AT.2 – Parecer nº 122/02.
Ref.: Ofício CPI-PC Nº 334/02, de 06/09/2002.
Interessado(a): “CPI dos Postos de Combustíveis” (RDP nº 017/2002).
Assunto: Comissão Parlamentar de Inquérito instalada na Câmara Municipal de São Paulo. Prazo de duração dos trabalhos de investigação. CPI instalada com prazo de noventa dias, e prorrogada por outros noventa dias. Requerimento para nova prorrogação, por mais noventa dias a contar do encerramento do prazo anterior. Prazo certo (Constituição, art. 58, § 3º). Regimento Interno, arts. 91, 93 e 97. Artigo 5º, § 2º da Lei nº 1.579/52. Jurisprudência do Supremo Tribunal Federal. Interpretação.
Sr. Assessor Chefe,
A assim chamada “CPI dos Postos de Combustíveis” dirige, ao exmo. senhor Presidente deste Legislativo municipal, requerimento subscrito por maioria absoluta dos nobres senhores Vereadores seus integrantes, visando a prorrogação dos trabalhos de investigação, ora em curso, por mais 90 (noventa) dias a contar da data de encerramento do prazo previsto anteriormente.
Cuida-se de inquérito parlamentar instalado com prazo original de noventa dias, nos termos do artigo 93, inciso III do Regimento Interno desta Câmara Municipal – RI-CMSP, prorrogado por outros noventa dias, nos termos do artigo 97 do mesmo Regimento.
Trata-se agora, portanto, de novo requerimento de prorrogação, visando o prosseguimento dos trabalhos investigatórios por um terceiro período de noventa dias, a contar do encerramento do prazo ora em curso – prazo este, por último mencionado, que, segundo informação verbal prestada pela assessoria da CPI, tem como termo final o próximo dia 27 do corrente mês de setembro/2002.
Não parece demais registrar, em breve parêntese, que a diligente Assessoria do nobre Vereador Presidente da CPI em pauta fez chegar, a esta Assessoria Jurídica, cópia de requerimento similar, subscrito por nobres Vereadores integrantes de CPI instalada na Câmara Municipal do vizinho município de Santo André, datado aos 12 de setembro p.p. — sem que, todavia, do material encaminhado constasse qualquer nota sobre se já houve a competente deliberação quanto ao requerido, no âmbito daquela casa parlamentar (cf. cópia inclusa).
2. Após o desenvolvimento de justificativa no sentido, in casu, da necessidade de prosseguimento das apurações, os requerentes fundamentam o pedido em entendimento escorado em julgados da jurisprudência do egrégio Supremo Tribunal Federal.
O mais recente deles consubstanciou-se em despacho denegatório de liminar em mandado de segurança, exarado pelo eminente Ministro Ilmar Galvão aos 30/07/2001, publicado no DJ de 10/08/2001 (cópia inclusa). Esta decisão reiterou entendimento majoritário adotado em julgado anterior, corporificado em acórdão do Plenário do STF, que denegou habeas corpus contra o Presidente de Comissão Parlamentar de Inquérito instalada na Câmara dos Deputados, impetrado ao argumento de ilegalidade de uma segunda prorrogação do prazo de funcionamento da CPI, prorrogação esta que incorreria, segundo o impetrante, em afronta ao disposto no art. 35, § 3º do Regimento Interno da Câmara dos Deputados (HC nº 71.193/SP, STF, Pleno, Rel. Min. Sepúlveda Pertence, j. 06.04.1994, m.v., RDA, 197:212; cópia inclusa).
3. Inicialmente, mostra-se útil transcrever os seguintes dispositivos, que tratam da matéria em foco.
Primeiramente, a Constituição da República:
“Art. 58. O Congresso Nacional e suas Casas terão comissões permanentes e temporárias, constituídas na forma e com as atribuições previstas no respectivo regimento ou no ato de que resultar sua criação.
§ 3º As comissões parlamentares de inquérito, que terão poderes de investigação próprios das autoridades judiciais, além de outros previstos nos regimentos das respectivas Casas, serão criadas pela Câmara dos Deputados e pelo Senado Federal, em conjunto ou separadamente, mediante requerimento de um terço de seus membros, para a apuração de fato determinado e por prazo certo, sendo suas conclusões, se for o caso, encaminhadas ao Ministério Público, para que promova a responsabilidade civil ou criminal dos infratores” (original sem destaques).
Veja-se também o Regimento Interno da Câmara dos Deputados (Resolução nº 17, de 1989):
“Art. 35. A Câmara dos Deputados, a requerimento de um terço de seus membros, instituirá Comissão Parlamentar de Inquérito para apuração de fato determinado e por prazo certo, a qual terá poderes de investigação próprios de autoridades judiciais, (…).
§ 3º A Comissão, (…), terá o prazo de cento e vinte dias, prorrogável por até metade, mediante deliberação do Plenário, para conclusão de seus trabalhos” (original sem destaques).
O Regimento Interno do Senado Federal assim prevê:
“Art. 74. As comissões temporárias serão: (…)
c) parlamentares de inquérito – criadas nos termos da Constituição, art. 58, § 3º.
“Art. 76. As comissões temporárias se extinguem:
I – pela conclusão de sua tarefa, ou
II – ao término do respectivo prazo, e
III – ao término da sessão legislativa ordinária.
§ 1º É lícito à comissão que não tenha concluído a sua tarefa requerer a prorrogação do respectivo prazo:
a) no caso do inciso II, por tempo determinado não superior a um ano;
b) no caso do inciso III, até o término da sessão legislativa seguinte.
(…)
§ 4º Em qualquer hipótese o prazo da comissão parlamentar de inquérito não poderá ultrapassar o período da legislatura em que for criada.
“Art. 145. (…)
§ 1º O requerimento de criação da comissão parlamentar de inquérito determinará (…) o prazo de duração da comissão (…).
“Art. 152. O prazo da comissão parlamentar de inquérito poderá ser prorrogado, automaticamente, a requerimento de um terço dos membros do Senado, comunicado por escrito à Mesa, lido em plenário e publicado no Diário do Congresso Nacional, observado o disposto no art. 76, § 4º.”
De seu turno, dispõe o Regimento Interno desta Câmara Municipal:
“Art. 91 – As Comissão Parlamentares de Inquérito serão criadas mediante requerimento de 1/3 (um terço) dos membros da Câmara, (…), para apuração de fato determinado, em prazo certo, adequado à consecução dos seus fins, (…).
“Art. 93 – O requerimento de formação de Comissão Parlamentar de Inquérito deverá indicar, necessariamente: (…)
III – o prazo de funcionamento, que não poderá ser superior a 90 (noventa) dias.
“Art. 97 – Se a Comissão deixar de concluir seus trabalhos dentro do prazo estabelecido, ficará automaticamente extinta, salvo se o Plenário houver aprovado, em tempo hábil, prorrogação de seu prazo de funcionamento, a requerimento de membro da Comissão.
Parágrafo único – Só será admitido um pedido de prorrogação na forma do presente artigo, não podendo o prazo ser superior àquele fixado originariamente para seu funcionamento” (original sem destaques).
Para finalizar este tópico, cumpre registrar que a Lei nº 1.579, de 18 de março de 1952, contém dispositivo do qual resulta ressalvada – no que importa à questão sob exame, e no que se pode admitir como recepcionado pelo vigente ordenamento constituiconal, à luz de precedentes da jurisprudência do Supremo Tribunal Federal – a possibilidade de a respectiva Câmara deliberar acerca da prorrogação da incumbência da Comissão Parlamentar de Inquérito, dentro do limite da legislatura em curso (art. 5º, § 2º). Ressalvo, todavia, minha percepção de que essa possibilidade de prorrogação precisa conformar-se ao quanto a respeito venha disposto no correspondente Regimento Interno, vez que o limite da legislatura em curso, admitido sem unanimidade como recepcionado, não parece configurar normatização apta e pertinente ao requisito constitucional do prazo certo.
4. O r. despacho retro mencionado do em. Min. Ilmar Galvão deixou assinalado, verbis:
“A jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, por sua vez, não recomenda o deferimento do pedido de medida liminar. Isso porque o Plenário desta Corte, no julgamento do HC 71.193, Rel. Min. Sepúlveda Pertence, apreciou a questão relativa à prorrogação dos prazos de comissões parlamentares de inquérito, assentando entendimento que pode ser depreendido do seguinte trecho da ementa do julgado, verbis: ‘(…) A duração do inquérito parlamentar — com o poder coercitivo sobre particulares, inerentes à sua atividade instrutória e a exposição da honra e da imagem das pessoas a desconfianças e conjecturas injuriosas — é um dos pontos de tensão dialética entr a CPI e os direitos individuais, cuja solução, pela limitação temporal do funcionamento do órgão, antes se deve entender matéria apropriada à lei do que aos regimentos: donde, a recepção do art. 5º, § 2º, da L. 1579/52, que situa, no termo final de legislatura em que constituída, o limite intransponível de duração ao qual, com ou sem prorrogação do prazo inicialmente fixado, se há de restringir a atividade de qualquer comissão parlamentar de inquérito. A disciplina da mesma matéria pelo regimento interno diz apenas com as conveniências de administração parlamentar, das quais cada câmara é o juiz exclusivo, e da qual, por isso — desde que respeitado o limite máximo fixado em lei, o fim da legislatura em curso –, não decorrem direitos para terceiros, nem a legitimação para questionar em juízo sobre a interpretação que lhe dê a Casa do Congresso Nacional. (…)” (original sem os destaques; cópia inclusa).
Com base nesta linha de entendimento, sustentam os requerentes o cabimento da nova prorrogação, conforme solicitada.
5. Diversa corrente sustenta entendimento contrário, que, no que exibe de relevante à questão ora em tela, assim pode ser retratado:
“A Constituição exige que os trabalhos das comissões parlamentares de inquérito obedeçam a um prazo certo, para que não se prolonguem indefinidamente no tempo, prejudicando a apuração dos fatos e causando tormentos às investigações.
(…)
Noutro prisma, a fixação do prazo é um direito público subjetivo dos investigados, os quais devem saber, de antemão, o espaço temporal em que os trabalhos investigatórios serão realizados. Evitam-se, assim, (…) pressões psicológicas no sentido de se prolongar indefinidamente a CPI, expondo, ainda mais, os nomes de pessoas e entidades perante a opinião pública.
(…)
Quer-nos parecer que todas essas peculiaridades regimentais devem ser ponderadas à luz do § 3º do art. 58 da Constituição Federal, para que a exigência do prazo certo não se torne uma determinação inócua.
(…)
Deveras, a exigência de prazo certo deve ficar livre de possíveis prolongamentos oblíquos (…), sem falar das acumulações de prorrogações dos prazos, tão comuns por aí. (…)
Em tema de comissão parlamentar de inquérito, é possível existir, apenas, uma prorrogação (…)
(…) a previsão de aumento do lapso temporal há que ser feita antes de vencido o prazo estipulado no próprio ato de requerimento da CPI.
(…)
(…) também se submetem a esse raciocínio, que é geral, valendo para todas as esferas de distribuição do poder, isto é, União, Estados, Distrito Federal e Municípios, respeitadas as prescrições contidas na Constituição Federal, nas constituições estaduais, nas leis orgânicas municipais e nos regimentos das assembléias legislativas e das câmaras de vereadores.
(…)
De outra parte, existem no Pretório Excelso aqueles que defendem a não-recepção do § 2º do art. 5º da Lei nº 1.579/52 pela Carta de 1988, a exemplo do Min. Marco Aurélio, que proferiu o seguinte voto: ‘Não posso emprestar ao que se contém no § 3º, do art. 58, da Constituição Federal alcance que exceda a noção vernacular de prazo certo. Não posso desprezar que o alcance do Texto Constitucional é tornar extreme de dúvidas que a Comissão funcionará durante um certo período (…) Senhor Presidente, pelo a licença para concluir que, diante do teor do § 3º, do art. 58, da Constituição Federal, não houve a recepção da norma da Lei 1.579/52, posto que essa norma — repito — não alude a um prazo certo; não fixa, em si, um prazo, apenas, um limite para o funcionamento da Comissão’ [Nota ‘33. STF, HC 71.193/SP, RDA, 197:212’ ].
(…)
Saliente-se mais uma vez que o prazo certo constitui um limite constitucional formal ao poder de inquérito parlamentar. Essa limitação logra, assim, a índole temporal” (Uadi Lammêgo BULOS, Comissão Parlamentar de Inquérito – técnica e prática, SP, Ed. Saraiva, 2001, pp. 223-228; destaques do original).
6. De minha parte, sou dado a entender que, mesmo o reconhecimento da recepção do artigo 5º, parágrafo 3º da Lei nº 1.579/52 não tem o condão de desobrigar as Casas Legislativas de observarem as normas de seus Regimentos Internos, inclusive aquelas que estabeleçam disciplina do prazo certo exigido para a duração dos trabalhos investigatórios das Comissões Parlamentares de Inquérito – sob pena de aniquilamento do respectivo comando constitucional.
Isso, sem embargo da possibilidade de propositura de inovações normativas, aptas ao estabelecimento de uma disciplina regimental, que possa melhor viabilizar uma adequação dos prazos dos trabalhos das CPIs, vis a vis às peculiaridades de extensão e complexidade dos correspondentes objetos de apuração — a exemplo do figurino contemplado no Regimento Interno do Senado Federal, segundo o teor dos dispositivos retro transcritos.
Conclusões
7. Do quanto expendido, urge extrair uma síntese conclusiva, como segue.
7.1. Primeiramente, cumpre ressalvar a existência de corrente de entendimento, conforme exposto, à qual me inclino, cujas premissas e efeitos hermenêuticos resultam contrários àqueles que vieram a prevalecer nos invocados precedentes jurisprudenciais verificados no egrégio Supremo Tribunal Federal.
7.2. Os referidos julgados de nossa Corte Suprema foram exarados em procedimentos de habeas corpus e mandado de segurança, em que os objetos de impetração eram a pretensão de obter provimento judicial que desobrigasse os respectivos pacientes ou impetrantes de comparecer para depor perante Comissões Parlamentares de Inquérito instaladas na Câmara dos Deputados, ao argumento de ilegalidade de uma segunda prorrogação do prazo dos trabalhos investigatórios, em face do disposto no respectivo Regimento Interno.
7.3. O Plenário do STF entendeu, por maioria de seis votos dos onze eminentes Ministros, por ocasião do julgamento do HC nº 71.193 (Rel. Min. Sepúlveda Pertence), que o vigente ordenamento constitucional recepcionou o art. 5º, § 2º da Lei nº 1.579/52, o que este dispositivo situa, no termo final da legislatura em que constituída, o limite intransponível de duração, ao qual, com ou sem prorrogação do prazo inicialmente fixado (e, acrescento, em havendo prorrogação, há que ser ela, expressa e motivadamente, deliberada na forma regimental), se há de restringir a atividade de qualquer comissão parlamentar de inquérito.
7.4. O mesmo julgado perfilhou também o entendimento de que, da disciplina desta matéria pelo regimento interno (ao argumento de dizer respeito apenas com as conveniências da administração parlamentar, das quais cada câmara é o juiz exclusivo), não decorrem direitos para terceiros, nem a legitimação para questionar em juízo sobre a interpretação dada à matéria em sede do parlamento.
7.5. A ser seguida esta linha interpretativa, adotada majoritariamente no STF, reitera-se que, respeitado o limite máximo fixado em lei (qual seja, o final da legislatura em curso – art. 5º, § 2º, Lei nº 1.579/52), deve ser observada a forma regimental para qualquer prorrogação do prazo dos trabalhos; nessa conformidade, quanto ao mais, mostra-se aplicável o artigo 97, caput e parágrafo único do Regimento Interno desta Câmara Municipal – exceto, quanto ao contido no parágrafo, a inquinada limitação de apenas um pedido de prorrogação.
Da eventual adoção desta linha de entendimento, por último indicada, resulta que a matéria seja, então, levada à deliberação do Plenário desta Casa Legislativa, por força do disposto no artigo 97 da Regimento Interno.
Desse modo, creio abordados os pontos de relevo que a matéria suscita, sem menoscabo da urgência assinalada no expediente de referência.
É o parecer, s.m.j., que submeto à elevada apreciação de V. Sa.
São Paulo, 18 de setembro de 2002.
Sebastião Rocha
Assessor Técnico Supervisor – Juri (Substº.)
OAB/SP nº 138.572
INDEXAÇÃO:
CONTINUAÇÃO
CONTINUIDADE
FUNDAMENTO
JUSTIFICAÇÃO
MOTIVAÇÃO
POSTO DE COMBUSTÍVEL
POSTO DE GASOLINA
TEMPO
VENCIMENTO