Parecer nº 415/18
Ref. P.A. 1038/17
TID 16533910
Assunto: Férias proporcionais indenizáveis – Ato nº 1099/09
Dra. Procuradora Legislativa Supervisora,
Trata-se de questionamento do Setor Judicial sobre a possibilidade de alterar o Ato nº 1099/09, que disciplina a acumulação e fruição de férias dos servidores, a fim de prever expressamente o pagamento de indenização por férias proporcionais, quando do desligamento do servidor da Câmara Municipal.
O processo administrativo encaminhado para análise pelo referido Setor consiste em uma ação judicial proposta por ex-servidora ocupante de cargo em comissão (XXXXXXXXXXXXXX), na qual houve reconhecimento do direito à indenização das férias proporcionais (folhas 01 a 95 do processo administrativo).
Às folhas 96 e seguintes, há relatório contendo extrato de andamento de diversas ações judiciais movidas em face da Câmara Municipal, referentes ao pagamento de férias, abrangendo os últimos 12 (doze) anos.
De acordo com o levantamento realizado pelo Setor Judicial, foram 10 (dez) ações judiciais em 12 (doze) anos. Destas ações, no que tange ao mérito, houve reconhecimento do direito às férias proporcionais em 7 (sete) casos, sendo que nos demais 3 (três) casos a ação foi julgada improcedente. Em 02 (dois) dos processos julgados improcedentes – o movido por XXXXXXXXXXXXXX e o movido por XXXXXXXXXXXXXX – não há menção expressa nos acórdãos trazidos aos autos ao pagamento das férias proporcionais, tratando-se de questionamento sobre acidente de trabalho.
Para compreender os motivos que ensejaram a atual redação do Ato nº 1099/09, redação esta que não prevê o pagamento de férias proporcionais da forma pleiteada judicialmente pelos litigantes, importa analisar o histórico dos atos editados pela Câmara Municipal, concernentes às férias dos servidores.
O histórico dos atos relativos a férias está inserido no Processo Administrativo nº 2829/70.
Do estudo do mencionado processo administrativo, é possível concluir que, antes da vigência do atual Ato que regula as férias, vigorava o Ato nº 860/04, cuja redação previa expressamente o pagamento de férias não gozadas, proporcional ao tempo trabalhado. Confira-se:
“Art. 2º O pagamento de indenização por férias não gozadas poderá ser feito nos seguintes casos, acrescidos de 1/3 (um terço) do respectivo valor:
I – Exoneração do cargo efetivo ou em comissão, quando o exonerado não mantiver outro vínculo com órgão da Administração do Município de São Paulo;
II – Falecimento do servidor;
III – Aposentadoria.
Art. 3º O pagamento indenizatório a que se refere o artigo anterior observará os seguintes critérios:
…….
III – O pagamento da indenização corresponderá aos períodos de férias não usufruídas e indeferidas, exceto no ano do desligamento, que será proporcional ao tempo trabalhado, observada a prescrição quinquenal, contada a partir do desligamento do servidor, e as deduções por afastamentos em virtude de faltas e licenças não elencadas no artigo 64 da Lei n° 8.989/79, no que excederem a 30 (trinta) dias em um período de 12 (doze) meses consecutivos.
IV – O pagamento somente será efetivado mediante requerimento do interessado;”
Todavia, por orientação do Egrégio Tribunal de Contas do Município, no bojo do processo TC 4713/03-13, ao interpretar o art. 132, § 3º, do Estatuto dos Funcionários Públicos do Município de São Paulo (Lei Municipal nº 8989/79), assim foi decidido:
“Ocorre que, nos termos do disposto no artigo 132, § 3º, da Lei 8989/79, o servidor público estatutário adquire o direito a férias após o decurso de um período de um ano de trabalho, fazendo-se coincidir os períodos aquisitivos subsequentes ao ano civil respectivo.
…
Recomendo à Prefeitura que edite orientação normativa a fim de que seja restaurado o entendimento de que o direito ao gozo de férias ou à indenização de férias deve ser integral e adquirido após o decurso de um período de um ano de trabalho, para que seja aplicada por toda a Administração. Também recomendo à Câmara Municipal proposta de nova alteração do ato número 860/04”. (vide folhas 80 e 81 do volume II dos autos do processo administrativo 2829/70).
Atendendo a recomendação da Egrégia Corte de Contas, foi editado, então, o Ato 961/07, passando a vigorar da seguinte forma o art. 3º, VI:
“Art. 3º …..
…
III – O pagamento da indenização corresponderá aos períodos de férias não usufruídas e indeferidas, observada a prescrição quinquenal, contada a partir do desligamento do servidor, e as deduções por afastamento em virtude de faltas e licenças não elencadas no artigo 64 da Lei nº 8989/79, no que excederem a 30 (trinta) dias em um período de 12 (doze) meses consecutivos.
…
VI – Após o transcurso do período de carência, o funcionário passa a adquirir novo período de férias no dia 1º de janeiro de cada exercício civil, e o pagamento indenizatório relativo ao exercício em que se deu a aposentação ou exoneração será integral, observados os demais critérios estabelecidos neste Ato;”
Após a edição do Ato 961/07, a Câmara Municipal formulou consulta ao Tribunal de Contas, especialmente para saber se o novo cálculo das indenizações de férias não gozadas implicaria na revisão dos cálculos feitos pela equipe técnica daquela Corte, bem como se a nova forma de cálculo adotada também deveria ser aplicada aos pedidos de pagamento indenizatório de férias não gozadas, protocolizados após a edição do Ato nº 860/04 e antes da vigência do Ato nº 961/07.
A Colenda Corte de Contas acordou que o entendimento que deu origem ao Ato nº 961/07 deve abranger os casos novos e os pendentes de pagamento e, ademais, sugeriu à Câmara a alteração do Ato nº 961/07, a fim de excluir da redação do inciso III a expressão “e as deduções por afastamentos em virtude de faltas e licenças não elencadas no artigo 64 da Lei nº 8.989/79, no que excederem a 30 (trinta) dias em um período de 12 (doze) meses consecutivos”, por considerar que tal disposição não encontraria amparo legal no Estatuto dos Funcionários Públicos do Município de São Paulo, assim como para alterar a redação do inciso VI, mudando a expressão “exercício em que se deu a aposentação ou exoneração” por “exercício do desligamento do servidor”, a fim de incluir os servidores demitidos, falecidos ou desligados por qualquer outro motivo.
Diante disso, foi editado o Ato nº 1026/2008, com a seguinte redação, no que tange às férias indenizáveis:
“Art. 3º …..
…
III – O pagamento da indenização corresponderá aos períodos de férias não usufruídas e indeferidas, observada a prescrição quinquenal, contada a partir do desligamento do servidor.
…
VI – Após o transcurso do período de carência, o funcionário passa a adquirir novo período de férias no dia 1º de janeiro de cada exercício civil, e o pagamento indenizatório relativo ao exercício do desligamento do servidor será integral, observados os demais critérios estabelecidos neste Ato;”
Após tantas alterações, a Edilidade Paulistana houve por bem consolidar os Atos sobre as férias de seus servidores, oportunidade em que foi editado o Ato nº 1099/09, ora vigente, que assim estabelece, no que concerne às férias proporcionais indenizáveis:
“Art. 3º O pagamento indenizatório a que se refere o art. 2º, observará os seguintes critérios:
…
V – após o transcurso do período de carência, o funcionário passa a adquirir novo período de férias no dia 1º de janeiro de cada exercício civil, e o pagamento indenizatório relativo ao exercício do desligamento do funcionário será integral, observados os demais critérios estabelecidos neste Ato e aplicando-se as seguintes disposições:
a) aos requerimentos de pagamento indenizatório a partir de 18 de junho de 2008;
b) aos pedidos de pagamento protocolizados após 10 de novembro de 2004 e ainda não satisfeitos;
c) aos pedidos de pagamento protocolizados e pagos após 10 de novembro de 2004 e aos pendentes de apreciação de pedidos de reconsideração ou recursos interpostos dentro do prazo legal, formulados anteriormente a 19 de maio de 2004;
d) aos pedidos de pagamento protocolizados e pagos após 10 de novembro de 2004 ou anteriormente a ele, desde que verificada a disponibilidade orçamentária e a prescrição quinquenal.
VI – para o cômputo do período de férias a ser indenizado, considera-se como termo inicial o primeiro dia do exercício anual, observado sempre o cumprimento do período aquisitivo pelo funcionário.”
Em suma, após o transcurso de um ano de exercício (período de carência), o servidor adquire o primeiro período de férias, sendo que os demais períodos serão adquiridos no dia 1º de janeiro de cada ano subsequente.
Ao apreciar proposta de redação de ato alterador do Ato 1099/09, exatamente a fim de prever o direito à indenização de férias e terço constitucional proporcional ao tempo trabalhado, este Setor emitiu o Parecer 80/2015, elaborado pelo Dr. XXXXXXXXXXXXXX, concluindo que, ante a posição do Egrégio Tribunal de Contas do Município de São Paulo, apenas uma alteração no Estatuto dos Funcionários Públicos do Município de São Paulo (Lei Municipal nº 8989/79) seria capaz de garantir os direitos pretendidos.
A Prefeitura do Município de São Paulo também interpreta a questão das férias proporcionais em sintonia com a orientação do Tribunal de Contas, conforme podemos confirmar em análise aos Manuais de Recursos Humanos disponibilizados pelo Poder Executivo em seu sítio na internet (in https://www.prefeitura.sp.gov.br/cidade/secretarias/upload/chamadas/portal_do_servidor_-_manuais_rh_-_manual_indenizacao_de_ferias_1510834462.pdf). Observe-se que não há que se falar em indenização de férias na hipótese de o servidor não ter completado um ano de exercício:
“2.9.3. assinalar o item 2.1, no caso do ex-servidor não ter completado 1 ano de exercício, não adquirindo o direito às férias, conforme artigo 132, da Lei n°8989/79, devendo o pedido ser indeferido; “
Em que pesem os julgados trazidos pelo Setor Judicial, demonstrando que há decisões judiciais reconhecendo o direito dos servidores, especialmente ocupantes de cargo em comissão, ao recebimento da indenização proporcional por férias não gozadas, em pesquisa realizada no site do Tribunal de Justiça de São Paulo é possível concluir que o tema não é pacífico no Tribunal, havendo decisões, em casos semelhantes ao ora analisados, nos quais foi aplicado o Estatuto dos Funcionários Públicos Municipais, uma vez tratar-se de vínculo de natureza administrativa e não trabalhista, não se reconhecendo, portanto, o pedido de recebimento de verbas disciplinadas pela Consolidação das Leis Trabalhistas, dentre elas, as férias proporcionais da forma ora sugerida (Apelação cível nº 0005254-62.2016.8.26.0011, j. 26/4/2018, Relator Des. Osvaldo de Oliveira; Apelação nº 0121523-73.2007.8.26.0053, j. 24/11/2014, Relator Des. Antonio Celso Aguilar Cortez).
Cumpre transcrever a ementa do acórdão prolatado na Apelação nº 0121523-73.2007.8.26.0053, de relatoria do ilustre Desembargador Antonio Celso Aguilar Cortez, do Egrégio Tribunal de Justiça de São Paulo:
“Ação ordinária. Cobrança. Ex-servidor da Câmara Municipal. Exercício de cargo em comissão, sujeito ao regime estatutário. Demissão. Pretensão ao recebimento de férias proporcionais. Ausência de previsão legal. Impossibilidade de aplicação das normas da CLT. Sentença de improcedência. Apelação não provida.”
Convém esclarecer que tal ação judicial não está inserida na listagem apresentada pelo Setor Judicial, uma vez que a Câmara Municipal não consta como parte na demanda, constando como ré tão-somente a Prefeitura Municipal de São Paulo.
Portanto, ante todo o exposto, apenas uma alteração legislativa seria capaz de tratar do pagamento da indenização por eventuais férias proporcionais, razão pela qual se conclui que nem mesmo eventual nova consulta ao Tribunal de Contas do Município de São Paulo seria suficiente para atender à solicitação ora formulada.
É o meu parecer, que elevo à superior consideração de Vossa Senhoria.
São Paulo, 26 de novembro de 2018
Lilian Vargas Pereira Poças
Procuradora Legislativa
OAB/SP 184.138