TID xxxxxxxxx
Parecer n.º 212/2012
Ref.: Memo DCE 039/2012
Sr. Procurador Legislativo Chefe,
O Diretor de Comunicação Externa, xxxxxxx, por meio do memorando em epígrafe, informa que a Câmara Municipal de São Paulo, juntamente com o xxxxxxxxxxx, realizará entrevistas com os candidatos a Prefeito do Município de São Paulo, tendo como principal foco “dilemas urbanos de que hoje padecem as megacidades”.
Aduz que o evento será gravado e transmitido pela TV Câmara e pelo Portal da Câmara, sendo que haverá um moderador indicado pela CMSP e dois debatedores, um indicado pela CMSP e outro pelo IAB.
Segundo consta das regras, em suma, serão convidados a participar os candidatos de partidos que têm representação na Câmara dos Deputados, sendo um candidato por programa, em ordem a ser definida em sorteio. As perguntas versarão exclusivamente sobre questões urbanas e serão previamente enviadas para conhecimento de todos os candidatos.
Consideradas essas informações formula 5 questionamentos, os quais passo a responder sequencialmente.
1. “A lei permite que a TV Câmara SP realize debates ou entrevistas de fundamento eleitoral?”
Entendo que sim.
Conforme restou consignado no parecer nº 77/12 desta Procuradoria, de autoria do I. Procurador Dr. Antonio Russo Filho:
“(…) a Constituição configurou em seu art. 223, caput, a existência de três sistemas para o serviço de radiodifusão sonora e de sons e imagens, determina o referido preceptivo legal que:
“Art. 223. Compete ao Poder Executivo outorgar e renovar concessão, permissão e autorização para o serviço de radiodifusão sonora de sons e imagens, observado o princípio da complementariedade dos sistemas privado, público e estatal.”
(…)
Por televisão estatal deve-se entender aquela que se encontra vinculada à titularidade exclusiva e controle do Estado, por intermédio de um de seus três Poderes (Executivo, Legislativo e Judiciário). É o Estado que detém seu controle e define sua programação, devendo esta estar em consonância com sua finalidade que é assegurar a comunicação institucional dando publicidade e transparência aos atos de governo, nos termos do art. 37, caput e § 1º da Constituição Federal.
(…)
Consoante se pode inferir do quanto exposto nas linhas precedentes a TV Câmara São Paulo insere-se dentro do modelo de televisão estatal de forma que sua finalidade precípua é assegurar a comunicação institucional, sendo um canal voltado para a documentação dos trabalhos parlamentares, especialmente a transmissão ao vivo das sessões, consoante dispõe a letra “b” do inciso I do art. 23 da Lei nº 8.977, de 06/01/95, que dispõe sobre serviço de TV a cabo e dá outras providências.
Hoje, entretanto a TV Câmara São Paulo já não é mais um serviço de TV a cabo, mas uma emissora de sinal aberto, de forma que não resta adstrita aos estreitos limites que lhe impunha a legislação de TV a cabo supra citada, mas sua programação deve conformar-se com aquela inerente ao sistema de televisão estatal.
Assim, a televisão deste Legislativo deve destinar-se essencialmente à comunicação institucional, podendo veicular em sua grade alguns programas de cunho educativo e cultural, à semelhança das televisões educativas que são controladas pelo Estado, sujeitando-se quando da veiculação de tais programas às mesmas vedações impostas pela lei às televisões educativas.”
Dentre as vedações acima mencionadas, cumpre citar o disposto no caput do artigo 13 do Decreto-Lei nº 236/67:
“Art. 13. A televisão educativa se destinará à divulgação de programas educacionais, mediante a transmissão de aulas, conferências, palestras e debates.”
Ora, um programa que veicule a entrevista de candidatos à Prefeito da cidade de São Paulo sobre temas urbanísticos, a meu ver, importa em fomento à educação política da sociedade, fundamental para o sucesso do processo eleitoral de um regime democrático de governo e, portanto, insere-se dentro dos objetivos da televisão educativa.
2. “Se sim, que regras precisam ser seguidas para a realização de entrevistas com os principais candidatos?”
Tendo em conta informação de que as entrevistas serão transmitidas pela TV Câmara, necessário sejam observadas as restrições impostas pelo artigo 45 da Lei Federal nº 9.504/97 às emissoras de televisão, destacando-se, em especial, o disposto no inciso IV e seu § 1º:
“Art. 45. A partir de 1º de julho do ano da eleição, é vedado às emissoras de rádio e televisão, em sua programação normal e noticiário:
(…)
IV – dar tratamento privilegiado a candidato, partido ou coligação;
(…)
§ 1º A partir do resultado da convenção é vedado, ainda, às emissoras transmitir programa apresentado ou comentado por candidato escolhido em convenção.
(…)”
Com relação ao citado inciso IV, é entendimento dominante na jurisprudência que respeitar a norma citada não consiste em tratar a todos igualmente, mas tratar com igualdade apenas os que se encontram na mesma situação de fato, pois a possibilidade de tratamento diferenciado para candidatos que se encontram em situações distintas está prevista na própria lei eleitoral, como, por exemplo, na distribuição dos tempos reservados para propaganda eleitoral gratuita (TSE, AgReg na Representação nº 2253-06.2010.6.00.0000-DF, Rel. Min. Nancy Andrighi, j. 30.09.2010 – Doc. 01; TSE, AgReg na AC nº 2.787 – PA, Rel. Min. Caputo Bastos, DJ 07.10.2008 – Doc. 02; TRE/SP, Recurso Eleitoral nº 27268, Rel. Galdino Toledo Júnior, j. 05.08.2008 – Doc. 03; TRE/SP, Recurso Eleitoral nº 29455, Rel. Paulo Alcides, j. 16.09.2008 – Doc. 04).
Assim, é entendimento do Tribunal Superior Eleitoral que no caso de entrevistas individuais “o artigo 45, IV, da Lei nº 9.504/97 não garante espaço idêntico a todos os candidatos na mídia, mas sim tratamento proporcional à participação de cada um no cenário político” (AgReg na Representação nº 2253-06.2010.6.00.0000, Rel. Min. Nancy Andrighi, v.u, j. 30.09.2010 – Doc. 01).
Necessário, portanto, atenção para que seja dispensado tratamento igual a candidatos em situações semelhantes.
Já com relação à disposição constante no § 1º acima transcrito, destaquei-a por notar que as entrevistas contarão com 2 representantes da Câmara Municipal de São Paulo, um como moderador e outro como debatedor, os quais, justamente em razão desta regra, não poderão ser candidatos a cargos eletivos.
Ainda, conforme orientação constante do parecer nº 127/2012, de autoria xxxxxxxxxxxxxxx, não obstante a Lei Eleitoral apenas determine seja dada ciência à Justiça Eleitoral em caso de debate, é prudente adotar o mesmo procedimento no caso de entrevistas (minuta de ofício em anexo).
Por fim, também necessário seja observado que o Código Brasileiro de Telecomunicações – Lei Federal nº 4117/62 exige que a gravação de programas políticos de debates e entrevistas deve ser conservada em arquivo pelo prazo mínimo de 30 dias.
3. “A lei permite que sejam convidados apenas os principais candidatos, e não todos eles, considerando que alguns, por sua baixíssima densidade eleitoral, não atraem o interesse popular?”
Ao contrário do que ocorre com os debates políticos em que é assegurada a participação de candidatos dos partidos com representação na Câmara dos Deputados (artigo 46 da Lei nº 9.504/06), a legislação eleitoral não possui regra específica a respeito dos candidatos que devem ser convidados para as entrevistas.
Assim sendo, necessário buscar na jurisprudência o entendimento que nossos Tribunais têm adotado a respeito do assunto.
O Superior Tribunal Eleitoral analisando representação ajuizada pelo então candidato à presidência, xxxxxxxxxx, em face d axxxxxxx com o intuito de obrigá-la a entrevistá-lo em igual espaço, horário e programa em que foram entrevistados os então também candidatos xxxxxxx, xxxxxx e xxxxxx, teve a oportunidade de esposar o seguinte entendimento (trecho do voto da Min. Relatora Nancy Andrighi):
“(a) regra fixada pela Lei nº 9.504, de 1997 (art. 45, IV), não garante igual espaço a todos os candidatos na mídia, mas sim tratamento proporcional à participação de cada um no cenário político. Nesse sentido, os seguintes precedentes desta Corte: AC nº 2787, de 04.9.2008, Rel. Min. Arnaldo Versiani; AG nº 3777, DJ de 14.2.2003, Rel. Min. Sepúlveda Pertence; MC nº 1066, de 12.7.2002, Rel. Min. Fernando Neves.
Na legislação que rege a matéria, não há previsão no sentido de se impor às emissoras, obediência às mesmas regras e condições instituídas a todos os candidatos na disputa eleitoral.
Além disso, conforme asseverei na decisão agravada, a emissora adotou como critério para o convite, a participação dos candidatos mais bem colocados nas pesquisas de intenção de voto. Foram entrevistas individuais e não debate entre os candidatos, razão pela qual, não ocorreu a alegada ofensa ao princípio constitucional da igualdade, corolário que consiste em tratar os iguais igualmente e os desiguais na medida de sua desigualdade.” (AgReg na Representação nº 2253-06.2010.6.00.0000/DF, v.u., J. 30.09.2010 – Doc. 01)
Em outra oportunidade o Tribunal Superior Eleitoral consignou que “com relação às entrevistas, não há previsão legal de que devem ser obedecidas as mesmas regras e condições instituídas a todos os candidatos da disputa eleitoral” e “não cabe a Justiça Eleitoral impor às emissoras de televisão ou meios de comunicação social que entrevistem esse ou aquele candidato, sendo cabível apenas coibir eventual tratamento privilegiado a postulante a cargo eletivo” (Ação Cautelar nº 2.787 – PA, Min. Relator Caputo Bastos, V.U., J. 18.09.2008 – Doc. 02).
Do exposto, concluo que por não existir regra legal expressa obrigando as emissoras de TV a realizarem entrevistas com tais ou quais candidatos, não é necessário que todos sejam entrevistados, porém essa discriminação não pode ensejar tratamento diferenciado entre postulantes de cargo eletivo que se encontram em situação semelhante, sob pena de ofensa ao artigo 45, IV, da Lei nº 9.504/97 e consequente incidência da multa prevista no artigo 45, § 2º, do mesmo diploma.
Nesse passo, mister se faz que não sendo interesse da TV Câmara entrevistar todos os candidatos ao pleito, a seleção daqueles que serão de fato entrevistados possua uma justificativa lógica e racional e se harmonize com os valores consagrados no plano constitucional, a fim de se ver respeitada a norma do artigo 45, IV, da Lei nº 9.504/97.
Como se pode notar do primeiro julgado acima transcrito, o Tribunal Superior Eleitoral já considerou razoável fossem entrevistados apenas aqueles candidatos apontados como favoritos pelas pesquisas de opinião.
O Tribunal Regional Eleitoral de São Paulo, por sua vez, também já considerou um critério razoável a aplicação analógica da norma constante no caput do artigo 46 da Lei Federal nº 9504/97 que determina que as emissoras de rádio e televisão, caso optem por realizar debates entre postulantes a cargos eletivos, estão obrigadas a convidar os candidatos cujos partidos tenham representação na Câmara dos Deputados, sendo-lhes facultado convidar os que não se enquadrem nessa situação, in verbis:
“no caso das entrevistas, sendo estas sobre temas genéricos, como projetos ou planos de governo, os critérios objetivos observados para a participação dos candidatos são aqueles definidos no artigo 46 da Lei nº 9.504/97, como modo de prevenção a possibilidade de tratamento desigual” (TRE/SP, Recurso Eleitoral nº 27268, Rel. Galdino Toledo Júnior, j. 05.08.2008 – Doc. 03)
Assim, para melhor resguardar a posição jurídica da Câmara Municipal de São Paulo entendo recomendável sejam combinados os dois critérios acima expostos, de modo que sejam convidados os candidatos cujos partidos tenham representação na Câmara dos Deputados, por aplicação analógica do artigo 46 da Lei das Eleições, bem como aqueles que se encontram em posição semelhante a estes nas pesquisas de opinião.
4. “São válidas, no caso presente, as regras estabelecidas pela Lei Eleitoral para debates ou devem ser usadas outras regras, por não se tratar de um debate explícito?”
Conforme já exposto no item 3 acima, a legislação eleitoral não possui regra específica que discipline a forma de realização de entrevistas, visto que apenas se preocupou em disciplinar os debates políticos.
Reitero mais uma vez que em se tratando de programa a ser transmitido por emissora de TV a preocupação deve ser a de conferir tratamento igualitário a candidatos que se encontrem em situações semelhantes, o que implica ser possível tratar de forma diversa aqueles que se encontram em posição diferente na medida de sua desigualdade.
Sendo respeitado o postulado acima, não há necessidade de que sejam observadas obrigatoriamente as regras constantes do artigo 46 da Lei 9.504/97 para realização de debates, todavia, na falta de balizas específicas que assegurem o respeito ao artigo 45, IV, da Lei das Eleições, e, havendo dúvida sobre a melhor forma de implementação das entrevistas, não vejo óbice – e até considero recomendável – à adoção, por meio da interpretação analógica, dos critérios objetivos estabelecidos pelo legislador para realização de debates.
5. “Nas regras anexadas a esta consulta há alguma impropriedade legal?”
Tendo em vista tudo o que foi exposto nos itens anteriores, no que concerne às regras anexas ao presente expediente, faço as seguintes ponderações:
(i) Quanto ao item 1 sugiro que além dos candidatos de partidos que têm representação na Câmara dos Deputados também sejam convidados aqueles que se encontram em posição semelhante a estes nas pesquisas de opinião; e
(ii) Quanto ao item 5 recomendo que os representantes da Câmara Municipal de São Paulo não sejam candidatos a cargos eletivos em razão da regra que veda às emissoras de TV transmitir programa comentado por candidato escolhido em convenção;
É o meu parecer, acompanhado da minuta de ofício ao TRE/SP, que submeto à apreciação de Vossa Senhoria.
São Paulo, 26 de julho de 2012.
CAROLINA CANNIATTI PONCHIO
Procuradora Legislativa – RF nº 11.153
OAB/SP nº 247.170