Parecer n° 329/2013
Memo. DCE nº 37/13
TID nº XXXXXXXXXX
Interessado: Diretoria de Comunicação Externa
Assunto: Possibilidade de rádio comunitária transmitir publicidade institucional
Sr. Procurador Legislativo Supervisor,
A Diretoria de Comunicação Externa questiona esta Procuradoria sobre a possibilidade jurídica de rádios comunitárias veicularem publicidade institucional e informações legais ou de interesse público e receberem recursos públicos a título de auxílio cultural, como formar de contraprestação pelo serviço prestado.
A norma de regência das rádios comunitárias é a Lei nº 9.612, de 19 de fevereiro de 1998, nos termos da qual o serviço de radiodifusão comunitária deverá ser explorado por fundações ou associações comunitárias, sem fins lucrativos, sediadas na área da comunidade, entidades estas que poderão receber patrocínio, sob a forma de apoio cultural para a transmissão de programas. Neste sentido são os artigos 7º e 18 do referido diploma legal.
“Art. 7º São competentes para explorar o Serviço de Radiodifusão Comunitária as fundações e associações comunitárias, sem fins lucrativos, desde que legalmente instituídas e devidamente registradas, sediadas na área da comunidade para a qual pretendem prestar o Serviço, e cujos dirigentes sejam brasileiros natos ou naturalizados há mais de 10 anos.”
“Art. 18. As prestadoras do Serviço de Radiodifusão Comunitária poderão admitir patrocínio, sob a forma de apoio cultural, para os programas a serem transmitidos, desde que restritos aos estabelecimentos situados na área da comunidade atendida.”
O Serviço de Radiodifusão Comunitária deve dar “preferência a finalidades educativas, artísticas, culturais e informativas em benefício do desenvolvimento geral da comunidade” (art. 4º, inc. I, da Lei 9.612/98), a que se vincula.
Pelo que se depreende da consulta formulada pela Diretoria de Comunicação Externa, este Legislativo pretende veicular mensagem informativa e publicidade institucional e oferecer incentivo cultural como forma de custear estas peças publicitárias.
A comunicação institucional do Poder Público é um gênero de publicidade que comporta várias espécies.
Com efeito, nós temos a comunicação institucional decorrente da lei que é aquela que a Administração Pública utiliza para dar efetividade a seus atos e usualmente a Administração vale-se do diário oficial ou outro órgão de imprensa na ausência daquele, um exemplo prático seria o ato de nomeação de um servidor público. Há ainda a comunicação institucional convocatória que se dá quando a Administração convoca o particular para praticar determinado ato ou o comunica de um ato já praticado, exemplos práticos seriam o edital de convocação de licitação ou concurso e a intimação para a prática de atos em processos administrativos ou judiciais.
Temos também a comunicação institucional de utilidade pública que ocorre quando a Administração busca transmitir ao cidadão alguma mensagem de relevante interesse social, como por exemplo, peças publicitárias convocando a população para campanhas de vacinação, informações sobre formas de profilaxia de doenças, entre outras.
E finalmente nós temos a comunicação institucional de realizações do Poder Público que se caracteriza por ser uma forma de publicidade de obras e realizações do governo, tem também por objetivo a prestação de contas do planejamento e das ações empreendidas pelo Poder Público.
Feitas esta introdução inicial que no meu entender será de grande utilidade na resolução da questão suscitada, passo a seguir à análise do tema em face da jurisprudência dos Tribunais de Contas.
O tema em apreço é polêmico no âmbito dos tribunais de contas do país. De fato, pode-se encontrar acórdãos admitindo o uso de recursos públicos para conceder incentivo cultural às rádios comunitárias como forma de apoio por veiculação de comunicação institucional e acórdãos negando tal possibilidade.
Dentre os argumentos levantados por aqueles que não admitem que as rádios comunitárias possam veicular comunicação institucional esta a consideração de que as rádios comunitárias são concedidas a entidades sem fins lucrativos, de forma que não poderiam receber contraprestação para veicular propaganda institucional, ademais aduzem que o contrato administrativo se rege por normas específicas que coloca a Administração em posição de superioridade em relação ao contratado e, o art. 11 da Lei nº 9.612/98 proíbe vínculos de subordinação entre a rádio comunitária e outra entidade.
Argumenta-se ainda que, a publicidade permitida pela Lei nº 9.612/98 limita-se à divulgação de nomes e outros dados do patrocinador, e que isto não guarda correspondência com a comunicação institucional pretendida pelo Poder Público.
Neste diapasão pode-se anotar os acórdãos proferidos pelo Tribunal de Contas do Estado de Pernambuco (Proc. nº 1105529-7); Tribunal de Contas do Estado de São Paulo (TC 001678/001/08, TC 001372/026/06, TC 002473/426/11, TC 00246/026/11, TC 001139/026/09 TC 003350/026/07 e TC 003537/026/07), Tribunal de Contas do Estado do Rio Grande do Sul (Processos nºs 0836-02.00/09-0, 6872-02.00/08-2, 0849-02.00/09-0, 006499-02.00/08-2 e 1497-02.00/09-9) Tribunal de Contas do Estado de Minas Gerais (Consulta nº 651757) e Tribunal de Contas do Estado de Rondônia (Consulta nº 2037/2009).
Por outro lado, é possível encontrar julgados de tribunais de contas com posicionamento favorável à possibilidade de veiculação de publicidade institucional com a cobertura dos custos relativos à transmissão radiofônica pelo apoio cultural permitido pela Lei nº 9.612/98.
Argumentam aqueles que se posicionam em tal sentido que não há vedação legal a pagamento que se constitui a título de custos ínsitos à transmissão radiofônica, que não há impedimento das rádios comunitárias celebrarem contratos onerosos com o Poder Público (devidamente precedido de procedimento licitatório) para a divulgação de publicidade institucional, desde que o valor arrecadado com o contrato seja aplicado exclusivamente no custeio, manutenção ou reinvestimento da rádio comunitária.
Alguns julgados condicionam a concessão de apoio cultural à realização de convênio administrativo, outros admitem a contratação pura e simples desde que precedida de licitação ou credenciamento de todas as rádios comunitárias interessadas na contratação com o Poder Público.
No sentido permissivo pode-se anotar julgados do Tribunal de Contas do Estado de Minas Gerais (Consultas nºs 811842, 805.981), Tribunal de Contas do Estado de Santa Catarina (Prejulgados nºs 1788/2006, 1537/2004, 1399/2003), Tribunal de Contas do Estado do Paraná (Consulta nº 1269/2008) e Tribunal de Contas do Estado do Mato Grosso (Consultas nºs 7944-8/2007 e 6714-8/2010).
No que concerne ao conteúdo que pode ser veiculado por intermédio dos Serviços de Radiodifusão Comunitária a prerrogativa para legislar sobre a matéria é privativa da União, nos termos das disposições constantes do inc. IV do art. 22 da Constituição Federal. Determina o referido preceptivo constitucional, que:
“Art. 22. Compete privativamente à União legislar sobre:
(…)
IV – águas, energia, informática, telecomunicações e radiodifusão;”
No exercício de tal prerrogativa constitucional a União editou a Lei Federal nº 9.612/98, que dispõe sobre os Serviços de Rádio Difusão Comunitária. Tal lei não veda em suas disposições que as rádios comunitárias transmitam propagandas institucionais, pelo contrário, uma vez que se pode pressupor tal permissão quando no inciso III de seu art. 3º é arrolada como uma das finalidades das rádios comunitárias prestar serviços de utilidade pública.
Consoante foi explicitado na introdução do presente parecer há comunicações institucionais com a nítida feição de serviço de utilidade pública.
Contudo, parece-me que mesmo as comunicações institucionais que não se enquadram em tal perfil não encontram óbice legal à sua veiculação nas rádios comunitárias.
Resta, portanto, a questão concernente à concessão de apoio cultural, como forma de contraprestação pela veiculação de comunicações de caráter institucional do Poder Público.
Em seu art. 18 a Lei 9.612/98 admite que as rádios comunitárias possam receber patrocínio sob a forma de apoio cultural, porém, não explicita o que vem a ser “apoio cultural”.
É a Portaria nº 462, de 14 de outubro de 2011, que no seu item 3.1 define o que vem a ser apoio cultural. Reza o referido dispositivo normativo, que:
“3.1. Apoio cultural – É a forma de patrocínio limitada à divulgação de mensagens institucionais para pagamento dos custos relativos à transmissão da programação ou de programas específicos, em que não podem ser propagados bens, produtos, preços, condições, de pagamento, ofertas, vantagens, e serviços que, por si só, promovam a pessoa jurídica patrocinadora, sendo permitida a veiculação do nome, endereços físico e eletrônico e telefone do patrocinador situado na área de execução do serviço.”
Da leitura do referido preceptivo normativo pode-se depreender que as comunicações institucionais do Poder Público, como contraprestação ao apoio cultural às rádios comunitárias, são permitidas, uma vez que – como o explicitado na nas linhas precedentes –, as comunicações institucionais do Poder Público não objetivam propagar bens, produtos, condições de pagamento, ofertas, vantagens ou serviços com o fim de promover a pessoa jurídica patrocinadora, pelo contrário, visam comunicar a terceiros atos ou fatos por decorrência da lei (que assim o exige para que o ato ou fato ganhem eficácia), convocar terceiro para a prática de atos, divulgar serviços de utilidade pública ou prestar contas de atos praticados pelo Poder Público na gestão do Estado.
Por tal razão, entendo que as comunicações institucionais deste Legislativo podem ser divulgadas nos serviços de radiodifusão comunitária e concedida contraprestação na forma de apoio cultural, desde que os valores daí auferidos sejam aplicados exclusivamente no custeio, manutenção ou reinvestimento da rádio comunitária.
As rádios comunitárias são instituições sem fins lucrativos, mas isso não significa que não possam firmar contratos onerosos, o que não se permite é que gerem receitas para as pessoas jurídicas (fundações ou associações) detentoras da concessão do serviço público de radiodifusão.
É importante ressaltar que não vislumbro a possibilidade do contrato de veiculação de comunicações institucionais entre o Poder Público e as rádios comunitárias criarem uma relação de subordinação entre o Poder Público e as referidas entidades de radiodifusão, o que ocorre é que o contrato administrativo possui algumas cláusulas exorbitantes que procuram resguardar o interesse público quando em confronto com o particular, mas isto passa longe da criação de relação de subordinação.
Em face do exposto, não vislumbro óbices jurídicos à contratação de rádios comunitárias para veicular comunicação institucional deste Legislativo, com a concessão de contraprestação na forma de apoio cultural, como o permitido pela Lei nº 9.612/98. Ressaltando que há necessidade de realização de licitação para a contratação.
Contudo, em face da questão em apreço ser controvertida – existindo posições favoráveis e contra no âmbito dos Tribunais de Contas Estaduais –, e considerando-se ainda que o Tribunal de Contas do Município de São Paulo ainda não se pronunciou sobre a questão, sugiro que seja feita uma consulta à Corte de Contas Municipal, nos termos do art. 29 da Lei Orgânica daquele Tribunal (Lei nº 9.167, 03 de dezembro de 1980).
É o meu parecer, que submeto à elevada apreciação de V.Sa.
São Paulo, 30 de outubro de 2013.
ANTONIO RUSSO FILHO
Procurador Legislativo
OAB/SP n° 125.858