Parecer n° 256/2013

Parecer nº 256/13
Processo nº 994/12
TID XXXXXXXXXXXXX

Sr. Procurador Supervisor,

A Comissão de Julgamento de Licitações solicita análise e manifestação desta Procuradoria quanto ao eventual cabimento de inexigibilidade de licitação visando à contratação de serviço de capacitação de servidores da Equipe de Saúde desta Edilidade.
O procedimento iniciou-se com a requisição da Secretaria de Assistência à Saúde – SGA.8 solicitando contratação de organização especializada na capacitação de equipes de Saúde, conforme justificativa e termo de referência de fls. 1/5. A Equipe de Pesquisa de Mercado e Fornecedores elaborou pesquisa procurando observar as recomendações da área técnica (fls. 81), tendo os autos sido encaminhados para a E. Mesa, que autorizou a licitação na modalidade de PREGÃO visando à contratação em tela (fls. 85).
Na fase de elaboração do edital, a Comissão de Pregão procurou ater-se o mais possível às recomendações da área técnica. Nesse passo, suscitou-se dúvida quanto enquadramento da requisição em pauta ao gênero de “serviços de natureza comum”, típicos da licitação na modalidade de Pregão. Observou-se também a discrepância dos preços obtidos na pesquisa prévia (fls 115/116).
A unidade requisitante ponderou então que os serviços solicitados são efetivamente “de natureza especialíssima”, o que foi endossado pela Supervisão da Equipe de Seleção, Desenvolvimento e Avaliação de Pessoal – SGA.14. Deste modo, a Comissão de Licitações encaminhou os autos à Procuradoria para manifestação quanto ao procedimento mais adequado para a contratação cogitada.
Em especial, indaga-se se o art. 25, inc. II da Lei nº 8.666/93 combinado com o art. 13, inc. VI da mesma lei estaria mais adequado para alcançar-se o objeto pretendido do que a licitação na modalidade de pregão.
O treinamento que se pretende realizar na Casa, tendo em vista as informações trazidas aos autos, parece configurar-se como serviço técnico especializado que poderia ser prestado com fundamento no art. 25, inc. II da Lei nº 8.666/93.
Nos termos do art. 25, inc. II da Lei nº 8.666/93 é inexigível a licitação quando houver inviabilidade de competição, em especial para a contratação de serviços técnicos enumerados no art. 13 da Lei, de natureza singular, com profissionais ou empresas de notória especialização.
O art. 13 da Lei inclui entre os serviços técnicos especializados os relativos a treinamento e aperfeiçoamento de pessoal (inc. VI).
A fórmula “natureza singular” adotada pela lei destina-se a evitar a generalização da contratação direta para todos os casos enquadráveis no art. 13. Na lição de Marçal Justen Filho, a natureza singular requer a conjugação de dois elementos: o caráter excepcional da necessidade a ser satisfeita e a ausência de viabilidade de sua satisfação por um profissional especializado “padrão” .
Ou seja: trata-se de situação em que o serviço a ser executado requer que a Administração escolha pessoas com alta qualificação para prestá-lo.
A inviabilidade de competição pode ser afirmada em virtude do caráter singular de que se reveste a prestação. Cursos e treinamentos para aperfeiçoamento de pessoal, conforme o caso, podem se revestir de natureza singular, sendo difícil comparar objetivamente as peculiaridades de cada um dos prestadores. O método, o estilo, alicerçado em conhecimentos técnicos e científicos de cada entidade altamente qualificada dificultam ou mesmo impossibilitam o cotejo objetivo com o serviço prestado por outra pessoa jurídica também especializada. Quer dizer que, atendido um alto padrão, a Administração goza de margem de discricionariedade para escolha da entidade a ser contratada.
Como explica Marçal Justen Filho: “Pode configurar-se inviabilidade de competição, para os fins do art. 25 da Lei nº 8.666/93, mesmo quando existirem no mercado inúmeros particulares em condições equivalentes de desempenhar a prestação necessária à satisfação do interesse sob tutela estatal. (…) A inviabilidade de competição também se verificará nos casos em que houver impossibilidade de seleção entre diversas alternativas segundo um critério objetivo” .
Nessa linha, acórdão do Tribunal de Contas da União sustenta que, a não ser diante de interpretação abusiva do art. 25 da lei de licitações, deve-se respeitar a opção adotada pelo administrador no momento de aplicá-lo. Não se pode afirmar haver uma única empresa com notória especialização em determinado setor de atividade. Em voto do Ministro Carlos Atila assim se lê: “Note-se que o adjetivo singular não significa necessariamente único. Se singular significasse único, seria o mesmo que exclusivo, e portanto o dispositivo seria inútil, pois estaria redundando o inc. I imediatamente anterior” .
Aplicando o permissivo legal ao caso em exame, a contratação de organização especializada na Capacitação de Equipes de Saúde tem, de acordo com a manifestação da unidade requisitante, natureza especialíssima, que requer criteriosa escolha. A manifestação da área técnica de fls. 118 propõe que o programa conte com profissionais altamente qualificados, sob pena de frustrar-se a própria justificativa do mesmo. E indica inclusive uma entidade que considera idônea para a realização do treinamento, tendo em vista o curriculum dos professores e a programação oferecida.
Tendo em vista o quanto relatado, a Administração poderia escolher a entidade a ser contratada para prestação de serviço singular de treinamento com entidade notoriamente especializada para tanto. Nesse caso, caberia observar o disposto nos arts. 14 e 15 do Decreto Municipal nº 44.279/03, que regulamenta a Lei nº 13.278/02 no município de São Paulo, in verbis:
Art. 14. “No caso de contratação de serviços com pessoas físicas ou jurídicas de notória especialização, a autoridade competente para autorizar a contratação direta por inexigibilidade de licitação constituirá comissão especial com número ímpar, integrada por pelo menos dois servidores efetivos da área técnica específica relacionada com o objeto do contrato.
Art. 15. A comissão, de que trata o artigo anterior, deverá emitir parecer conclusivo sobre a singularidade do objeto do contrato e a notória especialização do futuro contratado”.
Todavia, também na hipótese de licitação inexigível, é necessária, a teor do art. 26 da Lei nº 8.666/93 a justificativa quanto ao preço em relação ao contrato de que se trate. No caso em exame, consigna-se a dificuldade de comparação de orçamentos (fls. 75).
Note-se que a justificativa quanto ao preço não é exatamente o mesmo que a realização de pesquisa de mercado. A pesquisa de mercado é uma das possíveis formas de justificar o preço, mas não é a única, e nem sempre é cabível ou viável.
De fato, não é raro que profissionais ou empresas de qualificação superior não coloquem seus serviços no mercado, e não se disponham a participar de um certame aberto. Estão, na prática, em uma situação privilegiada, assumindo a posição de aguardar a procura pela contratação ao invés de participar em um processo seletivo de disputa por um contrato. Existe, portanto, a dificuldade concreta de encontrar uma justificativa quanto ao preço para a contratação de profissionais notoriamente especializados. Não necessariamente a escolha há de recair sobre a oferta de menor preço; mas haveria elementos para a eleição de preço compatível com o mercado; e análise da relação custo/benefício.
Cumpre observar, finalmente, que não raro entidades qualificadas para prestar os serviços cogitados enquadram-se naqueles requisitos expressos no art. 24, inc. XIII da Lei nº 8.666/93, que alude à dispensa de licitação para contratação de instituição brasileira sem fins lucrativos incumbida regimental ou estatutariamente da pesquisa, ensino ou desenvolvimento institucional, desde que detenha inquestionável reputação ético-profissional.
Trata-se de enquadramento que também implica contratação direta, porém admitindo implicitamente a viabilidade de competição. Também se exige a justificativa quanto ao preço. Admitindo tratar-se de questão que se reveste de alguma sutileza, quer-me parecer que o objeto em exame – cursos e treinamentos com características de singularidade, como anteriormente apontado – a situação melhor se subsume à hipótese de inexigibilidade do art. 25 da Lei nº 8.666/93.
Em síntese, sou dada a concluir que:
a) A requisição inicial e a manifestação de fls. 118 sugerem que os serviços a serem contratados são passíveis de subsunção à hipótese do art. 25, inc. II da Lei nº 8.666/93 c/c art. 13, VI da Lei nº 8.666/93;
b) Neste caso, caberá a constituição de comissão de servidores nos termos dos arts. 14 e 15 do Decreto Municipal nº 44.279/03, isto é: a autoridade competente para autorizar a contratação direta por inexigibilidade de licitação constituirá comissão especial com número ímpar, integrada por pelo menos dois servidores efetivos da área técnica específica relacionada com o objeto do contrato. Esta comissão deverá emitir parecer conclusivo sobre a singularidade do objeto do contrato e a notória especialização do futuro contratado.
c) Também deverá constar dos autos a justificativa quanto ao preço, a teor do art. 26, parágrafo único, inc. III da Lei nº 8.666/93.
É a manifestação, que submeto à apreciação superior.
São Paulo, 12 de setembro de 2013

Maria Nazaré Lins Barbosa
Procuradora Legislativa
OAB/SP nº 106.017