Parecer nº 404/2016
Processo nº 932/2016
TID xxxxxxxxxxxxx
Ref.: Locação de caçamba – Prorrogação – Enquadramento do contrato (Lei 8.666/93, art. 57, incisos II ou IV). Interpretação do inciso IV do art. 57 da Lei 8.666/93.
Sra. Procuradora Legislativa Supervisora,
I – DA PRORROGAÇÃO
O presente processo foi encaminhado a esta Procuradoria para avaliação da viabilidade jurídica e, se assim estiver em consonância, elaboração de minuta do 1º Termo de Aditamento de Contrato pactuado com a empresa xxxxxxxxxxxxx, com prorrogação do ajuste por mais 12 (doze) meses, a partir de 18.12.2016.
O objeto do contrato envolve a locação de caçamba para entulho, nos termos do TC 55/2015 (fls. 2-10).
A unidade gestora e a empresa contratada manifestaram interesse na prorrogação (fl. 17 e fl. 27, respectivamente) (Ato 1.307/15, art. 1º, II e IV).
A Contratada pontuou que, embora o índice do IPC do período tenha sido de 10,18%, “devido às muitas alterações na economia de nosso país e levando-se em consideração as dificuldades encontradas em todos os seguimentos, resolve[u-se] aplicar o percentual de reajuste de 8%”. Por tal motivo, não foi realizada pesquisa de mercado (fl. 36), uma vez que o montante solicitado a título de reajuste foi inferior ao estabelecido pelo referido índice, o que faz presumir, com muito mais razão, a vantajosidade da prorrogação do ajuste, nos termos do art. 1º, parágrafo único, inciso II, do Ato nº 1.307/2015.
Segundo informação da SGA.22 (fl. 36), com a aplicação do reajuste pleiteado (8%), o valor anual do contrato passa a ser de R$ 23.652,00 (vinte e três mil, seiscentos e cinquenta e dois reais), conforme memória de cálculo à fl. 22.
Para fins do art. 1º, inciso I, do Ato 1.307/2015, registra-se que consta nos autos declaração da SGA.33 (fl. 17) no sentido de que a empresa prestadora dos serviços vem cumprindo com as prescrições contratuais, sem ter havido aplicação de penalidade.
Consta nos autos a certidão de regularidade com o CADIN (fl. 31) e com os tributos municipais (fl. 34). Anexamos, ainda, a certidão de regularidade quanto aos tributos federais, o Certificado de Regularidade do FGTS e a CNDT.
Reserva de recursos orçamentários à fl. 37.
Segue anexa correspondência na qual a Contratada indica a pessoa que assinará o Termo de Aditamento, cujos poderes constam do contrato social também anexo.
Diante do acima exposto, não vislumbramos óbice para a realização da prorrogação pretendida, cuja minuta segue anexa.
II – DO ENQUADRAMENTO DO PRESENTE CONTRATO NO INCISO II OU INCISO IV DO ART. 57. DA INTERPRETAÇÃO DO PRECEITO CONTIDO NO INCISO IV.
Finalmente, consta na inicial (fl. 1) a seguinte questão formulada por SGA.24:
Ressaltamos por fim que esta contratação refere-se a locação de equipamentos e entendemos, S.M.J, que seria conveniente a verificação do enquadramento no artigo 57, parágrafo IV, da Lei 8.666/1993.
Nos termos do item 6.1 da Cláusula Sexta do Termo de Contrato nº 55/2015 (fl. 6), o objeto da avença foi enquadrado na previsão do art. 57, II, da Lei 8.666/1993, o que permite a sua prorrogação por prazos sucessivos, até o limite de 60 (sessenta) meses.
Transcrevo os dispositivos acima mencionados:
Art. 57. A duração dos contratos regidos por esta Lei ficará adstrita à vigência dos respectivos créditos orçamentários, exceto quanto aos relativos:
(…)
II – à prestação de serviços a serem executados de forma contínua, que poderão ter a sua duração prorrogada por iguais e sucessivos períodos com vistas à obtenção de preços e condições mais vantajosas para a administração, limitada a sessenta meses;
(…)
IV – ao aluguel de equipamentos e à utilização de programas de informática, podendo a duração estender-se pelo prazo de até 48 (quarenta e oito) meses após o início da vigência do contrato. (destaquei)
Como premissa, cumpre mencionar que, ao fazer alusão a “aluguel de equipamentos” no inciso IV, o legislador confunde a obrigação (pagar aluguel) com a sua origem (contrato de locação). Desse modo, houve evidente atecnia, de modo que o inciso IV, a rigor, trata da “locação de equipamentos” .
Pois bem.
Deve-se registrar que há divergência doutrinária a respeito da interpretação a ser extraída do inciso IV do referido dispositivo.
De fato, é possível extrair dois sentidos do texto normativo, quais sejam:
1. o de que a expressão “aluguel de equipamentos” está relacionada com o termo “informática”, de modo que o prazo de até 48 (quarenta e oito) meses só se aplicaria ao “aluguel” (sic) desse tipo de equipamento (vale dizer, aos equipamentos de informática);
2. o de que a expressão “aluguel de equipamentos” é autônoma em relação ao restante do dispositivo, de modo que ele trataria de duas situações: (a) do “aluguel” (sic) de todo e qualquer equipamento, e (b) da utilização de programas de informática.
Destaco que, em pesquisas realizadas, não foi encontrado qualquer precedente do Superior Tribunal de Justiça (intérprete máximo das normas infraconstitucionais) a respeito do assunto.
Desse modo, a questão, em maior monta, remete a posicionamentos doutrinários.
Defendendo a segunda interpretação acima mencionada, destaco o posicionamento de JOEL DE MENEZES NIEBUHR:
“De plano convém ressaltar que o inciso IV diz respeito a dois objetos diferentes: o primeiro é pertinente ao aluguel de equipamentos, e o segundo à utilização de programas de informática. Logo, o equipamento a ser alugado não precisa ser de informática. Portanto, é permitido à Administração estender a execução de contrato de quaisquer tipos de equipamentos, expressão que tem sentido amplo, abarcando máquinas de cópia, veículos, maquinário em geral e, inclusive, equipamentos de informática.”
Ademais, segundo o posicionamento da Revista Zênite ,
“A razão para considerar a locação de equipamentos de toda e qualquer natureza, e não apenas e exclusivamente a locação de equipamentos de informática, se justifica em face da finalidade do dispositivo, que consiste em evitar a interrupção das atividades da contratante. Para tanto, a Lei admitiu a prorrogação desses contratos, tal qual ocorre com os serviços contínuos disciplinados no inc. II.
Logo, em vista da premissa que orientou a fixação da exceção pelo legislador, a natureza dos equipamentos, se de informática ou não, revela-se irrelevante. Seja da natureza que for o equipamento, a prorrogação de seu contrato de locação objetiva a manutenção dessa utilidade e pode se estender por até 48 meses.”
Noutro excerto:
“A razão para considerar a locação de equipamentos de toda e qualquer natureza, e não apenas exclusivamente a locação de equipamentos de informática, justifica-se em face dos termos empregados pelo legislador. A conjunção aditiva ‘e’ empregada pelo inc. IV em tela remete à pluralidade de hipóteses, ou seja, admite estender a prorrogação por até 48 (quarenta e oito) meses dos contratos de locação de equipamentos e de utilização de programas de informática.”
Com a devida vênia, contudo, não há como concordar com tais posicionamentos.
Desse modo, SMJ, o entendimento mais acertado é no sentido da adoção da primeira corrente interpretativa.
Entende-se que só a locação (“aluguel”, nas palavras do legislador) de equipamentos que seja relacionada à área de informática se submete ao prazo de 48 (quarenta e oito) meses previsto no art. 57, IV, da Lei 8.666/93.
Por outro lado, entende-se que os contratos de locação de bens que envolvam outros objetos, e que se enquadrem como contínuos, podem ser prorrogados por até 60 (sessenta) meses, de acordo com o art. 57, II, da Lei 8.666/93.
É o que se passa a expor.
Com efeito, o art. 6º da Lei 8.666/93 traz uma série de conceitos a serem aplicados na interpretação dos textos normativos contidos no mencionado diploma.
No seu inciso II, o referido dispositivo conceitua “serviço” como “toda atividade destinada a obter determinada utilidade de interesse para a Administração”.
Ato contínuo, o referido preceito elenca alguns exemplos do que considera como serviço; e, ao fazê-lo, faz expressa menção à “locação de bens”. Observe-se:
Art. 6º Para os fins desta Lei, considera-se:
II – Serviço – toda atividade destinada a obter determinada utilidade de interesse para a Administração, tais como: demolição, conserto, instalação, montagem, operação, conservação, reparação, adaptação, manutenção, transporte, locação de bens, publicidade, seguro ou trabalhos técnico-profissionais;
O enquadramento da locação de bens como uma espécie de serviço, a rigor, é equivocado, uma vez que a prestação de serviços envolve uma obrigação de fazer (facere), ao passo que a locação de bens envolve uma obrigação de dar.
Não obstante, como já visto alhures, equívocos terminológicos e conceituais por parte do legislador não são incomuns.
Sem embargo (anotado o apuro técnico), partindo da premissa de que, para fins da interpretação da Lei 8.666/93, “locação de bens” é “serviço”, e uma vez enquadrando tal “serviço” como de natureza contínua, há perfeita subsunção ao que prevê o art. 57, inciso II, da Lei 8.666/93. Assim, sem grandes esforços hermenêuticos, admite-se a prorrogação dos contratos contínuos de locação de bens em geral pelo prazo máximo de 60 (sessenta) meses.
O preceito contido no inciso IV do art. 57 da Lei 8.666/93, desse modo encarado, consubstancia verdadeira norma de exceção ao que prevê o inciso II; ou seja, prevê um prazo menor (48 meses) no que tange ao “aluguel” (rectius, locação) de equipamentos de informática e à utilização de programas de informática, em decorrência das peculiaridades existentes nessa seara. Nesse sentido é a lição de MARÇAL JUSTEN FILHO:
“A regra justifica-se porque a Administração pode não ter interesse na aquisição definitiva de tais bens ou equipamentos. A rapidez e a obsolescência são habituais nesse campo. Daí a utilização temporária, dentro de prazos razoáveis.” (destaquei)
Ademais, considerando tal aspecto teleológico da norma, e considerando o objeto contratual em questão, observa-se que a mens legislatoris (a intenção do legislador) em limitar o prazo de duração do contrato a 48 (quarenta e oito) meses não se aplica no caso em tela, uma vez que o objeto do presente Termo de Contrato (locação de caçambas para entulho) é infenso, em termos de utilidade e atualidade, à passagem do tempo .
Adotando posicionamento similar ao que ora se defende, destaco a doutrina de JESSÉ TORRES PEREIRA JÚNIOR:
“A Lei nº 8.666/93 admite não mais do que três exceções em face das quais os contratos podem ser prorrogados, critério mantido pela Lei nº 8.883/94:
(…)
(c) locação (…) de equipamentos de informática ou qualquer espécie contratual que permita o uso de programas de informática ou qualquer espécie contratual que permita o uso de programas de informática, situações que, a rigor, dada sua essencialidade (geradora de dependência para os serviços que se valem da informática) estariam compreendidas na prestação de serviços contínuos, mas que receberam destaque na lei como estímulo à modernização da Administração Pública, com possível economia de custos e racionalização dos meios disponíveis; (…)” (destaquei)
Além do mais, a adoção da segunda corrente interpretativa iria ao encontro do princípio da economicidade e da eficiência (este último previsto expressamente no art. 37, caput, da Constituição Federal).
De fato, reduzir o período máximo de prorrogações dos contratos administrativos contínuos implica na necessidade de a Administração Pública despender o erário e a energia dos seus servidores no intuito de realizar um maior número de licitações sem justificativa subjacente para tal. E, segundo MARÇAL JUSTEN FILHO, o fundamento do permissivo contido no art. 57, II, da Lei 8.666/93 é justamente o de evitar os dispêndios oriundos da realização de sucessivos certames licitatórios. Observe-se:
“A adoção da regra [prevista no art. 57, II, da Lei 8.666/93] relaciona-se com dois motivos preponderantes. O primeiro consiste na inconveniência da suspensão das atividades de atendimento ao interesse coletivo. A demanda permanente de atuação do particular produziria uma espécie de trauma na transição de um contrato para outro. Se a contratação fosse pactuada por períodos curtos, haveria ampliação do risco de problemas na contratação posterior. Isso significaria, ademais, o constrangimento à realização de licitações permanentemente. O encerramento de uma licitação seria sucedido pela instalação de outra, destinada a preparar a contratação subsequente. Acabaria por multiplicar-se o custo da Administração: seria necessário departamento encarregado exclusivamente de realizar licitações para aquele objeto. Ademais, os serviços prestados de modo contínuo teriam de ser interrompidos, caso fosse vedada a contratação superior ao prazo de vigência dos créditos orçamentários. Isso importaria sério risco de continuidade da atividade administrativa. O segundo motivo é o da previsibilidade de recursos orçamentários. Em se tratando de serviços contínuos, presume-se que sempre existirão recursos orçamentários para a cobertura das despesas correspondentes.”
Por outro lado, o argumento de ordem gramatical mencionado alhures (no sentido de que a conjunção aditiva “e” empregada pelo inciso IV do art. 57 da Lei 8.666/93 remeteria à pluralidade de hipóteses) não convence.
A má redação do dispositivo não permite a extração de um sentido unívoco do seu texto.
De fato, por exemplo, se fosse alterada a mencionada conjunção aditiva (“e”) para uma conjunção alternativa (v.g., “ou”), a dubiedade semântica permaneceria. Daí a razão pela qual, SMJ, há que se fazer uma interpretação sistemática e teleológica, em detrimento de uma inconclusiva interpretação gramatical.
Finalmente, destaca-se que o entendimento ora proposto é também adotado em sede de direito positivo pelo art. 47 do Decreto Municipal 44.279/03, adotado por esta Câmara Municipal com fundamento no Ato 878/2005. Transcrevo:
Art. 47. Observado o limite de 48 (quarenta e oito) meses, os contratos cujo objeto seja a locação de equipamentos de informática ou a utilização de programas dessa natureza poderão ser prorrogados por prazos iguais ou inferiores ao originalmente pactuado, observadas as condições previstas nos incisos I e II do artigo 46 deste decreto.
Entende-se, portanto, que está correto o enquadramento do presente contrato no art. 57, II, da Lei 8.666/93.
III – CONCLUSÃO
Ante o exposto, opinamos pela:
a) viabilidade da prorrogação pretendida, nos termos do Item I deste Parecer;
b) regularidade do enquadramento do presente contrato no art. 57, II, da Lei 8.666/93 no que concerne a eventuais futuras prorrogações, nos termos do Item II deste Parecer.
Este é o parecer que submeto à criteriosa apreciação de V. Sa.
São Paulo, 1º de novembro de 2016.
DARLON COSTA DUARTE
Procurador Legislativo
Setor de Contratos e Licitações
OAB/SP nº 352.960