da Câmara.
De fato, a leitura dos incisos do artigo 3º da Lei nº 13.548/03, modificado pela Lei nº 15.501/11, indica que os recursos que compõem o Fundo da Câmara são aqueles que não têm uma natureza orçamentária. Vale a pena transcrever esse artigo:
“Art. 3º – Constituem receitas do Fundo os recursos provenientes de:
I – extração de cópias reprográficas em geral;
II – rendimento financeiro originado da aplicação do duodécimo;
III – ressarcimento de bens e materiais segurados em decorrência de indenizações de seguradoras;
IV – taxas remuneratórias decorrentes do pagamento de consignações relativas aos descontos efetuados na folha de pagamento dos servidores da Câmara Municipal de São Paulo;
V – receitas oriundas de alienação de bens e materiais que não sejam mais utilizáveis pela Câmara Municipal de São Paulo;
VI – receitas oriundas da remuneração da permissão de uso do espaço da Câmara Municipal de São Paulo por quaisquer entidades, incluindo postos de atendimento bancário;
VII – receitas decorrentes da administração da conta-Câmara;
VIII – receitas provenientes de convênios, acordos ou contratos firmados pela Câmara Municipal de São Paulo;
IX – receitas decorrentes de Atos da Mesa Diretora que impliquem ressarcimento por parte de servidores, incluindo o pagamento de segundas vias de crachás;
X – descontos condicionais e multas contratuais aplicadas no âmbito administrativo da Câmara Municipal de São Paulo;
XI – valores cobrados para inscrição em concursos públicos de ingresso no quadro da Secretaria da Câmara Municipal de São Paulo;
XII – multas, indenizações e restituições, no âmbito da Câmara Municipal de São Paulo;
XIII – garantias retidas dos contratos administrativos da Câmara Municipal de São Paulo;
XIV – doações, legados e contribuições de pessoas físicas ou jurídicas de direito privado, de órgãos ou entidades federais, estaduais ou de outros Municípios, bem como de entidades internacionais;
XV – receitas advindas do funcionamento da Escola do Parlamento;
XVI – quaisquer outras receitas que legalmente lhe possam ser incorporadas.
Parágrafo único – O saldo financeiro, apurado em balanço anual, será transferido para o exercício seguinte.”
A classificação das receitas em orçamentárias e não orçamentárias é própria do Direito Financeiro, e a distinção deriva de sua previsão ou não na lei orçamentária e na necessidade ou não de devolução dos recursos.
Assim, são orçamentárias as receitas que estiverem previstas no orçamento de modo que serão consideradas quando da fixação das despesas públicas, e de outro lado são extra-orçamentárias as receitas que não fazem parte do orçamento de modo que não serão consideradas quando da fixação das despesas públicas.
O glossário de termos financeiros constante da página do Ministério da Fazenda na rede mundial de computadores adota essa classificação, in verbis:
“Receita Extra-Orçamentária – Valores provenientes de toda e qualquer arrecadação que não figure no orçamento e, conseqüentemente, toda arrecadação que não constitui renda do Estado. O seu caráter é de extemporaneidade ou de transitoriedade nos orçamentos.
Receita Orçamentária – Valores constantes do orçamento, caracterizada conforme o art. 11 da Lei nº 4.320/64.”
Observe-se que os recursos elencados nos incisos reproduzidos acima não têm, em sua grande maioria, natureza orçamentária, no sentido das definições acima. É verdade que a Lei 4.320/64 ao adotar a classificação econômica, adota o termo receita pública em sua acepção mais ampla, ou seja, abarcando todo e qualquer ingresso ou entrada nos cofres públicos. Assim sendo, considera como receitas públicas verbas provenientes de venda de bens ou obtenção de empréstimos, que seriam meros movimentos de caixa sob a ótica de uma classificação jurídico-financeira.
Entretanto, inegável, mesmo à luz da Lei 4.320/64, que as entradas constantes dos incisos do artigo 3º da lei do Fundo da Câmara são receitas não previstas no orçamento da Edilidade no exercício, à exceção de uma ou outra previsão que exigiria interpretação no caso concreto, tal como no caso do presente expediente.
Dessa forma, volto a frisar que, no que diz respeito ao ressarcimento de importâncias recebidas a maior por servidores dentro do mesmo exercício em que pagas, absolutamente correta a rotina adotada por SGA.23, consistente na reversão dos valores à verba orçamentária própria, pois nesse caso a verba tem natureza de receita orçamentária.
Por outro lado, penso que a solução é diferente no caso do ressarcimento se dar em exercício posterior ao do pagamento indevido.
Nessa hipótese, impossível fazer regressar os recursos oriundos das restituições de pagamentos feitos indevidamente em exercícios anteriores à rubrica orçamentária correspondente, em razão do singelo fato de que o orçamento relativo ao exercício em que aqueles se realizaram já não mais existe, decorrência do princípio da anualidade orçamentária.
Em assim sendo, a natureza dessa entrada passa a ser de receita extra-orçamentária e como tal pode constituir recurso do Fundo de Despesas da Câmara.
Aliás, entendimento diverso ao deste acarretaria forçosamente a leitura de que a Lei 13.548/03 contém dispositivo ilegal ou sem aplicação, caracterizando uma interpretação teratológica.
Dessa forma, em conclusão, entendo que a interpretação a ser dada à hipótese prevista no inciso XII, relativamente ao vocábulo “restituições”, deve ser a de que:
1. No caso da restituição ocorrer no mesmo exercício em que se deu o pagamento indevido: deve ser mantida a conduta já adotada por SGA.23, aplicando-se o artigo 38 da Lei Federal 4.320/64, revertendo-se à dotação orçamentária correspondente a importância restituída;
2. No caso da restituição ocorrer em exercício posterior ao do que se deu o pagamento indevido: a importância restituída deve ser incorporada ao Fundo Especial de Despesas da Câmara, consoante prescreve o inciso XII do artigo 3º da Lei 13.548/03;
3. O mesmo entendimento e a mesma solução deve ser aplicada à hipótese prevista no inciso IX, parte inicial, do mesmo artigo 3º da Lei 13.548/03 (receitas decorrentes de Atos da Mesa Diretora que impliquem ressarcimento por parte de servidores).
Essa a minha manifestação que submeto à superior consideração de Vossa Senhoria.
São Paulo, 26 de outubro de 2015.
LUIZ EDUARDO DE SIQUEIRA S.THIAGO
Procurador Legislativo – OAB/SP 109.429
Questionamento acerca da destinação de valores resultantes de restituições – Análise Lei 13.548/2003-Fundo de Despesa da Câmara Municipal de São Paulo.