Parecer n° 382/2013

Parecer nº 382/2013
TID XXXXXXXXXX
Interessada: SGA-7
Assunto: Exigência de realização de serviço externo por servidores celetistas e estatutários – Possibilidade – arts. da Lei nº 8.989/1979 e da Consolidação das Leis do Trabalho.

Senhor Procurador Legislativo Supervisor,

Trata-se de solicitação de elaboração de parecer normativo que esclareça a sujeição dos servidores celetistas e estatutários à realização de serviço externo de competência da SGA-7, com ou sem veículo, em virtude de recusa de servidores em exercício naquela unidade administrativa de fazê-lo.

De plano cumpre esclarecer que esta Procuradoria não exara parecer de caráter normativo, mas tão somente sugere à autoridade competente que a medida ou solução apontada seja adotada de forma abrangente e uniforme para situações análogas, evitando-se decisões repetitivas.

Inicialmente verifica-se do § 7º do art. 8º do Ato 981/2007, com a redação conferida pelo Ato nº 1.078/2009, que a Equipe de Expedição e Distribuição de Correspondências – SGA-7 possui como competência “tramitar os ofícios ao Executivo e outras autoridades e repartições públicas, utilizando-se, inclusive, de estafetas e sistemas eletrônicos de tramitação de documentos”, sendo a atividade externa dessa forma ínsita a unidade administrativa em foco. Note-se que o próprio dispositivo sugere algumas das formas possíveis de desempenho dessa competência, além da utilização do próprio pessoal designado para exercício no setor (estafeta e sistemas eletrônicos).

Feitos estes esclarecimentos, passo a responder diretamente as questões apresentadas:

1. A atribuição – serviço externo – com uso ou não de veículo, no caso de funcionário contratado pela CLT, deveria estar explicitamente estabelecida no seu contrato de trabalho?

A Consolidação das Leis do Trabalho – CLT trata das cláusulas do contrato de trabalho nos seguintes termos:

“Art. 442 – Contrato individual de trabalho é o acordo tácito ou expresso, correspondente à relação de emprego.
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Art. 443 – O contrato individual de trabalho poderá ser acordado tácita ou expressamente, verbalmente ou por escrito e por prazo determinado ou indeterminado.
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Art. 444 – As relações contratuais de trabalho podem ser objeto de livre estipulação das partes interessadas em tudo quanto não contravenha às disposições de proteção ao trabalho, aos contratos coletivos que lhes sejam aplicáveis e às decisões das autoridades competentes.
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Art. 447 – Na falta de acordo ou prova sobre condição essencial ao contrato verbal, esta se presume existente, como se a tivessem estatuído os interessados na conformidade dos preceitos jurídicos adequados à sua legitimidade.
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Art. 456. A prova do contrato individual do trabalho será feita pelas anotações constantes da carteira profissional ou por instrumento escrito e suprida por todos os meios permitidos em direito.
Parágrafo único. A falta de prova ou inexistindo cláusula expressa a tal respeito, entender-se-á que o empregado se obrigou a todo e qualquer serviço compatível com a sua condição pessoal.”

Como se verifica, o contrato de trabalho não tem forma rígida e inexistindo cláusula contratual expressa, no caso concreto, sobre a realização de serviço externo, e desde que esta atividade não contravenha às disposições de proteção ao trabalho, aos contratos coletivos que lhes sejam aplicáveis e às decisões das autoridades competentes, presume-se que o empregado se obrigou ao serviço.

2. Designá-los para serviço externo propicia maior vulnerabilidade a riscos de acidentes por parte de tais funcionários, ou seja, a mais, do que o risco assumido ao “vir e ir” do trabalho?

É dever do empregador zelar pela redução ou controle dos riscos de acidentes ou doenças a que se encontrem expostos os empregados, conforme se depreende do art. 19 da Lei Federal nº 8.213/1991:

“Art. 19. Acidente do trabalho é o que ocorre pelo exercício do trabalho a serviço da empresa ou pelo exercício do trabalho dos segurados referidos no inciso VII do art. 11 desta Lei, provocando lesão corporal ou perturbação funcional que cause a morte ou a perda ou redução, permanente ou temporária, da capacidade para o trabalho.
§ 1º A empresa é responsável pela adoção e uso das medidas coletivas e individuais de proteção e segurança da saúde do trabalhador.
§ 2º Constitui contravenção penal, punível com multa, deixar a empresa de cumprir as normas de segurança e higiene do trabalho.
§ 3º É dever da empresa prestar informações pormenorizadas sobre os riscos da operação a executar e do produto a manipular.
§ 4º O Ministério do Trabalho e da Previdência Social fiscalizará e os sindicatos e entidades representativas de classe acompanharão o fiel cumprimento do disposto nos parágrafos anteriores, conforme dispuser o Regulamento”.

Entretanto, o risco de acidente de trabalho faz parte de qualquer atividade, quer pela falta de mecanismos específicos de prevenção, quer pela imprevisibilidade, e é aceito pela sociedade e socializado seu custeio através da seguridade social. Porém, para algumas pessoas, o ato de subir escadas pode significar um risco maior do que se locomover de automóvel, para outras, adotar comportamento sedentário, pode significar um risco maior do que caminhar pelas ruas. A probabilidade de acidentes em geral é avaliada de forma estatística, segundo as condições de ocorrência dos sinistros. No caso concreto, não há dados disponíveis para se avaliar se os riscos de acidente no trajeto casa-trabalho de cada servidor em exercício na SGA-7 são maiores do que os trajetos, com ou sem veículo, para entrega de correspondência e documentos da Câmara Municipal.

A necessidade de minimizar e a compreensão da impossibilidade do completo afastamento do risco é a razão da legislação trabalhista adotar mecanismos de prevenção (quando possível) e amparo social ao trabalhador.

Desse modo, a alegação da potencialidade de um risco sobre o qual não existem mecanismos de prevenção exigíveis do empregador (como prevenir que um terceiro colida com nosso veículo? Como prevenir ser acertado por uma bala de arma-de-fogo perdida?) não pode servir de excusa para que o empregado deixe de realizar suas atividades.

3. No caso dos funcionários efetivos (auxiliar operacional e técnico administrativo), o serviço externo, com uso ou não de veículo, deveria estar explícito na “descrição e requisitos de provimento dos cargos de nomeação em caráter efetivo do Quadro de Pessoal do Legislativo – QPL (atualizado pelo Ato nº 1.059-09)” (anexo-2) ou mesmo constar do edital?

A regulação da relação entre a Administração Pública e os funcionários públicos se dá através de disposições legais. No caso do Técnico Administrativo e do Auxiliar Operacional, o art. 20, §§ 2º e 3º, da Lei nº 13.637/2003, e suas alterações, dispõe:

“Art. 20. As carreiras que integram o Quadro de Pessoal do Legislativo são compostas pelos cargos estruturados em níveis, conforme Anexo I, desta lei.
………………………………………………………………………………………………………………………………….
§ 2º Os titulares dos cargos das carreiras de Consultor Técnico Legislativo desempenharão suas atividades nas áreas de assessoria e consultoria; de Procurador Legislativo, desempenharão suas atividades na área judicial e de assessoria e consultoria jurídica; de Técnico Administrativo, desempenharão suas atividades na área de suporte administrativo; e de Auxiliar Operacional, desempenharão suas atividades na área de suporte operacional, na forma prevista no Anexo VIII.
§ 3º Os editais de concursos realizados para o provimento dos cargos integrantes das carreiras do Quadro de Pessoal do Legislativo indicarão, após levantamento das necessidades junto aos serviços de suporte técnico e apoio administrativo: a habilitação específica prevista em lei; a respectiva área de atuação, respeitada a compatibilidade com as atividades da Câmara Municipal; a quantidade de cargos por área de atuação; e o percentual reservado para os portadores de deficiência.”

Verifica-se, portanto, que tanto o Técnico Administrativo quanto o Auxiliar Operacional desempenharão atividades em compatibilidade com as atividades da Câmara Municipal. Se entre as atividades da Câmara Municipal, conforme estabelecido no § 7º do art. 8º do Ato 981/2007, está a realização de atividades externas de entrega de correspondência e documentos, perfeitamente compatíveis com o suporte administrativo e operacional exigido desses funcionários, estes estão sujeitos à sua realização.

4. No caso do funcionário não querer executar o serviço externo por sentir-se por demais exposto aos riscos da função, pode ele recusar-se a executá-la? E mais, se designado à revelia pode ele, ainda, frente a algum tipo de acidente, demandar processo administrativo contra o Supervisor de SGA-7 e/ou Sr. Secretário de SGA, ou caberia apenas uma demanda judicial contra a CMSP?

5. A Câmara, Secretário e Supervisor, cientes do fato, também ficam mais vulneráveis, ou seja, expostos ao risco de ter que vir a arcar com o ônus de uma demanda judicial e/ou processo administrativo, principalmente frente à ocorrência de acidente grave ou fatal?

As questões nºs 4 e 5 são conexas e passam a ser respondidas em conjunto.

O empregador pode designar tarefas aos empregados, não sendo necessária a aquiescência destes. Nesse sentido, esclarece a doutrina:

“O trabalho subordinado é da essência da relação empregatícia. A subordinação é um dos elementos legais quanto ao conceito de empregado. O poder diretivo é um dos elementos do conceito de empregador (art. 2º, CLT).
(…)
O poder diretivo representa a faculdade legal que é concedida ao empregador, de comandar a prestação pessoal dos serviços, organizando-a, controlando-a e punindo o trabalhador, se for necessário.”
(Direito do Trabalho, 4ª Ed., Tomo I, Francisco Ferreira Jorge Neto e Jouberto de Quadros Pessoa Cavalcante, Lumen Juris Editora, Rio de Janeiro, 2008, p. 317)

Nos casos de acidente de trabalho, o amparo é feito pela Previdência Social, restando ao empregador eventual responsabilidade civil por dolo ou culpa, conforme esclarece a doutrina pátria:

“Como a responsabilidade do empregador é subjetiva, são necessários os seguintes requisitos: a) o ato ou omissão ofensiva a direito de outrem; b) o dano produzido por esse ato ou omissão; c) a relação de causalidade entre o ato ou omissão e o dano; d) a culpa.
Constata-se a responsabilidade civil do empregador pelo acidente de trabalho e as situações a ele equiparadas, quando não se cumprem as normas de segurança e medicina do trabalho.”
(Direito do Trabalho, 4ª Ed., Tomo I, Francisco Ferreira Jorge Neto e Jouberto de Quadros Pessoa Cavalcante, Lumen Juris Editora, Rio de Janeiro, 2008, p. 857/858)

Dessa forma, desde que o empregador tenha adotado as medidas cabíveis e exigidas pela legislação para a minimização do risco de acidentes e doenças, o empregado/servidor não pode se recusar a executar uma tarefa sob a alegação de exposição ou agravamento de risco.

A insubordinação sujeita o funcionário às penalidades disciplinares estatutárias (art. 178, II; 189, IV, e 184 e seguintes da Lei nº 8.989/1979) e o empregado à caracterização de justa causa para rescisão do contrato de trabalho pelo empregador (art. 462, alínea “h”, da CLT).

Eventual demanda judicial para obtenção de indenização civil por acidente de trabalho é proposta em face do empregador, ainda que para ela tenham concorrido outros empregados, é o que se depreende do art. 21 da Lei nº 8.213/1991, que equipara ao acidente do trabalho:

“I – o acidente ligado ao trabalho que, embora não tenha sido a causa única, haja contribuído diretamente para a morte do segurado, para redução ou perda da sua capacidade para o trabalho, ou produzido lesão que exija atenção médica para a sua recuperação;
II – o acidente sofrido pelo segurado no local e no horário do trabalho, em consequência de:
a) ato de agressão, sabotagem ou terrorismo praticado por terceiro ou companheiro de trabalho;
b) ofensa física intencional, inclusive de terceiro, por motivo de disputa relacionada ao trabalho;
c) ato de imprudência, de negligência ou de imperícia de terceiro ou de companheiro de trabalho;
d) ato de pessoa privada do uso da razão;
e) desabamento, inundação, incêndio e outros casos fortuitos ou decorrentes de força maior;
III – a doença proveniente de contaminação acidental do empregado no exercício de sua atividade;
IV – o acidente sofrido pelo segurado ainda que fora do local e horário de trabalho:
a) na execução de ordem ou na realização de serviço sob a autoridade da empresa;
b) na prestação espontânea de qualquer serviço à empresa para lhe evitar prejuízo ou proporcionar proveito;
c) em viagem a serviço da empresa, inclusive para estudo quando financiada por esta dentro de seus planos para melhor capacitação da mão-de-obra, independentemente do meio de locomoção utilizado, inclusive veículo de propriedade do segurado;
d) no percurso da residência para o local de trabalho ou deste para aquela, qualquer que seja o meio de locomoção, inclusive veículo de propriedade do segurado.”

Ressalte-se, apenas, que somente a participação dolosa ou culposa de outros empregados/funcionários no acidente pode sujeitá-los a ação regressiva pelo empregador para ressarcimento de eventual indenização civil paga por este ao acidentado.

Finalmente, a título de colaboração, apresento sugestão, a ser avaliada pelas autoridades competentes, de contratação de empresa para a realização de entrega de documentos e correspondência da Câmara Municipal, o que reduziria, por um lado, a ausência de servidores necessários ao desenvolvimento das atividades internas da SGA-7, podendo mesmo ter seu número reduzido em benefício de outros setores, por outro lado, permitiria maior agilidade e rapidez na entrega de correspondência e documentos, vez que um número maior destes poderia ser enviado ao mesmo tempo, sem desfalque do setor, além da economia de recursos, posto que, em média, a hora-trabalho dos servidores da Câmara Municipal resulta em gasto maior do que a terceirização dessa atividade.

Sobre atribuição de eventual caráter normativo, não vislumbro sua necessidade posto que não há deliberação a ser adotada em relação à consulta, cujo objetivo restringiu-se apenas ao esclarecimento de algumas dúvidas sobre a relação empregador/empregado no âmbito da Câmara Municipal.

É o meu parecer, que submeto ao acurado crivo de Vossa Senhoria.

São Paulo, 04 de dezembro de 2013.

Adela Duarte Alvarez
Procurador Legislativo
OAB/SP n° 118.854